quarta-feira, 13 de maio de 2015

PAS463. Regresso triste, lento e penoso

— Ponha-se em pé, tenente Joel Rose, do Exército da União. Este Tribunal Militar, depois de ouvir as declarações a favor e contra, por suposto delito de cobardia ante o inimigo, deliberou, reconhecer os factos acusatórios e declará-lo indigno de pertencer ao Exército Federal por manifesta cobardia em Acão de guerra, frente às tropas Confederadas, na batalha de Chattanooga, estando a ponto de quebrar com a sua atitude, intolerável num homem leal à sua bandeira, ao seu uniforme e ao seu juramento, a vitória unionista no referido campo de batalha.
O juiz militar, major Usherman, deteve-se dramaticamente por alguns instantes e pigarreou, com o olhar fixo naquele jovem aprumado, frio e impassível, cujo rosto parecia sem expressão definida sob as ondas revoltas do seu cabelo castanho. O tenente tinha os olhos firmemente cravados no grande retrato de Abraham Lincoln que tinha diante de si, ornado com duas bandeiras. Nada do que se passava em seu redor parecia dizer-lhe respeito. No entanto, era ele mesmo, o tenente Joel Rose, quem estava a ouvir o veredicto do Tribunal Militar reunido no Cíty Hall de Nashville, Estado de Tennessee.
— Por consequência — prosseguiu com voz clara -o major Usherman — o tenente Joel Rose, considerado, como indigno de pertencer ao Exército da União, mas não se tendo provado qualquer acto de traição nem que tenha procedido tão censuravelmente por simpatia com os Confederados, fica automaticamente degradado das suas patentes militares e expulso também do Exército. Este veredicto, que é benévolo e condescendente com o acusado, formula-se em atenção ao seu nome, já que os Rose de Wyoming sempre foram leais à sua pátria, à sua bandeira e às suas tradições, que o pai do acusado defendeu sempre até ao heroísmo.
O juiz acabara de falar, fixo o olhar duro no rosto do homem que escutara tão ignominiosa sentença.
O silêncio que se fez a seguir era asfixiante. Nem um músculo no rosto jovem, hirto e impenetrável, se contraiu.
— Este Tribunal acaba de proferir a sua sentença, Joel Rose.
Terminou ali o processo marcial movido contra Joel Rose, tenente de cavalaria do Exército da União. Joel tinha então, vinte e quatro anos de idade. Corria o ano de 1864 e as tropas de Ulisses Simpson Grant, o grande general de Lincoln, avançavam já implacavelmente sobre os insurretos do Sul, defensores da escravidão negra.
Na manhã seguinte, no pátio do Quartel General de Nashville, os galões de Rose foram arrancados, despojaram-no da sua espada e obrigaram-no a despir o uniforme. A seguir, foi expulso do quartel, ante os olhares inexpressivos das duas filas de soldados formados em atitude de sentido.
A degradação e expulsão estavam consumadas.
Joel, Rose, jovem e arrogante, retirou-se do local onde feira alvo da mais terrível das humilhações:
Ele sabia qual era o seu destino a partir daquele momento. Tido como cobarde, esse estigma manter-se-ia daí em diante indissociavelmente ligado ao seu nome. Apenas ele sabia quão injusta fora a sentença que o condenara. Ele, que não conhecia o medo nem fora jamais cobarde ante inimigo algum!
Mas podia explicar isso a alguém? Tinha provas, testemunhos insuspeitos em que basear-se? Não. Por isso mesmo, nem sequer tentara defender-se.
Joel Rose empreendeu o regresso a Wyoming, Estava ainda longe, mas não tinha pressa. Não tinha de ter pressa fosse para o que fosse. A guerra prosseguia. Os seus antigos companheiros de armas continuavam a lutar. Ganhariam a guerra, mesmo sem ele.
O futuro da União, o futuro das ideias nobres e humanitárias de Abbe Lincoln estava assegurado de antemão. Somente o seu futuro, o do ex-tenente Joel Rose, expulso do Exército e agora simples civil, com um infamante labéu de «cobardia ante o inimigo» a pesar-lhe nos ombros, se oferecia obscuro e pessimista...
Por isso mesmo o seu regresso a Wyoming era triste, lento e penoso... embora inevitável.
 

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