sexta-feira, 5 de outubro de 2018

CLF017.12 Tiros na moita

Eddie examinou rapidamente o edifício. Todas as janelas e portas pareciam estar bem, fechadas. Então os seus olhos descobriram um terraço no andar superior. Estudou cautelosamente a parede e viu que esta oferecia algumas saliências que podiam servir de apoio.
— És capaz de trepar por esta parede? — perguntou num sussurro, dirigindo-se à rapariga.
Ela assentiu. Eddie agarrou-se com as duas mãos às saliências e começou a perigosa escalada. Tinha que ascender lentamente pelo apoio que era necessário procurar para os pés. Além disso não podia correr o risco de cair ou resvalar. Assim foi subindo valendo-se do parapeito duma janela do andar térreo, dos intervalos dos troncos que formavam a fachada e dos suportes do alpendre. Por fim, as suas mãos agarraram a balaustrada e, mediante -um poderoso impulso — mercê da contração dos músculos —, içou-se até ao terraço. Olhou então para baixo e viu que Joyce subia pelo mesmo sítio que ele.
A rapariga, acostumada a uma vida ao ar livre, estava demonstrando possuir boa musculatura e adequado domínio de si mesma. Abrindo a mão ajudou-a a alcançar o terraço.
—Por onde vamos entrar? —perguntou ela em surdina.
—Não há nenhuma casa que esteja hermeticamente fechada numa noite quente como esta—respondeu ele em igual tom.
Eram várias as janelas que davam para o terraço e Eddie foi experimentando uma a uma. Todas estavam fechadas. O jovem olhou para Joyce.
— Enganei-me.
Mas naquele preciso momento brilhou uma luz numa das janelas do extremo oposto do terraço. Eddie e Joyce, agachados, dirigiram-se rapidamente para ali e espreitaram pelo parapeito. Através do vidro viram que um indivíduo tinha entrado na habitação. Era robusto e barbudo, que vestia umas roupas de vaqueiro bastante sujas. Tirou a cartucheira e pendurou-a nas costas duma cadeira. Depois, dirigindo um olhar para a cama bocejou ruidosamente e começou a desabotoar a camisa. De súbito, avançou para a janela.
Eddie agachou--se debaixo dela e fez sinal à rapariga para que se afastasse uns passos. Ela obedeceu.
Ficaram imóveis, aguardando. Ouviu-se o ruído do fecho ao correr e o ranger da janela ao abrir. Eddie, com o rosto voltado para cima, viu como o homem assomava todo o busto, sem dúvida para respirar a plenos pulmões o ar puro da noite.
Distendendo os seus braços para cima, Eddie enlaçou o pescoço do outro, e de seguida com um forte impulso puxou para baixo. O vaqueiro apanhado de surpresa e, arrastado por aquela força poderosa, perdeu o equilíbrio; o parapeito agiu como fulcro e caiu pesadamente sobre o terraço.
Com a agilidade dum tigre, Eddie precipitou-se sobre ele. A luta foi brevíssima e tudo se passou em poucos segundos. Os punhos do jovem martelavam o, rosto do adversário, até que entendeu que este perdera o conhecimento. Rapidamente, abandonou aquele corpo inerte e fez sinal à jovem.
Ambos saltaram pela janela para o interior da habitação. Ao passar junto à cadeira, Joyce agarrou na cartucheira com o revólver e cingiu-a à cintura. Abriram a porta e entraram no corredor. Tudo estava em trevas e silencioso. Tateando pelas paredes e procurando andar com suavidade, avançaram um bocado.
Então, ao dobrarem um canto viram uma certa claridade. Na frente havia umas escadas e a luz vinha do andar de baixo.
Desceram cuidadosamente, e prosseguiram em frente. Eddie e a rapariga colaram-se contra a parede. O brilho era agora tão intenso que facilmente se percebia que a luz estava do outro lado do canto. Com extremo cuidado assomaram uns instantes. Ante eles havia uma pequena habitação na qual, junto duma mesa, estava sentado um homem que, com um baralho sujíssimo nas mãos, se entretinha fazendo paciências. Sobre a mesa, um candeeiro de petróleo e atrás do indivíduo uma porta fechada. Bastou um segundo para que visse tudo isto.
Eddie fez um gesto afirmativo com a cabeça, para Joyce, como a indicar que tinham descoberto o que tanto ansiavam. De seguida, ante o assombro da rapariga, deitou o chapéu sobre os olhos, começou a assobiar uma canção de estilo alegre e despreocupado, e com a cabeça inclinada deu a volta à esquina da parede, e começou a avançar em direção ao homem. Este não levantou os olhos da mesa, continuando a manejar as cartas.
—Já é hora de render? Pois esta noite passou o tempo mais depressa sem que desse conta disso.
Quando, por fim, se decidiu a olhar para o que se aproximava e compreendeu que não era nenhum dos seus companheiros, era demasiado tarde. Tudo quanto pôde ainda fazer foi levantar-se e com expressão alarmada, exclamar:
— Com os diabos...!
Mas não pôde levar a mão ao revólver. O punho de Eddie golpeou-o com tal força em pleno rosto, que o lançou de costas contra a parede fazendo sair em quantidade o sangue pelo nariz. Depois, foi a esquerda de Eddie que despediu um tremendo murro ao queixo. Ouviu-se o desconjuntar dos ossos do maxilar e o homem caiu desamparado.
