-- Mudaram os guardas — disse Mason surdamente, afastando-se da janela. O ruído duns passos perdeu-se ao longe. — Isto indica que são doze horas exatas.
Shady, deitado na tarimba, não respondeu. O olhar vagueava distraidamente pelo tecto. Esperava. Não sabia o quê, mas esperava. Alguma coisa tinha que suceder. Bom ou mal.
Reinava um clima de tensão na cela. As horas passavam, a noite caminhava para o seu fim, nada perturbava a calma do forte. Fora do forte, Rio Cobre dormia pacificamente.
Crooks estava sentado na tarimba, Lyman parecia dormir. Só meia hora depois, soaram os passos do carcereiro na onda habitual da meia-noite, ao longo do corredor mal iluminado.
Uma figura alta e corpulenta, vestida de azul, movia-se pesadamente tilintando as chaves que carregava à cintura. Ninguém se moveu e os músculos e os nervos crisparam-se. A sentinela passou lentamente perscrutando o interior da cela.
Shady Dolan endureceu. Sabia que a prisão militar tinha uma saída no extremo oposto. O carcereiro voltou novamente e estacou diante da entrada da cela. Olhou-os inquisitorialmente.
— Não conseguem dormir, porcos confederados? — indagou o carcereiro, rudemente.
— Enquanto andas nas proximidades, será impossível replicou Mason. — Falas demais, para que se possa adormecer
— Ah, sim? —O carcereiro riu-se entre dentes. Uma das mãos dirigiu-se para o revólver enquanto que com a outra soltou as chaves. — Vais-me repetir isso, se tiveres coragem
— A um estúpido yanque pode-se dizer tudo — replicou Crooks, incisivo.
A porta abriu-se. O carcereiro entrou empunhando o revólver, dominando completamente o grupo. O ruído característico do percutor da arma soou secamente.
— Muito bem, adiante então — disse o carcereiro com voz forte. — Qual é o primeiro herói?
Crooks avançou dois passos. Dolan, tenso, esperava acontecimentos. De repente, a voz do carcereiro baixou de tom e proferiu rapidamente:
— Tomem o meu revólver e derrubem-me! É preciso que me deixem sem sentidos ou então descobriam a farsa. Encontrareis armas no cubículo da guarda.
Temporariamente surpreso, Crooks não se mexeu. Dolan, de reflexos mais rápidos, lançou-se para diante como uma catapulta humana. Golpeou o ventre da sentinela com a cabeça, ao mesmo tempo que lhe arrancava a arma da mão. Terminou o impacto com um tremendo soco no rosto que enviou o carcereiro contra a parede. Ali ficou, inconsciente, ou fingindo com muita perfeição o desmaio.
Rapidamente, Dolan arrebatou as chaves ao carcereiro e chefiou a fuga dos prisioneiros para um dos recantos mais sombrios. Cerrou a porta com o carcereiro no interior, para dar maior verosimilhança no ataque ao guarda. Começaram a caminhar com cuidado para uma escada próxima que conduzia ao pátio exterior.
—Não seria melhor que fosse eu a chefiar o grupo? —observou Crooks. — Dê-me esse revólver, Dolan e reúna-se com Lyman e Mason.
Os olhos azuis do forasteiro nada tinham de amável quando encararam Mason.
— Lastimo, Crooks, mas ser chefe dum grupo, não implica necessariamente que seja por nomeação. Eu agarrei este revólver e dirijo a ação. Se lhe agradar, siga connosco. Caso contrário, retire-se.
— Dolan, você esquece que este golpe foi preparado para nós, e não para você.
—E você parece ignorar que eu também sou réu de morte, e que seria muito estúpido se ficasse na cela à espera da execução.
— Isso parece-me justo, mas não o apoderar-se da chefia do grupo.
— Estou farto dessa conversa, Crooks. — interpelou Mason, irritado. — Mande quem mande, o importante é sair. Ora Dolan não me parece que seja estúpido.
Crooks emudeceu. Lyman dirigiu a Shady um sorriso animador e o grupo alcançou rapidamente o pátio da prisão. Dolan fez um pequeno gesto, indicando a todos para permanecerem imóveis. Lentamente, penetrou sozinho na divisão onde os soldados dormiam profundamente nas suas tarimbas.
