sexta-feira, 4 de setembro de 2015

PAS525. De como a bela cantora de saloon chegou a contabilista

Encontrava-se embebido na leitura dos documentos do rancho. O tempo pareceu voar. Pois quando o capataz o chamou, para dizer-lhe que os vaqueiros acabavam de chegar, teve a impressão de que apenas haviam decorrido cinco minutos, desde a sua entrada no escritório. Abandonou a papelada e saiu ao pátio do solar. Dos degraus, onde se deteve, passou o seu olhar frio e cortante, sobre aqueles rostos cobertos de poeira e suor. Um a um, lentamente. Finalmente, falou:
— Suponho que o capataz Travis, já os tenha informado, que sou o novo proprietário do «Arizona» começou. — Não creio que isto constitua qualquer problema entre nós. E certo que costumo exi-gir muito dos meus homens, mas também é certo que procuro sempre pagar melhor do que ninguém, e dar a cada um o tratamento que merece. Chamei-os apenas para apresentar-me e dizer-lhes isto. Agora, se alguém não estiver de acordo com a mudança de proprietário, que se manifeste, e receberá dois meses de salário. Depois, tem à sua frente a pradaria. Há alguém?
Ninguém respondeu. Todos permaneceram sobre as selas, de semblantes carregados, olhando-o, como se aguardassem que ele dissesse mais alguma coisa. Mas Rod não o fez. Limitou-se a falar com o capa-tas:
— Creio que existe no rancho uma adega, não é verdade?
— Assim é, mister Burke.
— Óptimo, distribua whisky aos rapazes.
Fez menção de se dirigir para o edifício, quando os seus olhos por casualidade, se fixaram na nuvem de pó que avançava a todo o galope em direcção ao rancho. Franziu as sobrancelhas, quando reconheceu o cavaleiro, e, de pernas abertas, com os polegares metidos entre o duplo cinturão e a camisa, aguardou que este chegasse.
Vera deteve o corcel diante do pátio, com expressão ofegante, motivada pela corrida. Sobre a sela contemplou Rod, que não se moveu nem fez nada para aproximar-se dela, enquanto, por sua vez, os vaqueiros a admiravam, possuídos de assombro e perguntando, que iria ali fazer ao rancho a cantora do saloon.
Também a contemplavam por outros motivos.
Vera estava mais bela do que nunca, sobre a sela do animal. A sua saia, larga e curtíssima, mostrava grande parte das suas maravilhosas pernas, e a blusa de desenhos garridos, com um grande decote em forma de V, não era o presente mais adequado para um homem poder pensar com clareza ao seu lado. Em nada disto reparava Vera. Os seus maravilhosos olhos, não se apartavam um momento da silhueta de Rod. Indecisa, ignorando como devia portar-se com ele em público. Sem saber, se descer do cavalo ou permanecer sobre a sela. Sem saber como teria de cumprimentar aquele homem enigmático, que em poucas horas e sem uma frase de amor, havia adquirido direitos sobre ela.
Vera acabou por remexer-se inquieta sobre a sela, um pouco nervosa, perante o silêncio quase opressivo que reinava à sua volta. Rod pareceu aperceber-se disso, e então desceu os degraus. Aproximou-se do animal e estendeu os braços para a ajudar a desmontar. Vera deixou-se cair neles, e Rod depositou-a suavemente no chão.
— Vamos para dentro — disse.
E encaminhou-se para a entrada. Junto à porta deteve-se para fitar Travis. — Amanhã haverá festa no «Arizona».
— De alguma forma os rapazes têm de celebrar a mudança de patrão.
Sem dar tempo a Travis para responder, entrou acompanhado de Vera. Afastou-se para dar-lhe passagem, e depois fechou a porta atrás de si. Olharam-se de frente sem dizer uma palavra.
Sob o mesmo silêncio, Rod aproximou-se e cingiu-a pela cintura. Vera empinou-se sobre as pontas das suas botas texanas e ofereceu-lhe os lábios. Pouco depois, e enquanto compunha os cabelos, sentada num dos cómodos maples, Vera iniciou a conversação:
— É... é muito importante, mister Burke — disse.
