quarta-feira, 7 de setembro de 2022

CLF036.11 Vingança consumada e menos dois abutres

O pequeno e velho comissário encarregado de manter a ordem em Bunkerville, coçou a calva apreciativamente para o esbelto Anthony Mills.

— Escute, rapaz — disse finalmente — ninguém estima o Patrick Donovan, mas não há quem se atreva a enfrentá-lo, compreende? Deixá-lo-ão só e toda a gente o considera já fiambre. Até o corvo do carpinteiro está a fazer-lhe apressadamente o caixão.

Fez uns ruídos com a boca movendo o bigode, mas lançou uma olhadela para Nelly Murray e tragou a saliva que já tinha preparada para cuspir.

— Dentro de uns minutos. Três exatamente — continuou depois de olhar o seu relógio com uma grossa tampa metálica. — Donovan estará no meio da rua esperando-o, mas rodeado dos seus três melhores pistoleiros. Diz que lhes paga para isso e que você pode ir buscá-lo se quiser. Compreende?

— Mas tu não o farás! — protestou a jovem, agarrando o braço do «cow-boy», angustiada perante aquele sorriso frio que aparecia no seu rosto de linhas enérgicas e agradáveis.

— Porque não, Nelly? Prometi a teu pai...

— Ele não o permitiria.

— Ele viria comigo e, lado a lado, daríamos que merecem esses bandidos. Mas não te preocupes; voltarei.

Ela pôs-se na sua frente olhando-o nos olhos com o rosto ruborizado, mais bela do que nunca.

— Amo-te, Tony — disse muito baixo, mas de forma perfeitamente clara. — Não sei como foi, mas quero-te. Pensas que ao meu pai lhe importará perder o rancho à custa da milha felicidade? Vamo-nos daqui.

Mills moveu lentamente a cabeça, olhando-a com ternura. Nel, então, lançou-lhe os braços ao pescoço, oferecendo-lhe os seus lábios vermelhos e brilhantes como fruta madura, irresistivelmente tentadores.

— Por favor! — sussurrou com os olhos fechados.

O jovem soltou uma alegre gargalhada abraçando-a, beijou-a com todo o fogo de um amor que nascia avassalador. — Diabo de rapariguinha! — disse, afastando-a de si para a poder olhar. — E crês que agora me vou deixar matar por esses abutres? Espera-me na porta das traseiras que volto em seguida com os cavalos.

— Oh, Tony! — quase gritou ela, sentindo-se desfalecer de alegria. — É verdade o que dizes?

— Não perderei um minuto. Desprendeu-se suavemente dos braços que a retinham, e abandonou o escritório do comissário, fechando a porta nas suas costas.

Então, respirou profundamente, procurando serenar a intensa agitação do seu peito poderoso, e comprovou que os «Colts» se moviam sem dificuldade.

Depois, saltou para a rua e avançou rapidamente em busca da artéria principal da poVoação, onde já o deviam esperar Donovan e os seus pistoleiros.

— Não está bem — murmurou para si, — mas pelo menos evito-lhe uns maus minutos. Bunkerville parecia totalmente deserto, e

Tony recordou a ocasião anterior em que avançara igualmente em busca do assassino de seu irmão. Também então o esperava em companhia de outros três sujeitos, mas tinha decorrido muito tempo desde aquele dia, a prática constante aumentara a sua destreza com os revólveres e, além disso, já tinha profundos conhecimentos na implacável caça de morte que agora chegava ao seu fim. Não se deixaria surpreender e, de um modo ou de outro, acabaria a trágica pugna.

O sol caía já, mas havia luz suficiente e o rapaz pôde ver os seus quatro inimigos esperando-o no lugar onde lhe dissera o velho comissário. Estavam agrupados, seguros da sua própria força, e um deles, como Anthony tinha esperado, era Bloody.

Também não lhe resultou difícil reconhecer Donovan, embora nunca o tivesse visto antes. Vestia uma impecável levita cinzenta, calças mais claras e chapéu de copa alta. Era o único que já empunhava o revólver.

Avançou lentamente, sem pressas, calculando as suas possibilidades.

A quarenta jardas de distância distinguia-os perfeitamente, e, embora advertisse neles certo movimento de inquietação, não esperavam que começasse a actuar a tal distância.

Mas o «cow-boy» tinha dois «Colts» de máximo alcance excelente qualidade, com os quais tinha praticado muito até conhecer perfeitamente qual era a máxima distância a que podia utilizá-los com pleno rendimento.

Subitamente, sem prévio aviso, começou a mover-se com uma rapidez endiabrada. Sabia que em tais condições era inútil pretender obter bons resultados empregando as dua mãos, e por isso puxou apenas pelo revólver direito, com uma velocidade vertiginosa, e, deixando-se cair com um joelho em terra, apoiou o cotovelo no outro, afinando a pontaria.

