sexta-feira, 2 de agosto de 2019

FBV035.07 O dilema da noiva antes do casamento frustado

No dia seguinte, bem cedo, Evans montou a cavalo e tomou o caminho que conduzia ao rancho dos Bolton.
Já dentro da pradaria, viu-a, de repente, galopando, com os cabelos ao vento, junto a um grupo de vaqueiros.
Esporeando o cavalo, Evans seguiu-a, até a encontrar.
Encostada a uma das anfractuosidades do terreno, Sigrid esperava-o, com um frio mortal nos seus olhos intensamente azuis. Mudara muito. Aqueles três anos tinham servido para que o prometedor botão desabrochasse e se tornasse numa linda e fascinante rosa. A crisálida transformara-se numa resplandecente mariposa. A sua beleza selvagem e provocadora esteve a pontos de fazer-lhe perder a respiração, mais que o olhar de fria indiferença com que ela o envolvia, naquele momento.
Lentamente, como se lhe custasse muito trabalho, Evans desmontou e, sem pronunciar palavra, acercou-se.
— Olá, Sigrid — disse —. Como estás?
Ela respondeu com outra pergunta.
— Porque voltaste, Clark?
Ele puxou a bolsa do tabaco, enrolou um cigarro, acendeu-o e depois respondeu.
— Uma rapariga afirmou que ficava à minha espera. Agora, ouvi dizer que vai casar com outro. E verdade? 
Sigrid baixou os olhos, enquanto a blusa acusava o arfar dos seios e da respiração violenta. Sim, nas ela era uma criança e, por isso, talvez não tivesse reparado muito bem no que dizia. Fez uma pausa e acrescentou:
— Porque não te vais, Clark? Aquilo passou. Foi... coisa duma rapariga sem experiência...
— Porque te casas com Lassiter, Sigrid?


Os olhos dela cintilaram.
— Não creio que te importe muito, Clark. Quando abalaste por tua própria vontade, perdeste a tua oportunidade. De que te queixas? 
Evans acercou-se mais, e ela não retrocedeu um passo.
— Não me queixo — replicou —. Simplesmente desejo saber uma coisa e não irei sem que me a digas.
Ela aproximou-se ainda mais dele.
— Escuta de uma vez para sempre, Clark Evans — começou —. Vou casar com Lassiter porque o amo, entendes? — Parou por um momento, par a continuar depois, mordendo as palavras: — Mas há mais ainda: Nunca, entende-o bem, nunca me casarei contigo, nunca unirei a minha vida a um pistoleiro assassino. E agora vai-te, já que isto é tudo o que tenho a dizer-te.
Evans quase lhe roçava, quando replicou:
— Nunca te casarás com Lassiter. Nunca, porque antes o matarei. Não é o homem que...
— E tu, Clark, o que és? Carne para a forca e para os abutres. E escuta bem: eu mesma te matarei, por minhas próprias mãos, se Lassiter for morto. É o meu prometido e amanhã, ao meio dia, será meu esposo. Vai-te daqui, onde não fazes falta, e não voltes. Vai-te, Clark, e será melhor para os dois.
Evans pensou, amargamente, que era quase impossível reconhecer na atual Sigrid a rapariga que ele conhecera três anos antes. Mas não se furtou a replicar.
— De acordo, Sigrid, vou-me embora, mas não de Turner, donde não partirei sem ter acabado com Lassiter. E fá-lo-ei, antes, muito antes, da boda. Esse nunca te possuirá, rapariga.
Sigrid ia responder, mas foi interrompida pelo ruido do galopar de um cavalo. Evans esperou com a mão na coronha do "Colt". Não tardou muito a aparecer Phil Lassiter. Durante uns segundos, ambos se olharam, enquanto Sigrid soltava um pequeno grito.
Lassiter desmontou, vagarosamente, e disse para a rapariga:
— Será melhor que montes a cavalo e vás para o rancho, Sigrid.
Ela reagiu violentamente.
— Ainda nao casei contigo, Phil, para me dares ordens. Vou ficar mais um momento.
Lassiter não respondeu, parecendo tê-la esquecido, já que, sem desviar os olhos de Evans, disse para este:
— Disse-lhe que não a molestasse, Evans.
