Doris Parker deixou-se cair sobre a cama e rompeu a chorar desconsoladamente. Tudo tinha sido como um sonho, como um sonho terrível de que não havia maneira de despertar.
Ao meio dia, quando estavam a comer em casa, apareceu um vaqueiro do rancho a gritar em frente do alpendre.
- «Miss» Parker! Abra bem os ouvidos que trago uma boa notícia!
Doris levantou-se da mesa e correu até à porta.
— Que notícia é essa que me trazes, James?
O vaqueiro disse:
— Lembra-se daquele potro azeviche que vimos há uma semana junto do Risco Ermitão?
— Então não havia de lembrar-me! Disse-lhes que queria para mim. James riu-se alegremente.
— Bom, pois já é seu. Laçámo-la esta manhã, e tem-no o velho Ben com o rebanho do vale.
— Oh! James! — exclamou ela, com os olhos a brilhar de satisfação. -- Obrigada!
— Mas tenha cuidado com ele. É o potro mais arisco e selvagem que já vi. É preciso domá-lo primeiro antes de montá-lo.
— Doma-lo tu, vaqueiro?
— Sem dúvida! E juro-lhe que o vou deixar tão meigo como uma noiva que eu tive no Kansas. Vai ver. Ela riu-se e disse:
— Quando for à cidade, prometo trazer-te urna prenda, James.
— Bom, agradeço. Mas não gaste muito dinheiro ou o seu pai Sie-me na rua com um pontapé.
— De acordo.
Já não pôde comer. A notícia excitara-a tanto que mal conseguiu manter-se sentada, enquanto os outros acabavam de almoçar. E, em seguida, preparou-se a fim de se dirigir para a remonta que ia vender-se dois dias depois ao Exército.
Nolan Merrick, que tinha comido com eles, dispôs-se a acompanhá-la. Selaram dois cavalos, e dirigiram-se, para a parte sul do vale, onde o velho Benjamim Farros tratava dos cavalos que os vaqueiros iam apartando para a venda.
Meia hora depois chegavam à vedação onde já estavam reunidos mais de trinta cavalos.
Ben Farros estava sentado no alto do cercado, com o velho chapéu atirado para os olhos e a barbicha branca sumida por falta de dentes. Saudou-os com um gesto alegre do braço, mal os viu aparecer.
— Já sabia que vinhas corno um relâmpago! — disse o velho, rindo.
Doris aproximou a montada do cercado e procurou com os olhos ávidos entre a trintena de cavalos que se agitavam nervosos dentro da vedação. Depois perguntou:
— Onde está ele, Ben?
— Ali o tens, pequena.
Era um potro esbelto, de longas crinas e cabeça orgulhosa. O pelo negríssimo brilhava como se estivesse untado de azeite.
— Oh, é magnífico, Ben!
— Sim, é um bonito cavalo -- corroborou Nolan Merrick. --- Mas temo que não o possas montar tão cedo, querida.
Realmente, o potro não parecia muito disposto a deixar-se montar por ninguém. Ia de um lado para o outro do cercado, calculava as suas possibilidades para saltar, erguia-se sobre as patas traseiras e olhava desafiadoramente em roda, em tensa guarda.
— James disse que mo vai domar —assegurou a jovem.
— E com certeza que o faz — assentiu o velho. Mas digo-te que vai ter trabalho, se é que o bicho não lhe parte a cabeça quando for montá-lo.
Nolan Merrick estava a olhar para a colina que limitava o rancho pelo Sul, onde aparecera uma nuvenzinha de pó por entre os zimbros.
— Vocês deixam o gado aproximar-se tanto dos limites? — perguntou ao velho. E apontou para a colina.
Benjamim Farras franziu os olhinhos maliciosos e resmungou qualquer coisa.
— Evidentemente que não, «mister» Merrick! Aposto pescoço em como esse cavaleiro não é dos nossos. Os rapazes estão daquele outro lado que dá para o vale. É ali que andam os cavalos.
— Quem poderá então ser?
— Alguém que vem da povoação e que não conhece bem o caminho, acho eu.
O cavaleiro chegou ao terreno plano e aproximou-se a galope dos cercados. Não o reconheceram enquanto não parou o cavalo junto da vedação. E foi Doris quem primeiro o reconheceu.
— Bob! — gritou. — Bob, nem posso acreditar!
