segunda-feira, 5 de maio de 2014

PAS301. A última noite de Glória Kane

 Foi uma longa noite, para Glória Kane. Sentada à cabeceira do ferido, deixou passar as horas, mergulhada nos seus pensamentos, imóvel na cadeira, sem outro movimento que não fosse o de tocar brandamente com a mão, de quando em quando, na testa quente do ferido.
Duas ou três vezes Curtis Farbell entrou no quarto, acompanhado por dois ou três batedores. Glória sentia os olhares dos homens fitos nela, e desejou que não voltassem mais, que a deixassem só com os seus remorsos. À meia-noite visitou-a o chefe. Trazia uma fumegante chávena de café e alguns biscoitos, que deixou sobre a mesa.
-Vamos, minha filha, tome isto. A febre continua não é verdade?
Ela fez um sinal afirmativo e secou as lágrimas. Depois aconchegou as roupas da cama, em volta dos ombros do ferido.
- Evelyn… -delirou Forrester. – O pequeno…
Continuou a murmurar palavras initeligíveis, mas o nome de Evelyn chegou aos ouvidos da jovem, nitidamente. Foi como uma flecha envenenada que se lhe cravou no peito.

Pela manhã, a febre diminuiu e o médico ordenou que se desse algum alimento ao ferido. Cerca do meio-dia, apareceu Curtis Farbell, acompanhado por Evelyn e pelo pequeno Jeb. Glória Kane saiu, devagar, sentindo um estranho frio em todo o corpo.
O pequeno aproximou-se da cama com a mãe e pegou numa das mãos de Milton Forrester.
- Como se sente? – perguntou ele. – O seu companheiro já me disse que foram os índios que o feriram. Quando eu for homem, também serei batedor, e eles hão-de pagar isto.
Forrester sorriu e os seus olhos procuraram os de Evelyn. Quando Curtis Farbell saiu do quarto, ela aproximou.se um pouco mais da cama, para apertar a outra mão do ferido.
Entretanto Glória saíra do quartel e dirigira-se, cambaleante, para a barra, à porta, onde estava amarrado o cavalo. Não fez caso dos galanteios um tanto reles que lhe dirigiam dois homens que, a julgar pelo seu aspeto, deviam ter bebido mais do que a conta. Dispôs-se a montar, mas os bêbedos, encorajados pelo silêncio dela, aproximaram-se ainda mais, e um deles decidiu-se a agarrá-la por um braço.
- Escuta, pombinha… -disse ele, em voz rouca. – Vem comigo. Ainda tenho uns dólares no bolso para te convidar a beber uns copos.
Glória Kane sacudiu a mão que a agarrava, enquanto os dois homens riam de uma maneira alvar e grosseira.
- Deixe-me e vá para o inferno!
O segundo bêbedo agarrou-a pelo outro braço, mas soltou-a imediatamente ao receber um tremendo pontapé numa canela que o fez recuar com um berro.
Tudo aconteceu rapidamente a partir de então. Quando o homem se dobrou para agarrar a perna dorida, a coronha do seu revólver apareceu, tentadoramente, aos olhos de Glória Kane. Rápida, ela apoderou-se da arma para os intimidar. Mas o primeiro que tinha abordado pensou que a jovem ia disparar sobre eles e antecipou-se, um tanto por instinto. A contração dos músculos, ao sentir a bala rasgar-lhe o corpo, fez que Glória disparasse por sua vez, e a pesada bala «45» atravessou a cabeça do homem, pouco antes de a jovem cair morta entre as patas dos seu cavalo.
Da porta do quartel, Curtis Farbell presenciara a rápida cena, e quando quis intervir já era tarde demais.
- Pobre rapariga… - murmurou o velho batedor. – É como se o Destino, no último instante, quisesse ser benévola para ela, levando-a deste mundo…
(Coleção Arizona, nº68)

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