sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

PAS697. No baile, sem a navalha

Ana e Red não sabiam se passara um minuto ou um ano, tamanha era a intensidade do seu olhar e o pulsar dos seus corações.
— Quer dançar?
Ana não respondeu. Continuava a olhar Red. Afastou os braços com graça. Red enlaçou-a. Momentos depois dançavam em silêncio.
Quando terminou a música, levaram uns segundos a reparar nisso. Não tinham trocado uma só palavra. Então, começaram á rir alegremente.
— Bonito baile... — disse ela, e os seus dentes brilharam ao reflexo da luz, assim como os seus olhos verdes.
— Sério? Agora, se quiser, posso convidá-la a tomar um refresco.
Ana esquecera-se por completo de Jeff e de Nancy; mas, em face da gentileza de Red, recordou-se deles. Ficou calada e olhou em redor. Jeff não estava. Viria, porventura? Quanto a Nancy, encontrava-se no melhor dos mundos, junto do seu major, colada a ele como uma lapa, e dirigiam-se para uma mesa na qual abundavam as garrafas de champanhe. — Sim, obrigada...
Aproximaram-se do balcão.
Red tomou um uísque com soda; Ana um refresco de menta.
— Tenho a impressão de que a conheço há muito tempo e, no entanto, ainda não sei como se chama.
— Ana...
— Ana... É um bonito nome que condiz muito bem com a sua beleza suave... Eu chamo-me Red.
— Red... Três letras, como o meu.
— Agrada-me a coincidência. Sabe que traz um vestido muito bonito?
— Deveras? — Corou de prazer.
— É da mesma cor dos seus olhos.
Ela baixou as pálpebras.
— As suas palavras são muito lisonjeiras para mim, mas...'
— Não acredita nelas?
— São um cumprimento.
Red franziu o sobrolho e sorriu, ao mesmo tempo.
— Não sabe que é a rapariga mais bonita que está no baile?
— Você veio disposto a exagerar...
— Só a vi quando entrou. Esqueci-me de tudo, Ana... E você bem o sabe.
Sim, sabia. A ela acontecera-lhe o mesmo... mas não podia falar com tanta franqueza como ele.
— A sua companhia agrada-me; de contrário não a aceitaria — disse.
Começou a tocar a música.
— Voltamos a dançar?
— Sim.
E de novo se entregaram ao prazer de girarem juntos, suavemente enlaçados.
Falaram de coisas sem importância, impessoais, mas entre ambos foi-se estabelecendo urna amorosa afinidade. Red sentia-se eufórico, disposto a não deixar Ana durante toda a noite, até tocar o último compasso. Ana sentia uma doce comoção, e a sua fantasia cavalgava sem freio. Decerto, a sensação que experimentava era esse amor de que tanto falava toda a gente, e deixava-se levar por Red, encostada ao seu peito.
Quando voltaram ao balcão, ouviram-se vozes fortes lá fora.
Ana julgou reconhecer a voz de Jeff Gayar.
Os seus ouvidos não a enganavam. Jeff Gayar acabava de chegar, acompanhado de Ash, Joyce e Len.
O xerife pedira-lhes as armas. Os quatro homens tinham bebido uma respeitável quantidade de uísque e o pedido do representante da lei assentou-lhes como se lhes cravassem uma espora.
— As armas? Entregar as armas? Quer que nos assem, xerife?
— Deixa-te de tolices, Jeff Gayar apaziguou o xerife e obedece. E o mesmo digo a estes... Se não entregam os revólveres não entram.
Noutra ocasião, Jeff Gayar teria começado a distribuir socos, mas pensando em Ana dominou-se.
— Não será uma armadilha, xerife? Não somos muito bem vistos aqui, para que digamos...
— Lá dentro não está ninguém armado.
— Que lhes parece, rapazes? — perguntou Jeff Gayar aos seus.
As faces de Ash, Joyce e Len não tinham nada de amáveis.
— Como quiseres, chefe.
De súbito, Jeff Gayar sentiu a tentação de mandar tudo para o diabo, mas urna vez mais a recordação de Ana dominou a sua vontade. Ela encontrava-se, com certeza, lá dentro, à sua espera.
Estava decidido a entregar o seu armamento, dando assim o exemplo aos seus homens, quando apareceram Van Summers, Rogers e Bowl.
O xerife apertou os lábios. Os dois bandos rivais eram capazes de se começarem a desafiar passado um minuto! Viu os olhares que cruzavam entre si; pareciam navalhadas.
O aspeto de Van Summers era extremamente provocante.
— Acha que poderemos dançar à vontade, xerife? — perguntou com segunda intenção.
O representante da lei replicou:
— Para entrar no baile é preciso deixar as armas cá fora. Era isto que estava a dizer a Jeff Gayar...
— Mete o nariz em tudo, xerife.
— O baile é para se divertirem, e não para lutarem. Um pouco de paz não lhes fará mal.
Os dois ajudantes do xerife tinham-se aproximado, com as mãos nas coronhas dos revólveres.
— Talvez seja divertido isso de não usar armas —declarou Van, passando da sua atitude de desafio à de bom humor. Vamos, rapazes, quero dançar!
Pouco depois, Van, Rogers e Bowl entregavam os seus revólveres ao xerife e aos ajudantes.
Com gestos lentos, Jeff Gayar, Ash, Joyce e Len fizeram o mesmo. O único olho deste último brilhava malignamente.
À entrada, Jeff Gayar e Van Summers encontraram-se.
— Não vem longe o dia em que te torcerei o pescoço.
— Não me faças rir, Jeff Gayar. Deixarei o teu corpo como um passador. Para começar, digo-te que não vás mais cobrar proteções.
Jeff Gayar era impulsivo e naquele momento a cólera acometeu-o. Ter-se-ia atirado ao zombeteiro e ameaçador Van Summers se não ouvisse uma voz atrás de si.
Tratava-se do xerife.
— Esqueci-me de que trazes sempre contigo uma navalha afiada, Jeff Gayar, entrega-ma.
Jeff Gayar fez uma careta e obedeceu.
— Tome. Talvez seja melhor, pois creio que a cravaria em alguém até ao cabo.
O xerife revistou Van Summers e verificou que não trazia nenhuma arma cortante.
— Eu não preciso de navalha para me defender de certas feras, xerife.
— O que devem fazer é portarem-se com juízo. Não abusem da minha paciência.
Jeff Gayar ia a dizer qualquer coisa, mas, de repente, abriu muito os olhos, que se cravaram no balcão, onde um jovem par sorria e se olhava nos olhos, como se só eles existissem no mundo.
O jovem par era formado por Ana e Red.
Naquele momento, Jeff Gayar sentiu a falta da navalha...
 

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