Ainda dormia, tal como uma criança, quando Donkey abandonou o quarto e foi ao estábulo selar os dois cavalos, trazendo-os, a seguir, para a porta do hotel.
Foi nesse momento que descortinou dois pistoleiros na rua. Não os conhecia, nunca os vira na sua vida, mas Donkey estava certo de terem vindo de Pueblo na sua pegada, talvez enviados por Spencer.
Não se enganava, pois um deles, que nesse instante descia do passeio para a rua, perguntou — lhe ao chegar ao centro desta:
— Joe Donkey, não é verdade?
— Exatamente.
— Eu chamo-me Jones e, na companhia do meu amigo Lass, temos vindo no vosso encalço.
— Sim? E que pretendem de mim?
— Oh, diabo, amigo Jones. Julguei-o um rapaz esperto. Não vai querer certamente, que eu lhe faça engolir o recado, não é assim?
Jones voltou-se um pouco para se dirigir ao companheiro que ficara um pouco distanciado.
— Parece que ele não nos entende, Joss.
— Fala-lhe mais claro, Jones.
Talvez não te tenhas explicado bem.
— Pois vou fazê-lo agora, e se não me entender, e porque você é o mais perfeito dos imbecis. Ouviu bem, Donkey?
— Magnificamente. Continue.
— Há alguém em Pueblo que não quer que você volte ali.
— E a respeito de "miss" Miller, que lhe disse ele?
O pistoleiro exibiu um sorriso asqueroso.
— Oh, é uma mulher muito formosa e
— E...?
— Tencionamos levá-la connosco. Essa pessoa precisa de uns milhares de dólares para aplicar num negócio, compreende?
— Compreendo perfeitamente. Prossiga, por favor.
— Já resta pouco por dizer. O pai da pequena terá de os largar se quiser conservar a vida. De contrário, com homens como Lasse e eu...
Nem um único músculo do rosto de Donkey se moveu quando replicou:
— E se desistir de voltar a Pueblo?
— A "miss" Miller nada acontecerá. Em tal caso, o nosso patrão já não precisará desses dólares e a pequena poderá voltar quando quiser.
Donkey não respondeu de momento. Pensava. E os seus pensamentos não eram nada agradáveis. Sabia que, fizesse o que fizesse, Hellen seria incomodada. Por outro lado, havia Tracy e a velha conta pendente entre os dois.
— Parece-me que terão de montar e partir quanto antes, rapazes — replicou Donkey.
— Ouviste, Lass?
— Claro que ouvi. Mas continuo a pensar que o assunto é mais teu do que meu. Continua, Jone. Até agora estou a gostar de te ouvir.
— Ouviu, Donkey? O meu companheiro dá-me carta branca.
Donkey encolheu os ombros e deu outro passo em frente:
— Vou entrar no hotel, rapazes. Mas quando sair com a pequena, dentro de uns minutos, para regressarmos a Pueblo, não quero vê-los por aqui. Compreendem-me agora ou querem que fale mais claro?
Os dois pistoleiros olharam-se entre si e Lass perguntou:
— Mais claro? Pode-se saber como?
— Com o "Colt".
— Sim? Bem, se assim o quer, Donkey, desloque-se na direção do hotel, mas faça-o com a arma na mão.
Seguiram-se uns segundos de denso silêncio, e Donkey deu um novo passo. Foi o suficiente. Jone desviou-se para um lado, extraindo o "Colt", enquanto Lass fazia o mesmo para o lado contrário imitando-o em tudo.
No mesmo instante houve duas detonações, ambas do lado de Donkey. E, na sua frente, os dois pistoleiros de Tracy largaram as armas, mordendo o pó da calçada.
Donkey soprou no cano do revólver, mas ouviu nesse instante Hellen gritar da janela do hotel:
— Cuidado, Joe! No telhado...
O estampido da detonação de um rifle voltou a quebrar a calma da rua e Hellen balanceou na janela, acabando por cair para trás, enquanto Donkey se voltava como um raio, disparando no momento em que uma segunda bala do rifle lhe arrancava uma madeixa de cabelos, depois de lhe perfurar o "stetson" que os cobria.
Disparou mais três vezes, tantos eram os cartuchos que lhe restavam ainda no "Colt", e o corpo do foragido caiu de joelhos no telhado, para rolar depois e vir estatelar-se no pavimento da rua, com um baque surdo.
Mas Donkey já não viu nada disto. Entrando no hotel como um furacão, gritou à rececionista que chamasse um médico, e em meia dúzia de saltos estava no quarto de Hellen.
A jovem estava caída aos pés da cama, mortalmente pálida e tinha os olhos completamente fechados. Mas abriu-os logo que Donkey se inclinou para ela.
— Deram... deram-me bem... aqui... aqui no peito.
Proferidas estas palavras numa voz extremamente débil, a jovem perdeu os sentidos. Sem nada dizer, ele ergueu-a, suavemente nos braços e depositou-a no leito. O médico chegou nesse momento, acompanhado do xerife de La Junta.
A pedido deste, Donkey deixou o quarto e ambos aguardaram no corredor. No entanto, o xerife pretendia explicações, e Donkey deu-lhas, pesando cuidadosamente as palavras. Quanto a Hellen, declinou a sua identidade, dizendo ser a filha de um dos mais importantes rancheiros de Pueblo.
— E que fazia o senhor com ela neste hotel? — quis saber o xerife.
Donkey deu explicações que não pareceram suficientemente satisfatórias ao representante da Lei, que acariciou, pensativamente o farto bigode.
— Parece-me, Donkey, que resta ainda qualquer coisa por dizer. Engano-me?
— Não, não se engana, xerife. Mas não sou eu que lhe poderei explicar mais nada, mas sim a própria "miss” Miller. Se ela morrer, eu voltarei para lhe contar toda a verdade. Mas se não for assim, só ela o poderá fazer. Trata-se de um segredo que não é só meu.
O médico saiu nesse instante do quarto de Hellen, e Donkey correu ao seu encontro.
— Como está ela? Viverá?
— O seu estado é grave, forasteiro, mas espero que viva. Apesar de franzina, tem uma ânsia extraordinária de viver. Isso ajudara muito. Agora...
— Preciso de uma mulher, doutor. Alguém que fique com ela, pois eu tenho de deixá-la por algumas horas. Não me agrada, mas o responsável, por tudo isto encontra-se em Pueblo e eu não quero que me escape.
— Va descansado — disse o medico —. Trarei minha mulher para cuidar dela até ao seu regresso.
— Obrigado, doutor. Será por pouco tempo. Agora... posso vê-la?
— Claro que sim. Mas não a incomode. Dei-lhe um sedativo e está a dormir. Entre, mas só por três minutos, está bem?
Donkey assentiu em silêncio e entrou no quarto, aproximando-se do leito e contemplando-a com viva emoção. Por fim, deu meia-volta e abandonou o quarto. Daí a pouco montava a cavalo e partia a galope desenfreado na direção de Pueblo, seguindo mais tarde o curso do rio Arkansas.
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