sexta-feira, 27 de junho de 2014

PAS337. Na presença da morte


-- Você também parece estar débil. Não.., não entre, suplico-lhe.

Dobson não hesitou mais. Avançou e reconheceu Redfem, no ataúde da direita, ainda com o sangue visível de dez balas. A seguir desviou o olhar para o caixão da esquerda...

Uma bomba estilhaçou-se-lhe na cabeça, ofuscando todo o raciocínio e tingindo de vermelho carregado tudo o que via, ouvia ou pensava. A figura dilacerada, cruelmente golpeada do outro cadáver, dançou-lhe alucinantemente diante dos olhos cegos: o rosto lívido, tenso e imóvel, os olhos piedosamente cerrados sob a pasta de sangue seca e coagulada.

— Harry! — gritou, como uma fera da selva. — Harry, irmão!...

Os seus punhos embateram na madeira do ataúde, desconjuntando-a e estilhaçando-a em farpas agudas que quase o feriram. A dor tinha-se transladado para um sítio mais sensível, mais delicado: o coração.

Temendo que ele enlouquecesse, Donner tentou desviá-lo do último leito de repouso do desditoso Harry Dobson, louro, branco, dormindo o sono eterno, donde não despertaria por mais intensos que fossem os gritos de Fess.

— Vamos, Fess, calma... — pediu ansioso. — É inútil, nada resolve.

Duas tenazes de ferro apertaram os ombros de Donner. Um rosto lívido, feroz, descontrolado e terrível, surgiu--lhe junto dos olhos. Uma voz, irreconhecível, brotou dos lábios violáceos de Fess Dobson:

— Quem... quem foi, Donner ?

— Não... não sei... — Donner, atrapalhado, estrebuchou sob as garras ferozes de Fess Dobson.

— Quem, Donner ? — exigiu Dobson.— Você sabe... quem assassinou o meu irmão. Fale ou estrangulo-o.

As mãos forçaram a posição asfixiante. Donner teve que dizer o pouco que sabia, o que constava pelo povoado:

— Não sei... mas ela... ela estava presente... ela viu...

— Ela? Chris Hodges? — o grito rouco de Fess era penetrante. — Sim...

As mãos soltaram-no. O dono da casa funerária tombou por terra, enquanto Dobson desaparecia, engolido pela noite. A porta estalou atrás dele. Donner, apalpando o pescoço, indagou a si mesmo: — Que vai acontecer?

(Coleção Califórnia, nº 5)

Sem comentários:

Enviar um comentário