Sobre um fogão rudimentar, uma marmita desprendia um agradável aroma de café. Sobre uma larga mesa, havia resíduos de comida e vinho. Dolan tomou uma das vasilhas e agitou-a ligeiramente. Os soldados continuaram a dormir profundamente. Dolan sorriu-se. Os soldados não acordariam, nem que usassem canhões, porque tinha sido utilizado um bom narcótico. Regressou à porta e acenou aos restantes para que entrassem.
Silenciosamente, apoderaram-se das armas dispersas pela sala. Mason que estava espreitando recuou vivamente e gaguejou para os companheiros:
— Estão duas sentinelas inspecionando o pátio. Não podemos sair.
— Claro que podemos — replicou Shady Dolan, observando os soldados adormecidos. Trocou um olhar com Crooks. -- Compreende?
— Naturalmente. Mãos à obra, Dolan — disse o sulista, esquecendo a breve discussão com o californiano.
Aproximaram-se dos soldados adormecidos. Trabalharam rápida e delicadamente. Alguns momentos mais tarde, quatro soldados com os bivaques bem embarretados, saíram pela porta que dava para o pátio. Carregavam espingarda e tinham um ar absolutamente seguro e normal. Uma das sentinelas olhou-os com surpresa, distinguindo num dos vultos as divisas de sargento.
— Sargento! — exclamou. — Precisa de alguma coisa?
O sargento replicou com um resmungo ininteligível, e dois dos soldados encaminharam-se para as cavalariças. Era tudo tão natural e lógico, que nenhuma das sentinelas suspeitou do que se estava passando. A escuridão da noite e a segurança dos quatro homens facilitou a fuga.
Quando perceberam que aqueles soldados não eram os que estavam nos alojamentos, era já tarde para se defenderem e para dar o alarme. Caíram sobre eles com violência, enquanto os amordaçavam.
Estendidos as duas sentinelas no terreno, Shady pesquisou em redor. Percebeu que Crooks tencionava massacrar os dois vultos caídos a golpes com a coronha da carabina, e atalhou com rudeza, apontando-lhe a carabina como por acaso:
—Não faça. isso, Crooks! Não podemos perder tempo a matar, a não ser que seja absolutamente inevitável. Vamos, devemos sair daqui, antes que alguém dê o alarme e nos obstruam a saída. Mason, arranje quatro cavalos e leve-os para o exterior. Envolva os cascos com bocados do uniforme desses dois soldados e evite qualquer ruído. Nós vamos abrindo o caminho para a saída.
— Iria consigo até ao fim do mundo — disse Douglas Lyman fervorosamente, junto dele.
Dolan sorriu, dando-lhe uma leve palmada no ombro.
—Obrigado, rapaz. Oxalá não seja preciso ir tão longe... Vamos!
Dolan, Crooks e Lyman cruzaram uma passagem que separava o pátio da prisão, dum outro mais largo e extenso que pertencia ao próprio Fort Cooper. Estavam lá mais três sentinelas. Um, próximo do mastro onde ondulava a bandeira da União: os outros dois faziam a ronda junto do portão que dava comunicação para o exterior.
— A saída... — balbuciou Lyman, nervoso. —Tão próxima... e tão inacessível!
—Temos que alcançá-la ou morrer. — Disse Dolan sombriamente. — Até agora tudo foi fácil. Temos que mostrar aquilo que valemos.
— Você parece ter tomado todas as iniciativas, Dolan —respondeu Crooks secamente. — Diga lá os planos.
— São simples. Você e Lyman contornam as muralhas, e atacam as sentinelas de surpresa. Entretanto, eu cuidarei da sentinela que está no meio do pátio. Nele disporei de refúgio para me ocultar, mas espero que as minhas divisas de sargento impeçam a sentinela de atirar. Curvando-me e ocultando o rosto é possível que a sentinela não descubra a minha identidade.
Separaram-se sem discutir. Se Crooks discordava do plano, não apresentou nenhuma objeção. Como Dolan devia saber que, acima de tudo, precisavam de ação e sangue-frio. Era lutar contra o tempo e cada segundo que passavam em Fort era um passo para o pelotão do fuzilamento.