E correu alegremente para ele sem pensar sequer nos que estavam a acompanhá-la. Dean saltou precipitadamente do cavalo e recebeu Doris nos braços. Estreitou-a com força contra o peito.
— Doris, querida...
— Oh, Bob, julguei que nunca mais voltavas!
Nolan Merrick tinha ficado imóvel, rígido, pálido. O seu rosto estava contraído num esgar de raiva e os seus olhos despediam chispas. Bob fitou-o e disse:
-- Olá, Merrick! Não esperavas esta surpresa, hem? Por certo pensavas que, a estas horas, Jas e eu andávamos a vagabundear, mortos de fome, a muitas milhas daqui. Mas bem vês que não é assim.
— Não me interessava nada saber por onde vocês andavam — respondeu Merrick, surdamente. — Mas talvez seja melhor teres vindo.
— Claro que é. Há umas certas coisas que precisam de ser arrumadas. Por exemplo, vou dar-te uma ordem: não voltes à pôr os pés neste rancho enquanto Doris aqui estiver... o que será por pouco tempo. Vou casar com ela amanhã mesmo.
— Oh, Bob! — ruborizou-se ela um pouco assustada.
Merrick franziu as pálpebras como se a luz lhe ferisse a vista.
— Estás convencido disso? — perguntou.
— Ficarei, logo que ela me disser que aceita casar-se comigo. Já não sou um vagabundo miserável que tem de mendigar o pão aos outros, Nolan. Agora tenho dinheiro. Já posso oferecer-lhe uma vida decente a meu lado e quero saber se ela aceita.
Voltou-se para Doris e perguntou:
— Queres casar comigo, Doris?
-- Oh, sim. Quero, Bob! Mas...
— Quê?
— Não quero que falem assim nem que lutem um com o outro. Eu aprecio-te muito, Nolan, mas bem sabes que não estou apaixonada por ti. Sabe-lo muito bem. Sempre amei o Bob. Se aceitei a tua companhia é porque o meu pai quer que eu case contigo. Mas não posso fazê-lo. Não te amo.
Merrick não disse nada. O seu rosto tinha a cor da cera e crispava os punhos de raiva.
Bob deu um passo para ele, firme, e disse, num desafio:
— Agora que já ouviste, Nolan, espero não ter de to recordar. E uma coisa ainda: Penso pôr a claro toda aquela embrulhada que tu arranjaste para me expulsares de Sakersfield. Demonstrarei que me acusaste de ladrão só para evitar que eu me casasse com Doris, e, quando tudo ficar bem claro, mato-te.
Doris deu um salto e abraçou-se freneticamente a Dean.
— Bob, por favor, não digas isso. Diz-me que não o farás!
— Não. Decidi fazê-lo— replicou ele, teimosamente. — Assim é melhor que ele se prepare.
— Aceito a tua ameaça, Bob — disse Merrick Mas lembra-te de que eu não vou esperar tanto tempo para matar-te a ti.
— Veremos quem ganha, Nolan. Queres resolver isso agora mesmo?
— Não, por favor! — soluçou Doris.
Merrick pensou um segundo e depois replicou:
— Eu esperarei a ocasião, Bob.
— Muito bem. Quando quiseres. E agora, põe-te andar daqui.
Nolan Merrick hesitou uns segundos. As suas mãos crispavam-se nervosamente, perto da cintura e os olhos calculavam as possibilidades. Mas a atitude firme de Bob Dean oferecia poucas garantias de se sair bem do duelo.
Lentamente, sem dizer nada, o rancheiro deu meia volta e foi até onde deixara atado o cavalo.
Doris separou-se de Bob e acercou-se de Nolan Merrick.
— Oh, Nolan, suplico-te! Não lutem!
— Garanto-te que não vai haver luta disse pondo o pé no estribo e subindo para a cavalo. — as coisas já não se podem modificar.
Pegou nas rédeas e, quando parecia que ia iniciar a marcha, o que fez foi voltar-se corno um raio. Na sua mão direita apareceu um revólver.
Bob estava em frente, alheio a tudo. Quando atentou no perigo, já Merrick tinha apertado o gatilho duas vezes consecutivas.
Dean, assombrado, tropeçou grotescamente e caiu de bruços no chão. Aí ficou, imóvel, contorcido.
Quem reagiu primeiro foi o velho Benjamim Farros. Saltou agilmente a vedação e foi ajoelhar-se junto do caído. Doris, por seu lado, soltou um grito de horror e quis correr também para Bob. Merrick, porém, deteve-a violentamente por um braço.