— Bem, desembucha. Por que vieste?
— Estava explicando. Mister Dayton está em Mayer. No «Mogollon». Disse que não sairia dali sem falar consigo.
— Apenas isso?
—Não... não é só isso, e tenho medo. Há dois homens com ele. O seu capataz, conceituado como um dos seus melhores pistoleiros, e Spencer Talbot, um dos seus guarda-costas.
Rod não pareceu impressionar-se nada com a notícia.
— Sabes o que pretende?
— Não... não sei, embora adivinhe.
— Sim... E o que é?
-- Por favor, mister Burke, não brinque. Esse homem tentará matá-lo. Deu a entender que não quer a sua presença em Mayer.
— Bom — disse —, isso é o que veremos. Anda, senta-te e descansa. Depois partiremos.
— Não estou cansada, mister Burke. Podemos ir quando quiser. Mas... não se enfrentará com ele, não é verdade?
— Estamos já frente a frente, Vera.
Era a verdade. Vera não sabia o que responder àquelas palavras, e enquanto pensava, Rod estendeu o braço e segurou-lhe o queixo. Suavemente, beijou-a nos lábios, e logo, pegando-a ao colo, obrigou-a a sentar-se no maple. Cruzando uma perna sobre a outra, Vera sorriu-lhe timidamente.
— Estou cá a pensar...
Rod suspendeu-a com um gesto.
— Deixa de imaginar coisas na tua linda cabecita e escuta, Vera. A partir de hoje, vais ficar também encarregada da contabilidade do rancho.
— Mister Burke!
— O quê? É muito trabalho?
— Não... não é isso.
— Então?
— Não, nada. O senhor manda.
Olharam-se durante algum tempo, enquanto Rod acendia um cigarro. Depois, ele levantou-se.
— Vamos.
Ela saiu à frente. Pensativa, como sempre que se encontrava na sua presença. No pátio, Rod ordenou a um dos vaqueiros que fosse buscar o seu cavalo. Quando o vaqueiro chegou com o animal, vinha acompanhado de Travis, que veio perguntar-lhe se necessitava de alguma coisa, ajudou Vera a montar, e depois auxiliou Rod a subir para o seu cavalo. Sobre a sela, fitou o capataz.
— A partir de hoje, — disse. — Miss Perkins cuidará da contabilidade do «Arizona». Tem poderes meus, para pôr ou dispôr, como se fosse dona dele. Na minha ausência, desejo que ninguém discuta qualquer decisão sua.
Não esperou pela resposta, meteu as esporas nos flancos do animal e partiu a galope. Vera fez rodear o cavalo, e partiu no seu encalço, enquanto nos seus belos olhos, brilhava um olhar estranho. Decorrida meia milha, Vera emparceirou com ele, e durante algum tempo galoparam em silêncio. E quando mais convencida estava de que iam directamente para Mayer, Rod desviou o cavalo em direcção ao regato onde conhecera Lina Hendrix. Deteve o animal junto à margem e olhou-a.
— Comeste antes de vir, Vera?
— Não. Porquê?
Rod desmontou e aproximou-se, fixando o olhar na curta saia.
— Levo qualquer coisa para comer na sela — disse estendendo-lhe os braços para a ajudar a desmontar. — Podemos merendar aqui. Vamos, desce.
Vera deixou-se cair, e por momentos Rod conteve-a contra o seu peito. Depois beijou-a fugazmente, e ela foi sentar-se junto do regato. Do bolso da sela, Rod retirou um embrulho, e sentou-se ao seu lado. Os dois comeram em silêncio, e já haviam terminado quando Vera disse:
— Pensei que íamos directamente para Mayer, mister Burke.
Perante o seu mutismo, voltou-se para observá-lo. Os olhos dele estavam fitos nela, brilhantes como dois diamantes.
— Iremos mais tarde, Vera — continuou fitando-a de maneira insistente, e ela suportou esse olhar. — És uma mulher diabolicamente bela, Vera. Nunca to disse antes, mas pensei-o. Sim, terrivelmente fascinante.
— Foi só por isso, que fez tudo isto por mim?
Como resposta, Rod cingiu-a pela cintura, atraindo-a contra o seu peito.
— Sim, muito formosa — disse com voz rouca. — Maldito eu seja, quando digo isto!
Vera não teve tempo de analisar o sentido da frase final.
— Oh, Rod... eu !...

Sem comentários:

Enviar um comentário