Dolan saiu da sombra, caminhando diretamente para a sentinela. Esta, rápida, apontou a espingarda e indagou:
— Quem é?
—Sou eu, rapaz— disse Dolan com voz rouca.
Levantou o braço, de modo que as divisas se pudessem perceber à luz difusa do luar.
— Oh, sargento, a princípio não o tinha conhecido — respondeu o jovem, abaixando a arma. — Pareceu-me mais alto...
O falso sargento riu entre dentes como se o comentário fosse muito engraçado. Observou os bastiães que ladeavam a porta. As duas sentinelas, imperturbáveis continuavam na sua ronda. Crooks e Lyman estavam invisíveis, protegidos pela escuridão. Avançou alguns passos, até estar quase à frente da sentinela. Esta, com a espingarda na mão, ainda que não estivesse apontada, perscrutava as feições do sargento, tentando identificá-lo.
— Eh, sargento, espere — balbuciou, hesitante. — Talvez esteja equivocado, mas não tenho a certeza que...
Dolan pressentiu que o êxito ou o fracasso, isto é, a vida ou a morte, dependiam daquele instante crucial. Não vacilou. Dolan não era homem para vacilar em situações desesperadas. Lançou-se num mergulho súbito sobre o soldado. Este tentou gritar e levantou a espingarda para se defender do impacto. A carabina golpeou o rosto de Dolan, mas não foi suficientemente violenta para travar o gesto de Dolan. As suas mãos apertaram o pescoço do jovem, impedindo-o que soltasse qualquer som. Este golpeou-o duas vezes, com a coronha da arma, nas espáduas. Dolan sentiu a dor penetrar-lhe o corpo, mas não cedeu. Acima de tudo, era preciso evitar que o soldado disparasse. Um tiro seria o alarme e a morte para todos eles. Desferiu um soco violento no ventre. O rapaz dobrou-se, tossindo.
Uma das sentinelas do bastião, voltou-se rapidamente, percebendo que alguma anormalidade se estava passando. Exclamou qualquer coisa para o companheiro que girou apontando a espingarda. Nesse mesmo instante, duas sombras saíram da escuridão, caíram sobre eles e as armas resvalaram pelo solo. Quatro corpos revolveram-se por terra, numa luta de morte.
Shady, no centro do pátio, já tinha conseguido pôr a sentinela inconsciente. Arquejante, levantou a cabeça, percebendo que os seus companheiros estavam a levar a melhor. Sorriu. Tudo ia bem; talvez demasiado bem. Não lhe agradavam as facilidades excessivas. Sempre costumavam ter complicações inesperadas no final.
Tomou as armas do guarda, extraiu-lhe as munições e arremessou-as para o solo. Pegou no seu próprio revólver, o que tinha roubado ao sargento e avançou para os seus companheiros. Uma figura corporizou-se a seu lado. Parecia Crooks. A voz confirmou a suposição:
— Pronto, Dolan.
Lyman tinha (vencido o seu adversário. Um revólver com reflexos azulados brilhava na sua mão.
— Eu também — respondeu igualmente o jovem.
Dolan voltou-se na direção das cavalariças. Mason chegava com os cavalos, cujos cascos pouco barulho faziam devido a estar enrolados em trapos que amorteciam os sons.
Foi nesse instante, em que a liberdade estava à vista, que sucedeu o desastre. Foi sem dúvida, um reflexo muscular ou nervoso do adversário vencido por Lyman, que provocou o disparo do jovem. O tiro ribombou na noite em múltiplos ecos. Dolan lançou imprecações e Mason apressou os cavalos. Luzes amarelas acenderam-se em diversas janelas do forte, ouviram-se vozes e gritarias, e a calma foi substituída por uma febril atividade em torno dos fugitivos.
— Depressa, para os cavalos e que cada um se salve como puder — gritou Dolan com voz. rouca, precipitando-se para o grande portão de saída.
Mason estava já junto deles, Lyman e Crooks montaram os cavalos enquanto Dolan acionava o grande tronco que servia de alavanca à porta. Alguns soldados semivestidos apareceram junto do edifício lateral e ao notar os fugitivos, abriram fogo, O ruído áspero dos revólveres, acompanhado de chamas violáceas, animou a noite com a sua canção mortífera.