— Acabou-se! Entendes-me?-
Ela, louca de raiva, esbofeteou-o, deu-lhe pontapés Para soltar-se.
— Assassino! Assassino! — gritava.
— Cala-te!
— Larga-me, assassino!
Merrick que tremia de excitação estendeu a mão e esbofeteou-a furiosamente. Doris caiu no chão. E ali ficou quase sem dar acordo de si, gemendo, feita num novelo.
O rancheiro ficou de pé, junto dela, com o rosto transfigurado.
— Agora escuta isto, Doris. Ninguém saberá nada, ouves?
— Hão-de sabê-lo todos! Hei-de denunciar-te. És um assassino!
Ele agarrou-a pelos cabelos, obrigando-a lar a cabeça.
— Cala-te! Cala-te ou faço contigo fiz com ele.
E voltou a bater-lhe, irritado pelos insultos.
Benjamim Farros aproximou-se deles abanando cabeça.
— Morreu — disse.
Merrick olhou-o com desconfiança.
— E então?
— Oiça, eu não tenho tanta genica como a Doris —disse Ben. — Sou velho e já vi muitas coisas. Aprendi a pensar com a cabeça, e não com o coração. Bob Dean está morto, e ninguém pode ressuscitá-lo. Nós estamos ainda vivos. Temos que olhar a isso.
— Gosto que pense assim— tranquilizou-se o rancheiro.
Ben Farras acrescentou:
— Dean, ao fim e ao cabo, só vinha trazer discórdias e desgostos a todos. «Mister» Parker não havia de gostar ele o ver aparecer. E o senhor é um homem honrado... apesar de ter tido esta fraqueza. Assim, o melhor é não perder tempo e enterrar este homem. Ninguém precisa de saber.
— Está disposto a ajudar-me, Ben? — perguntou Merrick.
— Com certeza! Afaste-se daqui e leve Doris consigo. Eu me encarrego de lhe arranjar um buraco onde ninguém o encontre.
— Hei-de pagar-lhe bem a sua ajuda.
— Bem sei, «mister» Merrick. E é outra coisa que tenho em conta. Ajudando-o a si, posso tirar proveito. Ajudando Dean, só tiro dores de cabeça. Os mortos, mortos estão.
Doris levantou-se furiosa.
— Você também! Canalhas! Vou denunciar os dois!
— Acalme-se, menina — aconselhou o velho. Lembre-se que deve olhar pela sua felicidade e esta não vai encontrá-la num homem sem dinheiro, nem recebendo a maldição de seu pai.
— Eu encarrego-me dela — disse Merrick. Encerre-o você quanto antes.
— Descanse. Tenho ali a ferramenta.
Doris perdeu por completo a cabeça. Precipitou-se para Merrick disposta a arrebatar-lhe o revólver.
— Vou matá-los aos dois! — gritava. — Como fizeram ao Bob. O rancheiro não teve remédio senão bater-lhe de novo. Desta vez a pancada fê-la perder os sentidos e cair como um saco vazio.
Merrick tomou-a nos braços e subiu para o cavalo, colocando o corpo da jovem à sua frente.
— Vá-se embora quanto antes — apressou o velho. — Os vaqueiros podem voltar de um momento para o outro.
Quando Doris recuperou os sentidos, encontrava-se, na companhia de Nolan, no bosque de abetos que cobria grande parte do rancho. E durante toda a tarde de explicou-lhe bem as coisas.
— Tens dois caminhos a seguir, Doris: casar comigo e calares-te, ou trocar-me as voltas e dar à língua. Se seguires o primeiro caminho, podes chegar a esquecer-te de Bob. Serás feliz comigo... Se não, nem tu nem o teu pai terão ocasião de ver o resultado. Pensa bem nisto.
E Doris começou a ter medo. Um medo horrível. Sobretudo quando se sentiu espiada pelos olhos chispantes de Nolan Merrick, quando sentiu nos rins o cano do revólver... quando compreendeu que, antes de ser capaz de dizer o que queria, ele teria tempo de sobra para matá-la e matar o seu pai.
E não teve coragem para dizer a Jas Conley nem ao xerife o que lhe queimava o coração.
Por isso chorava. Era o seu único alívio; Mas jurou a si própria, mil vezes, que encontraria ensejo para denunciar Merrick. Tinha de vingar Bob.