— E eu disse-lhe que falaria com ela. Há alguma coisa -contra isto?
— De acordo — retorquiu Lassiter —. Você assim o quis.
Antes que Sigrid pudesse fazer algo para intervir, antes que pudesse imaginar o que sucederia no segundo imediato, Lassiter inclinou-se para a frente e sacou o "Colt".  Coincidindo com o disparo, Sigrid soltou um grito de terror. Mas, contra o que esperava, o clarão de fogo surgiu do lado de Evans e o "Colt" de Lassiter saltou-lhe das mãos, perdendo-se nas rochas.
— Não tente outra vez, Lassiter, senão, na próxima atiro-lhe à cabeça — disse Evans, ridicularizando o outro.
O interpelado não respondeu, mas investiu contra ele de cabeça baixa. Evans recebeu o impacto em pleno peito e caiu para trás, enquanto Sigrid voltava a encostar-se a rocha, levando as mãos aos túrgidos seios.
Lassiter contemplou o adversário derrubado, soltando maldições e, de pronto, lançou-se sobre ele, mas Evans fletiu as pernas e estendeu-as com violência, num pontapé duplo, quando o outro, estava quase em cima dele.
Lassiter descreveu uma parábola no ar e foi estatelar-se de costas, contra o solo, a pequena distância de Sigrid. Rebolou como se fosse uma bola e pôs-se de pé para se encontrar frente a frente com Evans, que o esperava com um frio e depreciativo sorriso nos lábios.
— Vamos, Lassiter, lute por ela... se é capaz...
O outro atirou-se a ele, com raiva, e aplicou, um soco formidável com a esquerda. Muda de admiração, Sigrid viu como o seu prometido levantava os pés e logo se derrubava no solo corno um boneco.
A partir de então não presenciou outra coisa senão o brutal castigo que Evans aplicava em Lassiter, com golpes cientificamente medidos, procurando fazer-lhe todo o dano possível, ao mesmo tempo que evitava que a dureza dos seus golpes o fizesse desmaiar, para prolongar o castigo.
Porém, a resistência tem limites e Lassiter acabou por cair, ficando encolhido como um ovo, sem dar acordo de si, após um soco terrível, em que o olhar de Evans acompanhou o golpe com um brilho homicida.
Sigrid não se mexeu. Tão-pouco disse algo. Contemplava Evans e o corpo imóvel do seu prometido, sem acertar em pronunciar palavra.
Mas Evans, esse, mexeu-se, um par de segundos mais tarde, após a derrota total do adversário. Levantou o corpo nos seus poderosos braços e, voltou-se para Sigrid. Os seus olhos chocaram como espadas e, então, no mais completo silêncio, avançou uns passos e lançou o corpo de Lassiter aos pés da rapariga.
— AI o tens, querida. — disse —. Cuida-lhe do corpo, se quiseres, mas não cases com ele, porque o matarei, tão depressa se recomponha. E diz ao senhor Bolton que me viste, e que, em virtude da a “indisposição" do teu prometido, terá de adiar a boda por uns dias. Uns trinta, pelo menos: — Arquejava, mas nada mais nele demonstrava a tremenda luta que enfrentara minutos antes. — Mas não serão precisos tantos dias —acrescentou — Com quem tu vais casar é comigo e precisamente, amanha, ao meio dia. As doze em ponto. Lá te esperarei, linda.
— Isso nunca sucederá, Clark —afirmou, em tom seguro —. Primeiro, acabaria com a vida.
— Não, Sigrid, meu amor. Tu não farás nada disso. Queres saber porquê?
Ela não replicou, logo. Olhava-o com os seus olhos imensos, azuis, agora serenos.
— Fala.
Ele disse com voz rouca.
— Eu também posso fazer chantagem, compreendes? Sei que, se pretendes casar com Lassiter, é porque ele te ameaça divulgar uma história. Uma história que... Bem, concretamente, se amanhã não estiveres em Turner para casar comigo, voltarei aqui, mas não será para te procurar, mas sim a teu pai. Então, a morte galopará comigo. E tudo.