Shady disparou enquanto Mason também o auxiliava a abrir a pesada porta. Crooks e Lyman também disparavam protegendo os companheiros que continuavam a tentar abrir o portão. Por fim, Shady Dolan abriu os dois batentes, com um suspiro de alívio. Mason parecia ter recebido um soco no estômago.
— Mason! — chamou. — Está ferido?
— Não... não é nada, Dolan... Obrigado... — apoiou-se dificilmente na porta e num esforço evidente, dirigiu-se para o seu cavalo que montou a custo.
Poucos momentos mais tarde, os quatro cavaleiros saíam velozmente pelo portão.
Dolan não se iludia. Agora começava o verdadeiramente difícil. Não podiam descansar, perseguidos por tais inimigos.
Ele corria tanto perigo como os restantes três, Se fosse capturado, ou se disparassem sobre ele, dificilmente o comandante Wilkers chegaria a tempo de revelar aos seus homens que aquele sulista condenado à morte, era na realidade um agente da União numa missão secreta...
Seria-lhes possível escapar aos soldados da União? Tinham um fator a seu favor: Kansas era um território simpatizante do Sul, apesar de estar ocupado pelas tropas nortistas. Mas quatro fugitivos, em território ocupado pelo inimigo, não era fácil salvarem-se. A missão dele, era descobrir quem estava por detrás da intriga, quem se ocultava atrás de Mason, Crooks e Lyman, saber quem dirigia os rebeldes em território federal.
Enquanto galopava através da noite, sentindo sibilar as balas dos soldados muito próximas da sua cabeça, Dolan ia recordando algumas das frases incongruentes que tinha ouvido na terrível noite que passara na cela: «O Profeta»... «Sétima Missão»... E uma cidade: Coffeyville, Kansas...
Faltava conhecer a ligação que existiria entre todas estas palavras, e principalmente o nome do chefe sulista que dirigia as operações no território da União. Esta era a missão de Shady Dolan, aparentemente um sulista sincero, mas na realidade, agente secreto do Exército da União.
Shady, deitado na tarimba, não respondeu. O olhar vagueava distraidamente pelo tecto. Esperava. Não sabia o quê, mas esperava. Alguma coisa tinha que suceder. Bom ou mal.
Reinava um clima de tensão na cela. As horas passavam, a noite caminhava para o seu fim, nada perturbava a calma do forte. Fora do forte, Rio Cobre dormia pacificamente.
Crooks estava sentado na tarimba, Lyman parecia dormir. Só meia hora depois, soaram os passos do carcereiro na onda habitual da meia-noite, ao longo do corredor mal iluminado.
Uma figura alta e corpulenta, vestida de azul, movia-se pesadamente tilintando as chaves que carregava à cintura. Ninguém se moveu e os músculos e os nervos crisparam-se. A sentinela passou lentamente perscrutando o interior da cela.
Shady Dolan endureceu. Sabia que a prisão militar tinha uma saída no extremo oposto. O carcereiro voltou novamente e estacou diante da entrada da cela. Olhou-os inquisitorialmente.
— Não conseguem dormir, porcos confederados? — indagou o carcereiro, rudemente.
— Enquanto andas nas proximidades, será impossível replicou Mason. — Falas demais, para que se possa adormecer
— Ah, sim? —O carcereiro riu-se entre dentes. Uma das mãos dirigiu-se para o revólver enquanto que com a outra soltou as chaves. — Vais-me repetir isso, se tiveres coragem
— A um estúpido yanque pode-se dizer tudo — replicou Crooks, incisivo.
A porta abriu-se. O carcereiro entrou empunhando o revólver, dominando completamente o grupo. O ruído característico do percutor da arma soou secamente.
— Muito bem, adiante então — disse o carcereiro com voz forte. — Qual é o primeiro herói?
Crooks avançou dois passos. Dolan, tenso, esperava acontecimentos. De repente, a voz do carcereiro baixou de tom e proferiu rapidamente:
— Tomem o meu revólver e derrubem-me! É preciso que me deixem sem sentidos ou então descobriam a farsa. Encontrareis armas no cubículo da guarda.