Ao meio dia, quando estavam a comer em casa, apareceu um vaqueiro do rancho a gritar em frente do alpendre.
- «Miss» Parker! Abra bem os ouvidos que trago uma boa notícia!
Doris levantou-se da mesa e correu até à porta.
— Que notícia é essa que me trazes, James?
O vaqueiro disse:
— Lembra-se daquele potro azeviche que vimos há uma semana junto do Risco Ermitão?
— Então não havia de lembrar-me! Disse-lhes que queria para mim. James riu-se alegremente.
— Bom, pois já é seu. Laçámo-la esta manhã, e tem-no o velho Ben com o rebanho do vale.
— Oh! James! — exclamou ela, com os olhos a brilhar de satisfação. -- Obrigada!
— Mas tenha cuidado com ele. É o potro mais arisco e selvagem que já vi. É preciso domá-lo primeiro antes de montá-lo.
— Doma-lo tu, vaqueiro?
— Sem dúvida! E juro-lhe que o vou deixar tão meigo como uma noiva que eu tive no Kansas. Vai ver. Ela riu-se e disse:
— Quando for à cidade, prometo trazer-te urna prenda, James.
— Bom, agradeço. Mas não gaste muito dinheiro ou o seu pai Sie-me na rua com um pontapé.
— De acordo.
Já não pôde comer. A notícia excitara-a tanto que mal conseguiu manter-se sentada, enquanto os outros acabavam de almoçar. E, em seguida, preparou-se a fim de se dirigir para a remonta que ia vender-se dois dias depois ao Exército.
Nolan Merrick, que tinha comido com eles, dispôs-se a acompanhá-la. Selaram dois cavalos, e dirigiram-se, para a parte sul do vale, onde o velho Benjamim Farros tratava dos cavalos que os vaqueiros iam apartando para a venda.
Meia hora depois chegavam à vedação onde já estavam reunidos mais de trinta cavalos.
Ben Farros estava sentado no alto do cercado, com o velho chapéu atirado para os olhos e a barbicha branca sumida por falta de dentes. Saudou-os com um gesto alegre do braço, mal os viu aparecer.
— Já sabia que vinhas corno um relâmpago! — disse o velho, rindo.
Doris aproximou a montada do cercado e procurou com os olhos ávidos entre a trintena de cavalos que se agitavam nervosos dentro da vedação. Depois perguntou:
— Onde está ele, Ben?
— Ali o tens, pequena.
Era um potro esbelto, de longas crinas e cabeça orgulhosa. O pelo negríssimo brilhava como se estivesse untado de azeite.
— Oh, é magnífico, Ben!
— Sim, é um bonito cavalo -- corroborou Nolan Merrick. --- Mas temo que não o possas montar tão cedo, querida.
Realmente, o potro não parecia muito disposto a deixar-se montar por ninguém. Ia de um lado para o outro do cercado, calculava as suas possibilidades para saltar, erguia-se sobre as patas traseiras e olhava desafiadoramente em roda, em tensa guarda.
— James disse que mo vai domar —assegurou a jovem.
— E com certeza que o faz — assentiu o velho. Mas digo-te que vai ter trabalho, se é que o bicho não lhe parte a cabeça quando for montá-lo.
Nolan Merrick estava a olhar para a colina que limitava o rancho pelo Sul, onde aparecera uma nuvenzinha de pó por entre os zimbros.
— Vocês deixam o gado aproximar-se tanto dos limites? — perguntou ao velho. E apontou para a colina.
Benjamim Farras franziu os olhinhos maliciosos e resmungou qualquer coisa.
— Evidentemente que não, «mister» Merrick! Aposto pescoço em como esse cavaleiro não é dos nossos. Os rapazes estão daquele outro lado que dá para o vale. É ali que andam os cavalos.
— Quem poderá então ser?
— Alguém que vem da povoação e que não conhece bem o caminho, acho eu.
O cavaleiro chegou ao terreno plano e aproximou-se a galope dos cercados. Não o reconheceram enquanto não parou o cavalo junto da vedação. E foi Doris quem primeiro o reconheceu.
— Bob! — gritou. — Bob, nem posso acreditar!
E correu alegremente para ele sem pensar sequer nos que estavam a acompanhá-la. Dean saltou precipitadamente do cavalo e recebeu Doris nos braços. Estreitou-a com força contra o peito.
