sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

CNT005_P01. Carta de apresentação da mulher teimosa



O velho «mr.» Kenneth tirou o lenço da algibeira do casaco e levou-o aos olhos para enxugar uma lágrima rebelde. Depois, tossiu, para aclarar a voz, e disse para o homem que estava sentado na sua frente:
— Obrigado, Zark Kelly. São indivíduos como você, que ainda nos fazem acreditar na humanidade. Nem calcula o peso que me tira de sobre os ombros! Há quatro dias que estou em Nova Iorque e há quatro dias que não durmo! E como posso dormir, sabendo que Louise está sozinha no rancho? Pobre filha!
— E «mr.» Kenneth — retorquiu o interpelado — porque deixou as suas propriedades entregues a... uma mulher? O Oeste ainda não é sítio para as mulheres poderem dominar. Isso é bom, aqui, em Nova Iorque. Lá, onde a voz de uma arma faz calar todas as vozes humanas, só o homem pode fazer-se respeitar e temer, desde que seja valente e destemido. E foi por saber que a sua filha estava sozinha contra os muitos perigos que a devem rodear, que me ofereci para ir visitar o seu rancho, enquanto o senhor anda cá, pela cidade, a tratar dos seus negócios. Custa-me saber que alguém atacou uma mulher... e é esse o destino que espera a sua filha.
— Um momento. — atalhou o velho. — Não são esses os meus receios. É precisamente o contrário. O que não me deixa dormir não é o temor de saber a minha filha atacada... é o de ela atacar! Louise é como um cavalo bravo, nascido e criado nas montanhas. Perdeu a mãe aos três anos e até agora, que conta vinte e quatro, só tem vivido entre homens. Lutou contra os índios, e maneja o laço e o «colt» melhor do que qualquer «cow-boy» vulgar. Além disso, possui um espírito irrequieto e todos os dias inventa as mais disparatadas partidas para pregar aos vaqueiros. Na minha presença é ela quem ocupa o lugar de capataz, e conduz os homens nos trabalhos com perícia difícil de igualar. Só tenho medo, Kelly, é que Louise se exceda nas suas brincadeiras de mau gosto e haja um cobarde qualquer que a atinja à traição... porque, de frente, em Dallas City, não existe um homem que a possa enfrentar. Apesar disto, ainda mantém a sua oferta de ir ao rancho?
Zark Kelly conservou o velho em espectativa durante alguns minutos, e acabou por decidir:
— Em qualquer dos casos... vou. E são duas as razões. Primeiro porque tenho interesse em conhecer uma mulher assim; segundo, porque quero estudar a propriedade antes de emprestar-lhe o dinheiro que pediu!
«Mr.» Kenneth sorriu de satisfeito.

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