Temporariamente surpreso, Crooks não se mexeu. Dolan, de reflexos mais rápidos, lançou-se para diante como uma catapulta humana. Golpeou o ventre da sentinela com a cabeça, ao mesmo tempo que lhe arrancava a arma da mão. Terminou o impacto com um tremendo soco no rosto que enviou o carcereiro contra a parede. Ali ficou, inconsciente, ou fingindo com muita perfeição o desmaio.
Rapidamente, Dolan arrebatou as chaves ao carcereiro e chefiou a fuga dos prisioneiros para um dos recantos mais sombrios. Cerrou a porta com o carcereiro no interior, para dar maior verosimilhança no ataque ao guarda. Começaram a caminhar com cuidado para uma escada próxima que conduzia ao pátio exterior.
—Não seria melhor que fosse eu a chefiar o grupo? —observou Crooks. — Dê-me esse revólver, Dolan e reúna-se com Lyman e Mason.
Os olhos azuis do forasteiro nada tinham de amável quando encararam Mason.
— Lastimo, Crooks, mas ser chefe dum grupo, não implica necessariamente que seja por nomeação. Eu agarrei este revólver e dirijo a ação. Se lhe agradar, siga connosco. Caso contrário, retire-se.
— Dolan, você esquece que este golpe foi preparado para nós, e não para você.
—E você parece ignorar que eu também sou réu de morte, e que seria muito estúpido se ficasse na cela à espera da execução.
— Isso parece-me justo, mas não o apoderar-se da chefia do grupo.
— Estou farto dessa conversa, Crooks. — interpelou Mason, irritado. — Mande quem mande, o importante é sair. Ora Dolan não me parece que seja estúpido.
Crooks emudeceu. Lyman dirigiu a Shady um sorriso animador e o grupo alcançou rapidamente o pátio da prisão. Dolan fez um pequeno gesto, indicando a todos para permanecerem imóveis. Lentamente, penetrou sozinho na divisão onde os soldados dormiam profundamente nas suas tarimbas.
Sobre um fogão rudimentar, uma marmita desprendia um agradável aroma de café. Sobre uma larga mesa, havia resíduos de comida e vinho. Dolan tomou uma das vasilhas e agitou-a ligeiramente. Os soldados continuaram a dormir profundamente. Dolan sorriu-se. Os soldados não acordariam, nem que usassem canhões, porque tinha sido utilizado um bom narcótico. Regressou à porta e acenou aos restantes para que entrassem.
Silenciosamente, apoderaram-se das armas dispersas pela sala. Mason que estava espreitando recuou vivamente e gaguejou para os companheiros:
— Estão duas sentinelas inspecionando o pátio. Não podemos sair.
— Claro que podemos — replicou Shady Dolan, observando os soldados adormecidos. Trocou um olhar com Crooks. -- Compreende?
— Naturalmente. Mãos à obra, Dolan — disse o sulista, esquecendo a breve discussão com o californiano.
Aproximaram-se dos soldados adormecidos. Trabalharam rápida e delicadamente. Alguns momentos mais tarde, quatro soldados com os bivaques bem embarretados, saíram pela porta que dava para o pátio. Carregavam espingarda e tinham um ar absolutamente seguro e normal. Uma das sentinelas olhou-os com surpresa, distinguindo num dos vultos as divisas de sargento.
— Sargento! — exclamou. — Precisa de alguma coisa?
O sargento replicou com um resmungo ininteligível, e dois dos soldados encaminharam-se para as cavalariças. Era tudo tão natural e lógico, que nenhuma das sentinelas suspeitou do que se estava passando. A escuridão da noite e a segurança dos quatro homens facilitou a fuga.
Quando perceberam que aqueles soldados não eram os que estavam nos alojamentos, era já tarde para se defenderem e para dar o alarme. Caíram sobre eles com violência, enquanto os amordaçavam.