O seu inesperado movimento colheu completamente de surpresa o grupo, que tardou uns instantes em reagir, e Tony não desaproveitou a oportunidade.

Considerava Bloody o mais perigoso dos seus' inimigos e, de resto, tinha de vingar o seu irmão. Por isso, quando apertou o gatilho, a morte cavalgava sobre um pedaço de chumbo ardente, e destroçou a cabeça do «pistoleiro», derrubando-o fulminado.

Mills tinha-se descuidado uma vez e isso tinha estado a ponto de lhe custar a vida, mas tinha aprendido a lição. Atirou-se contra o solo e um alude de chumbo passou zumbindo irritado, mas inofensivamente sobre ele.

Donovan estava correndo para o passeio com as abas da levita voando atrás dele, totalmente esquecido do prateado revólver que empunhava, quando Tony fez fogo rapidamente.

O homem pareceu tropeçar com um muro invisível e deteve-se, dobrando-se para trás, mas então alcançou-o outro projétil que o obrigou a voltar-se contorcendo-se como uma marioneta, para cair pesadamente.

Anthony girou então rapidamente sobre si mesmo para se erguer de um salto, e, deixando cair o revólver já descarregado, empunhou o outro, ao mesmo tempo que corria desesperadamente em busca do abrigo que lhe oferecia a esquina da rua em frente da qual tinha parado, contando precisamente com aquele refúgio.

Ganhou indemne a esquina, mas na realidade os seus dois únicos sobreviventes não o incomodaram muito. Já nada tinham a ganhar e ocuparam--se primeiramente em resguardar as suas próprias e importantes vidas.

Após o estrondo dos disparos, seguiu-se um silêncio que pareceu abater-se esmagadoramente sobre a povoação.

— Estes estão prontos, rapaz — gritou de súbito uma voz desde o outro extremo da rua.

— Por mim, acabou-se — replicou Tony também a gritos. — Nada tenho contra vocês.

— Tivemos pouca sorte. Acabaste com o tipo da «pasta», mas não há rancor. Vamos sair.

— Adiante.

Os três avançaram para a rua, olhando-se com desconfiança, mas não houve mais tiros. Um dos «pistoleiros» agitou a mão como despedida, e afastaram-se rua abaixo. Mills nunca mais os olhou.

Quase imediatamente começou a aparecer gente de todos os lados, mas o jovem nem o notou, porque uma voz angustiada o chamava nas suas costas.

Voltou-se rapidamente, vendo uma graciosa figurinha que corria desolada para ele, e esquecendo-se de que ainda empunhava o enorme «Colt» que acabava de apanhar do chão, correu ao seu encontro.

Abraçaram-se a meio da rua, sem lhes importar a gente que se aglomerava ao seu redor, ignorando na realidade a sua existência.

— Minha vida! — suspirou Nelly, agarrando-lhe o rosto com as mãos, como se não desse crédito à maravilhosa realidade de que ele estava ali, vivo e apertando-a contra o seu coração.

— Sinto muito, amor — sorriu ele. — Atrasei--me um pouco.

— Oh! — a rapariga apertou-o contra o peito, chorando convulsivamente.

Totalmente alheios a quanto os rodeava, não deram pela chegada de um carro coberto de pó, do qual desceram apressadamente duas mulheres que correram para eles abrindo caminho entre a multidão.

— Nelly! — gritou uma delas.

A jovem desprendeu-se dos braços do seu amado, pois conhecia sobejamente aquela voz.

— Mãe! — exclamou no cúmulo do assombro.

Abraçaram-se carinhosamente. Passados os primeiros instantes de emoção, a senhora Murray olhou por cima do ombro da sua filha o jovem coberto de pó, que permanecia um pouco afastado, contemplando a cena.

— Anthony Mills! — exclamou a dama, convencida.

O jovem sorriu, assentindo em silêncio, embora um tanto surpreendido.

— Já sei o que fez em Las Vegas, meu filho. Que notícias me traz do Michael?

Nelly voltou-se sorridente para olhar o homem que amava, pois conhecia a resposta.

— Encontrou a sua mina, e embora convalescente de um ferimento que o impediu de vir comigo pela aspereza do caminho, está perfeitamente. Dentro de um ou dois dias chegarão dois rapazes, meus amigos, um dos quais tomará conta do «Lucky» como capataz, enquanto o outro, engenheiro de minas, registará a do seu marido, preparará a expedição com quanto seja necessário para a explorar, e juntos partiremos em busca do oiro e de Michael. E dentro de pouco mais de uma semana, tê-lo-á aqui.

A senhora Murray voltou o rosto para ocultar as lágrimas que brotavam dos seus olhos, e então viu a rapariga que tinha vindo com ela.

— Sabes, Eanny? — sorriu entre as suas lágrimas —Tinhas razão. Fazem um par maravilhoso!

 

 



FIM

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