— Doris, querida...
— Oh, Bob, julguei que nunca mais voltavas!
Nolan Merrick tinha ficado imóvel, rígido, pálido. O seu rosto estava contraído num esgar de raiva e os seus olhos despediam chispas. Bob fitou-o e disse:
-- Olá, Merrick! Não esperavas esta surpresa, hem? Por certo pensavas que, a estas horas, Jas e eu andávamos a vagabundear, mortos de fome, a muitas milhas daqui. Mas bem vês que não é assim.
— Não me interessava nada saber por onde vocês andavam — respondeu Merrick, surdamente. — Mas talvez seja melhor teres vindo.
— Claro que é. Há umas certas coisas que precisam de ser arrumadas. Por exemplo, vou dar-te uma ordem: não voltes à pôr os pés neste rancho enquanto Doris aqui estiver... o que será por pouco tempo. Vou casar com ela amanhã mesmo.
— Oh, Bob! — ruborizou-se ela um pouco assustada.
Merrick franziu as pálpebras como se a luz lhe ferisse a vista.
— Estás convencido disso? — perguntou.
— Ficarei, logo que ela me disser que aceita casar-se comigo. Já não sou um vagabundo miserável que tem de mendigar o pão aos outros, Nolan. Agora tenho dinheiro. Já posso oferecer-lhe uma vida decente a meu lado e quero saber se ela aceita.
Voltou-se para Doris e perguntou:
— Queres casar comigo, Doris?
-- Oh, sim. Quero, Bob! Mas...
— Quê?
— Não quero que falem assim nem que lutem um com o outro. Eu aprecio-te muito, Nolan, mas bem sabes que não estou apaixonada por ti. Sabe-lo muito bem. Sempre amei o Bob. Se aceitei a tua companhia é porque o meu pai quer que eu case contigo. Mas não posso fazê-lo. Não te amo.
Merrick não disse nada. O seu rosto tinha a cor da cera e crispava os punhos de raiva.
Bob deu um passo para ele, firme, e disse, num desafio:
— Agora que já ouviste, Nolan, espero não ter de to recordar. E uma coisa ainda: Penso pôr a claro toda aquela embrulhada que tu arranjaste para me expulsares de Sakersfield. Demonstrarei que me acusaste de ladrão só para evitar que eu me casasse com Doris, e, quando tudo ficar bem claro, mato-te.
Doris deu um salto e abraçou-se freneticamente a Dean.
— Bob, por favor, não digas isso. Diz-me que não o farás!
— Não. Decidi fazê-lo— replicou ele, teimosamente. — Assim é melhor que ele se prepare.
— Aceito a tua ameaça, Bob — disse Merrick Mas lembra-te de que eu não vou esperar tanto tempo para matar-te a ti.
— Veremos quem ganha, Nolan. Queres resolver isso agora mesmo?
— Não, por favor! — soluçou Doris.
Merrick pensou um segundo e depois replicou:
— Eu esperarei a ocasião, Bob.
— Muito bem. Quando quiseres. E agora, põe-te andar daqui.
Nolan Merrick hesitou uns segundos. As suas mãos crispavam-se nervosamente, perto da cintura e os olhos calculavam as possibilidades. Mas a atitude firme de Bob Dean oferecia poucas garantias de se sair bem do duelo.
Lentamente, sem dizer nada, o rancheiro deu meia volta e foi até onde deixara atado o cavalo.
Doris separou-se de Bob e acercou-se de Nolan Merrick.
— Oh, Nolan, suplico-te! Não lutem!
— Garanto-te que não vai haver luta disse pondo o pé no estribo e subindo para a cavalo. — as coisas já não se podem modificar.
Pegou nas rédeas e, quando parecia que ia iniciar a marcha, o que fez foi voltar-se corno um raio. Na sua mão direita apareceu um revólver.
Bob estava em frente, alheio a tudo. Quando atentou no perigo, já Merrick tinha apertado o gatilho duas vezes consecutivas.
Dean, assombrado, tropeçou grotescamente e caiu de bruços no chão. Aí ficou, imóvel, contorcido.
Quem reagiu primeiro foi o velho Benjamim Farros. Saltou agilmente a vedação e foi ajoelhar-se junto do caído. Doris, por seu lado, soltou um grito de horror e quis correr também para Bob. Merrick, porém, deteve-a violentamente por um braço.