Enquanto Joyce se reunia a ele, Eddie revistou o corpo com mãos hábeis e rápidas. No bolso traseiro das calças encontrou um molho de chaves. Começou experimentando a fechadura, excluindo as chaves que não serviam. Por fim, uma delas deu a volta completa e ouviu-se o ambicionado clic.
A porta foi aberta e o jovem ¡agarrou no candeeiro de petróleo. Joyce incapaz de conter por mais tempo a sua ansiedade, cruzou decididamente o umbral. A luz iluminou um pequeno quarto, sem janelas, cujo único mobiliário consistia num colchão sobre o solo. Nele estava estendido um homem que olhava deslumbrado.
Era um indivíduo dos seus cinquenta anos, de estatura alta e sólida, mas que parecia ter perdido muito peso ultimamente. As suas roupas estavam folgadas e tinha uma barba cinzenta, de várias semanas. Tanto pelos olhos aterrados como pelo aspeto se via bem o que tinha sofrido. A sua expressão era de quem tinha sido submetido às mais cruéis torturas.
—Papá! — soluçou a jovem.
Precipitou-se para o homem e abraçou-o freneticamente. McCarey estava desconcertado sem poder acreditar no que estava sucedendo.
—Joyce, minha pequena. Joyce, Joyce...
Acometeu-o então um ataque de louca alegria. Abraçava a sua filha, acariciava-a nas faces e nos cabelos.
—Minha pequena. Não posso acreditar. Tu aqui! Estava convencido de nunca mais te tornaria a ver.
—Já estamos outra vez juntos, papá, e não nos voltaremos a separar.
Eddie, que permanecia de pé sustentando o candeeiro, acabou por dizer:
—Não podemos perder mais tempo.
McCarey fitou-o e voltou a sentir-se em perigo.
—Quem é este homem?
Joyce apressou-se a tranquilizá-lo.
—Um amigo, papá. Foi ele quem fez tudo para que pudéssemos chegar. Sem ele nunca teria dado contigo.
—Por favor, Joyce — interrompeu Eddie. —É preciso sair daqui. Dum momento para o outro podem descobrir a nossa presença.
McCarey pôs-se de pé, apoiando-se a Joyce. Olhava Eddie fixamente.
— Não o conheço, rapaz, mas a partir de agora é o meu melhor amigo. Obrigado por tudo.
—Acha que poderá andar com rapidez e montar a cavalo? — perguntou Eddie.
Nos olhos de McCarey brilhou o orgulho.
— Sou forte, não esqueça, muito forte. E apesar dos maus bocados que passei, ainda me restam energias para chegar seja onde for.
—Então, vamos.
Saíram da pequena habitação. McCarey, conduzido pela mão de Joyce, andava com certa dificuldade, como se o longo cativeiro lhe tivesse tolhido as articulações. Deram de cara com o homem. A surpresa foi tal de ambas as partes, que por momentos ficaram paralisados. O encontro deu-se na habitação onde jazia inconsciente o guarda.
Eddie compreendeu num instante que era aquele o indivíduo que o ia render... mas os acontecimentos impunham ação. O outro rapidamente sacou do revólver. Eddie com um movimento brusco, veloz, empunhou um dos seus Colt e fez fogo, sem dar tempo ao inimigo que disparasse. A detonação ressoou no silêncio da casa com a potência dum tiro de canhão. O outro caía de bruços com o ventre atingido.
—Depressa! Ê preciso sair daqui sem perda de tempo!
Os três começaram a correr, passando por cima do cadáver. Eddie ia à frente alumiando com o candeeiro de petróleo. Sabia que a detonação tinha semeado o alarme no rancho.. Atrás dele, com a ansiedade expressa no rosto, corriam Joyce e seu pai.
—A porta de saída! É esta! Efetivamente na sua frente havia uma grande porta. Eddie, ofegante, puxou os ferrolhos e abriu-a de par em par. Na sua frente via-se o céu estrelado. Saíram desordenadamente.
— Aos cavalos! —gritou Eddie.
Correram naquela direção quando dos alojamentos dos vaqueiros começaram saindo uns indivíduos empunhando armas. Descobriram os fugitivos e começaram a disparar.
Eddie, enquanto as balas silvavam à sua volta, estacou empunhando os revólveres e fez fogo. Apesar da escuridão ser quase total, viu que dois dos vaqueiros rolaram por terra. Voltou a premir o gatilho, e outro deles caiu. Os restantes tiveram medo e não avançaram mais, embora continuassem disparando. Foi então que Joyce viu que seu pai ia tropeçando enquanto corria. — Que aconteceu? Diz-me! Atingiram-te?
McCarey apertando o ombro direito com a mão, prosseguia, embora com passo inseguro.
—Não é nada; uma ferida sem importância. Continua a correr, continua a correr.
Chegaram aos arbustos onde estavam os cavalos e cada um montou o seu. Joyce olhava angustiada para seu pai.
—Papá...
—Não te preocupes — cortou ele teimoso. —Posso manter-me na sela.
Naquele momento chegou Eddie, que tinha feito por várias vezes uso' das suas armas para manter ã distância os vaqueiros do rancho. Montou dum salto. Os três fugitivos partiram a galope, perdendo-se nas trevas da noite e na distância.

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