Estendidos as duas sentinelas no terreno, Shady pesquisou em redor. Percebeu que Crooks tencionava massacrar os dois vultos caídos a golpes com a coronha da carabina, e atalhou com rudeza, apontando-lhe a carabina como por acaso:
—Não faça. isso, Crooks! Não podemos perder tempo a matar, a não ser que seja absolutamente inevitável. Vamos, devemos sair daqui, antes que alguém dê o alarme e nos obstruam a saída. Mason, arranje quatro cavalos e leve-os para o exterior. Envolva os cascos com bocados do uniforme desses dois soldados e evite qualquer ruído. Nós vamos abrindo o caminho para a saída.
— Iria consigo até ao fim do mundo — disse Douglas Lyman fervorosamente, junto dele.
Dolan sorriu, dando-lhe uma leve palmada no ombro.
—Obrigado, rapaz. Oxalá não seja preciso ir tão longe... Vamos!
Dolan, Crooks e Lyman cruzaram uma passagem que separava o pátio da prisão, dum outro mais largo e extenso que pertencia ao próprio Fort Cooper. Estavam lá mais três sentinelas. Um, próximo do mastro onde ondulava a bandeira da União: os outros dois faziam a ronda junto do portão que dava comunicação para o exterior.
— A saída... — balbuciou Lyman, nervoso. —Tão próxima... e tão inacessível!
—Temos que alcançá-la ou morrer. — Disse Dolan sombriamente. — Até agora tudo foi fácil. Temos que mostrar aquilo que valemos.
— Você parece ter tomado todas as iniciativas, Dolan —respondeu Crooks secamente. — Diga lá os planos.
— São simples. Você e Lyman contornam as muralhas, e atacam as sentinelas de surpresa. Entretanto, eu cuidarei da sentinela que está no meio do pátio. Nele disporei de refúgio para me ocultar, mas espero que as minhas divisas de sargento impeçam a sentinela de atirar. Curvando-me e ocultando o rosto é possível que a sentinela não descubra a minha identidade.
Separaram-se sem discutir. Se Crooks discordava do plano, não apresentou nenhuma objeção. Como Dolan devia saber que, acima de tudo, precisavam de ação e sangue-frio. Era lutar contra o tempo e cada segundo que passavam em Fort era um passo para o pelotão do fuzilamento.
Dolan saiu da sombra, caminhando diretamente para a sentinela. Esta, rápida, apontou a espingarda e indagou:
— Quem é?
—Sou eu, rapaz— disse Dolan com voz rouca.
Levantou o braço, de modo que as divisas se pudessem perceber à luz difusa do luar.
— Oh, sargento, a princípio não o tinha conhecido — respondeu o jovem, abaixando a arma. — Pareceu-me mais alto...
O falso sargento riu entre dentes como se o comentário fosse muito engraçado. Observou os bastiães que ladeavam a porta. As duas sentinelas, imperturbáveis continuavam na sua ronda. Crooks e Lyman estavam invisíveis, protegidos pela escuridão. Avançou alguns passos, até estar quase à frente da sentinela. Esta, com a espingarda na mão, ainda que não estivesse apontada, perscrutava as feições do sargento, tentando identificá-lo.
— Eh, sargento, espere — balbuciou, hesitante. — Talvez esteja equivocado, mas não tenho a certeza que...
Dolan pressentiu que o êxito ou o fracasso, isto é, a vida ou a morte, dependiam daquele instante crucial. Não vacilou. Dolan não era homem para vacilar em situações desesperadas. Lançou-se num mergulho súbito sobre o soldado. Este tentou gritar e levantou a espingarda para se defender do impacto. A carabina golpeou o rosto de Dolan, mas não foi suficientemente violenta para travar o gesto de Dolan. As suas mãos apertaram o pescoço do jovem, impedindo-o que soltasse qualquer som. Este golpeou-o duas vezes, com a coronha da arma, nas espáduas. Dolan sentiu a dor penetrar-lhe o corpo, mas não cedeu. Acima de tudo, era preciso evitar que o soldado disparasse. Um tiro seria o alarme e a morte para todos eles. Desferiu um soco violento no ventre. O rapaz dobrou-se, tossindo.
Uma das sentinelas do bastião, voltou-se rapidamente, percebendo que alguma anormalidade se estava passando. Exclamou qualquer coisa para o companheiro que girou apontando a espingarda. Nesse mesmo instante, duas sombras saíram da escuridão, caíram sobre eles e as armas resvalaram pelo solo. Quatro corpos revolveram-se por terra, numa luta de morte.
