domingo, 17 de fevereiro de 2019

CLF023.08 O perfil do bandido Dick Cobb

Encontraram as reses e quatro ou cinco milhas do rancho.
Depois do barulho da noite anterior, uma vez vencido o pânico, tinham-se reunido e, sem saber o que fazer, ficaram a mordiscar a erva seca e sumarenta que crescia no prado.
Ao John e ao Russ não custou muito encontrá-las. Bastara-lhes seguir o rasto claramente marcado. Agitando os chapéus e dando estridentes gritos, puseram em marcha a pequena manada e empreenderam o caminho de regresso para casa. John, que cavalgava pensativo, disse de repente.
— Meditei no que disseste ontem à noite e acho que tens razão. Dois tipos como nós não podem ajudar em nada essa rapariga. E melhor dizer-lhe que procure a proteção do xerife.
Russ fez em gesto de troça.
 — Não lhe vai servir de muito. Buttons não é homem que queira sarilhos.
—Mas, foste tu que me aconselhaste...
—Aconselhei-te a não nos metermos nisto; mas, não te falei do xerife. O melhor que Deborah pode fazer é abandonar isto tudo e ir para o mais longe possível, para um sítio onde Cobb não a possa encontrar. Talvez seja a Califórnia o local mais indicado.
John assentiu.
— Sim, falarei hoje mesmo com ela. Apesar de ser triste pensar que terá de abandonar tudo o que é seu. Já sei que o rancho vale pouco mas é tudo o que ela possui.
— Vale mais abandonar isto do que perder a vida — comentou