Mas não o era. Evans compreendeu-o no minuto seguinte, quando Sigrid soltou um pequeno grito de raiva e levou as mãos ao seio. Quase instantaneamente, esta reapareceu e Evans teve de disparar com o "Colt" ainda na cintura, enquanto saltava de costas, evitando, por puro milagre, que a bala da pequena 'Derringer" o atingisse. Pela segunda vez, num curto espaço de tempo, arrebatava das mãos de quem o queria matar, a arma homicida.
Olharam-se como dois mortais inimigos.
— Tu...tu não farás isso, Clark.
O sorriso dele era gelado.
— Não, se nos encontrarmos amanhã, ás doze, em Turner, minha linda. Senão…
— Não é meu pai Clark! Não é! —Olhou-o intensamente, e acrescentou —. Porque queres matar o meu avô?
O riso frio e quase inumano de Evans, interrompeu-a.
— Não mintas mais, Sigrid. Como vês, estou ao facto de tudo. Josias Bolton não é teu avô, mas sim teu pai. Há um assassínio de permeio, em tudo isto, e eu sei quem o cometeu. Portanto, a chantagem que Lassiter estava exercendo contigo, não serve de nada. Despede-o, e poupar-me-ás trabalho. E podes dizer também a teu pai que...
Fez um sorriso irónico e acrescentou:
— Sim, teu pai pode ser amanhã nosso padrinho de casamento, querida — fez uma ligeira pausa e disparou: — Podes dizer-lhe, também, que a emboscada que me preparou, não deu o resultado que esperava e que não siga por esse caminho, senão que o matarei, e agora não será por aquilo que tu e ele pensavam.
Sigrid acercou-se do cavalo e disse:
— Não sei o que queres dizer.
— Não? Então, que me dizes à marca deste cavalo?
Ela desviou os olhos para a montada e viu nela a marca de seu pai.
— Como? Como tens esse cavalo, Clark?
Evans explicou-lhe toda a emboscada e ela obrigou o cavalo a dar meia volta.
—Serei tua amanhã às doze, Clark — disse, simplesmente.
Sem replicar, Evans picou esporas ao cavalo e partiu a galope. Entretanto, Lassiter começava a mexer-se. Sigrid acercou-se, devagar, com gelo no olhar, esperando que ele desse mais acordo de si, o que não tardou. Lassiter sentou-se no chão e fez uma careta de dor.
— Onde está esse bastardo?
Sigrid esperou, fleumaticamente que ele terminasse com os impropérios para replicar.
— Foi-se embora.
Lassiter tentou pôr-se de pé, mas não pode. Crispou o rosto e bradou para Sigrid:
— Desejarias ver-me morto, hem? Lamentas que esse porco não o tivesse feito...
A pouco e pouco, Lassiter foi-se recompondo e, auxiliado pela rapariga pôs-se em pé e montou a cavalo.
— Diz ao velho que adiamos a boda por uns dias. — Foi a despedida, ao esporear o cavalo.
Por sua vez, Sigrid saltou também para a montada e empreendeu o regresso a casa. O que se tinha passado só confirmava a sua ideia de que seu pai, o velho Bolton que, até à chegada de Lassiter a Turner, tinha passado por seu avô, se encontrava em perigo de vida.
Pensamentos tumultuosos desorientavam-na um pouco.
Lassiter...
Se este suspeitasse o ódio que ela albergava na alma por aquele que pretendia casar com ela...
Quando chegou ao rancho, seu pai aguardava-a, para lhe dizer:
— Clark Evans voltou a Turner. Que vais fazer?
— Nada, pai. Que posso eu fazer?
— Escuta: não é do meu agrado que cases com Lassiter. — Olhou-a fixamente, e acrescentou: — Evans voltou, e eu sei que lhe continuas querendo. Vai vê-lo e fala com ele. E o melhor que podes fazer.
Com o rosto intensamente ruborizado, Sigrid respondeu, desviando os olhos do pai:
— Amanhã falarei com Evans. Entrou no rancho sem acrescentar palavra e sem olhar para trás, enquanto o rancheiro movia, penosamente, a cabeça de um lado para o outro, talvez em consequência das desagradáveis recorda-ações que lhe, acudiam à mente, com a força dum tufão.

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