Shady, no centro do pátio, já tinha conseguido pôr a sentinela inconsciente. Arquejante, levantou a cabeça, percebendo que os seus companheiros estavam a levar a melhor. Sorriu. Tudo ia bem; talvez demasiado bem. Não lhe agradavam as facilidades excessivas. Sempre costumavam ter complicações inesperadas no final.
Tomou as armas do guarda, extraiu-lhe as munições e arremessou-as para o solo. Pegou no seu próprio revólver, o que tinha roubado ao sargento e avançou para os seus companheiros. Uma figura corporizou-se a seu lado. Parecia Crooks. A voz confirmou a suposição:
— Pronto, Dolan.
Lyman tinha (vencido o seu adversário. Um revólver com reflexos azulados brilhava na sua mão.
— Eu também — respondeu igualmente o jovem.
Dolan voltou-se na direção das cavalariças. Mason chegava com os cavalos, cujos cascos pouco barulho faziam devido a estar enrolados em trapos que amorteciam os sons.
Foi nesse instante, em que a liberdade estava à vista, que sucedeu o desastre. Foi sem dúvida, um reflexo muscular ou nervoso do adversário vencido por Lyman, que provocou o disparo do jovem. O tiro ribombou na noite em múltiplos ecos. Dolan lançou imprecações e Mason apressou os cavalos. Luzes amarelas acenderam-se em diversas janelas do forte, ouviram-se vozes e gritarias, e a calma foi substituída por uma febril atividade em torno dos fugitivos.
— Depressa, para os cavalos e que cada um se salve como puder — gritou Dolan com voz. rouca, precipitando-se para o grande portão de saída.
Mason estava já junto deles, Lyman e Crooks montaram os cavalos enquanto Dolan acionava o grande tronco que servia de alavanca à porta. Alguns soldados semivestidos apareceram junto do edifício lateral e ao notar os fugitivos, abriram fogo, O ruído áspero dos revólveres, acompanhado de chamas violáceas, animou a noite com a sua canção mortífera.
Shady disparou enquanto Mason também o auxiliava a abrir a pesada porta. Crooks e Lyman também disparavam protegendo os companheiros que continuavam a tentar abrir o portão. Por fim, Shady Dolan abriu os dois batentes, com um suspiro de alívio. Mason parecia ter recebido um soco no estômago.
— Mason! — chamou. — Está ferido?
— Não... não é nada, Dolan... Obrigado... — apoiou-se dificilmente na porta e num esforço evidente, dirigiu-se para o seu cavalo que montou a custo.
Poucos momentos mais tarde, os quatro cavaleiros saíam velozmente pelo portão.
Dolan não se iludia. Agora começava o verdadeiramente difícil. Não podiam descansar, perseguidos por tais inimigos.
Ele corria tanto perigo como os restantes três, Se fosse capturado, ou se disparassem sobre ele, dificilmente o comandante Wilkers chegaria a tempo de revelar aos seus homens que aquele sulista condenado à morte, era na realidade um agente da União numa missão secreta...
Seria-lhes possível escapar aos soldados da União? Tinham um fator a seu favor: Kansas era um território simpatizante do Sul, apesar de estar ocupado pelas tropas nortistas. Mas quatro fugitivos, em território ocupado pelo inimigo, não era fácil salvarem-se. A missão dele, era descobrir quem estava por detrás da intriga, quem se ocultava atrás de Mason, Crooks e Lyman, saber quem dirigia os rebeldes em território federal.
Enquanto galopava através da noite, sentindo sibilar as balas dos soldados muito próximas da sua cabeça, Dolan ia recordando algumas das frases incongruentes que tinha ouvido na terrível noite que passara na cela: «O Profeta»... «Sétima Missão»... E uma cidade: Coffeyville, Kansas...
Faltava conhecer a ligação que existiria entre todas estas palavras, e principalmente o nome do chefe sulista que dirigia as operações no território da União. Esta era a missão de Shady Dolan, aparentemente um sulista sincero, mas na realidade, agente secreto do Exército da União.
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