Russ filosoficamente. — Já viste o que aconteceu ao seu avô. Conheço Cobb e sei o perigo que representa tê-lo por inimigo.
John não fez mais nenhum comentário. Estavam já muito perto do rancho quando viram que, pela esquerda, se aproximava um cavaleiro, que parou exatamente no meio do caminho por onde tinham de passar.
— Parece que esse tipo quer falar connosco — disse John.
De repente Russ empalideceu intensamente e os seus olhos abriram-se desmesuradamente.
—John -- balbuciou. —E Dick Cobb! Sim. Digo-te que é ele!
John sentiu despertar a sua curiosidade. Tinha para isso vários motivos. Em primeiro lugar, o que tinha dito Russ sobre a sua habilidade no manejo do revólver, e, em segundo lugar, a sua semelhança com ele. À medida que se aproximavam foi examinando o homem. detalhadamente.
Era um indivíduo mais velho de que ele, talvez de uns trinta e cinco anos, mas com a mesma estatura e corpulência. As feições tinham também um corte semelhante, mas talvez mais duras. A maior diferença estava nos olhos negros, ardentes e cruéis. Vestia camisa e calças escuras, botas à cowboy chapéu de abas largas e à volta da cintura levava um cinturão do qual pendia um revólver bastante caído sobre a coxa. A expressão do seu semblante era fria e impassível. Mantinha-se muito direito na sela do seu cavalo, com a vista cravada nos dois homens. Quando estes chegaram ao pé dele, detiveram-se. John e Cobb estudaram-se em silêncio até que o último disse com uma voz fria:
—De maneira que vocês são os que apareceram a ajudar a rapariga...
Russ apressou-se a dizer:
—Sim. Mas a partir de agora… 
John impôs-lhe silêncio com um gesto enérgico. Depois, muito calmo, encarou o pistoleiro.
—E verdade, tanto o meu amigo como eu temos o costume de ajudar quem queremos. E temos também o costume de não dar explicações a desconhecidos.
O pistoleiro mantinha os seus olhos negros cravados nos do jovem.
—Chamo-me Dick Cobb.
— Eu chamo-me John Lee. E o meu amigo chama-se Russ Cobb arqueou uma sobrancelha.
—John Dee? Já ouvi falar de ti.
—Tens essa vantagem—disse o jovem, com sarcasmo. —Eu nunca tinha ouvido o teu nome.
Cobb não fez nenhum comentário.
—Escuta-me, Lee. Voa-te dar um bom conselho.
—Não te pedi nenhum—replicou o rapaz tranquilamente.
E, puxando da sua bolsa de tabaco, começou a enrolar um cigarro. O outro observava-o com insistência.
—De qualquer maneira, vou-to dar. Deixa de meter o nariz onde não és chamado.
John acendeu o cigarro e expulsou uma espessa baforada de fumo.
—Em vista da tua amabilidade, quero corresponder da mesma maneira. Aí vai o meu conselho: deixa Deborah em paz.
Russ transpirava de angústia.
— Por favor, John — balbuciou. —Lembra-te...
Mas o rapaz ordenou-lhe bruscamente:
—Fecha o bico, por favor.
Russ emudeceu. Cobb apertou os lábios.
— Acho que ainda não reparaste de que assunto muito perigoso.
John sorriu.
— Pelo contrário. Cobb, sei-o muito bem. Já deixei cinco dos teus homens de barriga para cima. Não achas que é uma prova suficiente?
O tom irónico usado pelo rapaz não pareceu incomodar nada o domínio de Cobb, que, depois de urna pequena pausa, perguntou:
— Qual é o teu jogo, Lee?
O rapaz tirou o cigarro dos lábios.
—O meu jogo? Não percebo.
Cobb fez um gesto de impaciência.
— Percebes muito bem. Já te disse que tenho ouvido falar de ti. Sei que és um tipo esperto. Reconheço que sozinho liquidaste cinco dos meus homens. És inteligente e ambicioso. Não tenho nenhum interesse em tornar-me teu inimigo... Creio que poderíamos entender-nos bom.
John arremessou o cigarro ao chão.
—Estás a propor-me uma aliança.
—Qualquer coisa desse género. Não quero mais obstáculos neste assunto. Tenho a certeza de que poderíamos chegar a uru acordo. E se as coisas correrem bem, não vejo inconveniente para que não continuemos a trabalhar juntos. Tu e eu, Lee, poderíamos tornar-nos ricos.
—Isso seria fantástico! — exclamou Russ, entusiasmado. — Suponho, John, que não te importarias que eu continuasse a andar contigo.
O rapaz não afastava os seus olhos dos de Cobb.
—E como é exatamente esse assunto?
Cobb sorriu pela primeira vez.
— Isso sabê-lo-ás quando te unires a mim, mas só depois de triunfarmos
John assentiu.
—Compreendo. Não queres mostrar as tuas cartas, não é verdade? Acho bem.
—Então qual é a tua resposta?
John aspirou profundamente antes de responder:
—Eu posso ser um homem perdido, um aventureiro e muitas mais coisas desagradáveis, mas há uma coisa que me distingue fundamentalmente de ti: não sou um assassino como tu, não disparo contra velhos indefesos. Eu nunca teria sido capaz de matar Wood. Sempre que tenho lutado tem sido cara a cara, contra adversários da minha categoria e deixando sempre que fosse ele o primeiro a puxar o revólver. Não, Cobb, não sou um assassino de velhos. Isso deixo-o para os tipos como tu.
O pistoleiro tinha-se posto rígido sobre a sua sela de montar. Os seus olhos negros flamejavam. Russ, instintivamente, retrocedeu aterrado. Mas John continuava a enfrentá-lo, calmo e muito seguro de si. Só a sua mão direita permanecia próxima do revólver. Mas Dick Cobb não puxou do seu. Fazendo um visível esforço para dominasse, sussurrou:
—Está bem, Lee. Tu o quiseste assim. Voltaremos a encontra-nos numa altura mais oportuna. Já te adverti do perigo que corres.
E, picando o cavalo com as esporas, deu meia-volta e afastou-se galopando. Russ, com um lenço, secava o suor que lhe humedecia a cara.
—Estás doido, John, doido varrido — murmurou com acento desfalecido. — Não percebes o que isto significa?
—Sei perfeitamente. É uma declaração de guerra.
— Mas porque o fizeste? Há bocado concordavas em não te meteres no assunto.
— Mudei de opinião. Ajudarei Deborah a lutar contra este tipo. Senti nojo de mim mesmo por pensar, ainda que por um momento, em deixar Deborah à mercê dum tal assassino. Além disso não gosto que ninguém me dê conselhos sobre o que devo fazer. Aborrecem-me os indivíduos que ameaçam toda a gente.
A Russ parecia não lhe entrar na cabeça a atitude do seu amigo.
—Estás doido
—Talvez. Mas não sei por que te preocupas. Não tens a obrigação de ficar. Se não gostas, podes voltar para Dodge.
—Podes apostar a cabeça em como me vou embora! —exclamou Russ.
Puseram a manada novamente em marcha dirigindo-se para o rancho.
— Por momentos, pensei que Cobb ia disparar contra ti. — Murmurou Russ.
— Já vês que não o fez.
--Está bem, mas não penses que ele tem medo de ti. Cobb é daqueles que só faz as coisas quando o julga oportuno. Se agora não aceitou a luta é porque espera uma ocasião mais propícia. E quando esta se apresente, cairá sobre ti como um abutre.
John encolheu os ombros.
—Não digo que ele tenha medo de mim, mas eu também não tenho dele. Quando chegar o momento é que se verá qual dos dois vale mais.
Russ parecia preocupado.
—Tem cuidado, John. Já te disse que Cobb é rapidíssimo com o revólver. Talvez mais rápido do que tu.
— Não acredito que falte muito tempo para tirarmos dúvidas — replicou o rapaz, com indiferença.
Deborah esperava-os à porta da cabana. Quando as reses ficaram todas fechadas na vedação, aproximou-se dos dois homens.
— Quem era o cavaleiro que os fez parar no alto da colina? —perguntou com um semblante um tanto pálido. —Vi-os a falar com ele.
John franziu o sobrolho.
— Era Dick Cobb.
A rapariga respirou fundo.
—Bem me parecia. Que queria?
—Advertiu-nos que não nos metêssemos neste assunto --disse Russ, com expressão sombria.
A rapariga assentiu e murmurou, com voz trémula:
— Sim, é melhor que se vão embora e me deixem sozinha. Já fizeram bastante por mim e não têm nada que pôr as vidas em perigo. Deu meia-volta e rapidamente entrou para casa.

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