— Acabou-se! Entendes-me?-
Ela, louca de raiva, esbofeteou-o, deu-lhe pontapés Para soltar-se.
— Assassino! Assassino! — gritava.
— Cala-te!
— Larga-me, assassino!
Merrick que tremia de excitação estendeu a mão e esbofeteou-a furiosamente. Doris caiu no chão. E ali ficou quase sem dar acordo de si, gemendo, feita num novelo.
O rancheiro ficou de pé, junto dela, com o rosto transfigurado.
— Agora escuta isto, Doris. Ninguém saberá nada, ouves?
— Hão-de sabê-lo todos! Hei-de denunciar-te. És um assassino!
Ele agarrou-a pelos cabelos, obrigando-a lar a cabeça.
— Cala-te! Cala-te ou faço contigo fiz com ele.
E voltou a bater-lhe, irritado pelos insultos.
Benjamim Farros aproximou-se deles abanando cabeça.
— Morreu — disse.
Merrick olhou-o com desconfiança.
— E então?
— Oiça, eu não tenho tanta genica como a Doris —disse Ben. — Sou velho e já vi muitas coisas. Aprendi a pensar com a cabeça, e não com o coração. Bob Dean está morto, e ninguém pode ressuscitá-lo. Nós estamos ainda vivos. Temos que olhar a isso.
— Gosto que pense assim— tranquilizou-se o rancheiro.
Ben Farras acrescentou:
— Dean, ao fim e ao cabo, só vinha trazer discórdias e desgostos a todos. «Mister» Parker não havia de gostar ele o ver aparecer. E o senhor é um homem honrado... apesar de ter tido esta fraqueza. Assim, o melhor é não perder tempo e enterrar este homem. Ninguém precisa de saber.
— Está disposto a ajudar-me, Ben? — perguntou Merrick.
— Com certeza! Afaste-se daqui e leve Doris consigo. Eu me encarrego de lhe arranjar um buraco onde ninguém o encontre.
— Hei-de pagar-lhe bem a sua ajuda.
— Bem sei, «mister» Merrick. E é outra coisa que tenho em conta. Ajudando-o a si, posso tirar proveito. Ajudando Dean, só tiro dores de cabeça. Os mortos, mortos estão.
Doris levantou-se furiosa.
— Você também! Canalhas! Vou denunciar os dois!
— Acalme-se, menina — aconselhou o velho. Lembre-se que deve olhar pela sua felicidade e esta não vai encontrá-la num homem sem dinheiro, nem recebendo a maldição de seu pai.
— Eu encarrego-me dela — disse Merrick. Encerre-o você quanto antes.
— Descanse. Tenho ali a ferramenta.
Doris perdeu por completo a cabeça. Precipitou-se para Merrick disposta a arrebatar-lhe o revólver.
— Vou matá-los aos dois! — gritava. — Como fizeram ao Bob. O rancheiro não teve remédio senão bater-lhe de novo. Desta vez a pancada fê-la perder os sentidos e cair como um saco vazio.
Merrick tomou-a nos braços e subiu para o cavalo, colocando o corpo da jovem à sua frente.
— Vá-se embora quanto antes — apressou o velho. — Os vaqueiros podem voltar de um momento para o outro.
Quando Doris recuperou os sentidos, encontrava-se, na companhia de Nolan, no bosque de abetos que cobria grande parte do rancho. E durante toda a tarde de explicou-lhe bem as coisas.
— Tens dois caminhos a seguir, Doris: casar comigo e calares-te, ou trocar-me as voltas e dar à língua. Se seguires o primeiro caminho, podes chegar a esquecer-te de Bob. Serás feliz comigo... Se não, nem tu nem o teu pai terão ocasião de ver o resultado. Pensa bem nisto.
E Doris começou a ter medo. Um medo horrível. Sobretudo quando se sentiu espiada pelos olhos chispantes de Nolan Merrick, quando sentiu nos rins o cano do revólver... quando compreendeu que, antes de ser capaz de dizer o que queria, ele teria tempo de sobra para matá-la e matar o seu pai.
E não teve coragem para dizer a Jas Conley nem ao xerife o que lhe queimava o coração.
Por isso chorava. Era o seu único alívio; Mas jurou a si própria, mil vezes, que encontraria ensejo para denunciar Merrick. Tinha de vingar Bob.
Sem comentários:
Enviar um comentário