Amanhecia. Pela janela da cela penetrava um raio de luz mortiça, que rompia as sombras que durante a noite tinham envolvido o condenado.
Os passos do xerife ressoaram no pavimento de madeira do corredor. O tilintar das chaves, reunidas em molho, era lúgubre para o prisioneiro.
— Chegou a hora, Octave. Rezaste?
O xerife era um velho de respeitável barba branca, magro, de tez pálida, doentia; os ombros, ligeiramente curvados, acusavam o peso de sessenta e sete anos.
Para Octave Block, era uma aparição fantasmagórica. Olhou-o aterrado, enquanto as suas palavras lhe feriam os ouvidos.
— Não!!!
O xerife não se perturbou. Parecia que estava habituado a escutar aquela negativa dos lábios dos prisioneiros condenados à morte. Prevendo-a, manietara-o na tarde anterior, depois do jantar, enquanto o condenado dormia um sono estranho.
Meteu a chave na fechadura e fê-la girar. Todos os seus gestos eram lentos, monótonos, dotados dessa segurança e lentidão que dá os muitos anos de ofício.
Empurrou a porta e afastou-se para um lado, à espera que o prisioneiro saísse da cela.
— Não! Não, xerife!
— Vamos, Octave. Custar-te-á menos se te resignares.
— Estou inocente.
— Já sabemos, Octave — respondeu o xerife, para não o contrariar. — Todos os condenados à morte o estão, mas morrem. Sais ou tenho de te tirar?
Octave Block avançou dois passos e estremeceu ao ficar debaixo da verga de ferro da porta. Era a linha divisória entre a vida e a morte. A vida ficava atrás dele, naquela cela escura, da qual se ouvia o ruído produzido pelos que viviam; à frente estavam a rua, o sol, as pessoas ...e a morte.
— Vamos, Octave, estão à tua espera.
A morte não esperava, não podia esperar. Levantara-se a forca. Havia cinco dias que Octave escutava as marteladas e as vozes dos operários.
Devia lá estar o carrasco, Possivelmente, viera de Austin, pois em Llano não tinham carrasco próprio. Como seria o carrasco? Imaginava-o com uma gadanha gigantesca, a qual se aproximava do seu pescoço e a gadanha convertia-se numa corda que apertava... apertava...
Não importava. Mas imaginava toda a povoação, reunida à volta da armadilha mortal, à espera de assistir à execução, pela qual toda a gente abandonara o trabalho. Veriam o espetáculo, e depois dele terminado retirar-se-iam, comentá-lo-iam durante um dia e depois tudo cairia no olvido.
Mas estava inocente!
Ele não matara aquela mulher, era incapaz disso!
No entanto, tinham-no acusado e, sem se poder defender, fora condenado à morte.
Chegara a sua hora ...
— Vamos, vamos... Por que esperas?
Eram segundos de vida que ganhava. Segundos ... Para quê? Quanto mais depressa aquilo acabasse, mais depressa deixaria de sofrer.
Avançou um passo, dois ... atravessou o limiar; saiu para o corredor. O xerife colocou-se a seu lado e começaram a andar ao mesmo tempo. O policia teve de se amoldar ao seu passo, que era lento, hesitante.
Detiveram-se no gabinete. Não estava lá ninguém. Apenas o xerife o acompanharia até ao cadafalso.
E para quê mais gente? Não podia fugir.
— Vamos ...
Que estranha pressa era aquela?
A mão do policia segurou-o por um braço. Repeliu-a e caminhou por sua própria vontade.
A luz deslumbrante do amanhecer feriu-lhe as pupilas, habituadas à obscuridade. O sol rompia por entre uns montes distantes.
Era um disco enorme, rubro. Era como sempre, o de sempre ... o que Octave Block nunca mais veria.
Havia muita gente lá fora. Não faltava ninguém, absolutamente ninguém; até parecia que tinham vindo doutros lados para presenciar a injusta execução.
Formavam um corredor estreito, pelo qual ele devia passar.
Que fariam? Inclinariam a cabeça? Envergonhar-se-iam de permitir que se cometesse aquele crime? Pediriam ... pediriam que lhe perdoassem a vida?
Continuou a andar. Meteu pelo corredor humano que levava à forca. Estava ali, na pequena praça. Construída de madeira nova, branca, serrada com esmero.
Os primeiros olharam-no com curiosidade, assim como os segundos. Não quis cravar os olhos em ninguém. Estava inocente. Ninguém inclinou a cabeça. Nem se mexiam; limitavam-se a olhar.
Atrás dele, o corredor desfazia-se. Aquela gente seguia-o, em magote, murmurando em voz baixa.
Faltavam poucas jardas para chegar à fatídica construção. Notava-se o cheiro a madeira de pinheiro.
Sentiu uma dor intensa no ventre. O passo tornou-se--lhe mais lento, mais indeciso.
O carrasco esperava-o. Era forasteiro, uni tipo gordo e baixo, de olhos oblíquos, que o observavam como se quisesse calcular-lhe o peso e a altura.
Também lá estava o juiz ... o senhor juiz, «mister» Austin Driffield, com a sua sobrecasaca de boa fazenda, de bom corte, preta; camisa branca, gravata escura e chapéu branco, de feltro, de abas largas ... Um grosso charuto na boca.
«Estou inocente!», desejaria gritar-lhe, precisava ou ansiava por lhe gritar. Mas não o fez; limitou-se a olhá-lo, a censurar-lhe com a vista a injustiça que cometera.
Recordava-se ainda das suas palavras: «Octave Block, proferido o veredicto de culpabilidade do júri, este tribunal condena-o a ser pendurado pelo pescoço até que sobrevenha a morte. A execução será levada a cabo na madrugada do próximo dia quinze.» ~
Depois levantara-se, agitando de uma maneira estranha as abas da sobrecasaca, passara por diante dele e por fim entre as pessoas que enchiam a sala ...
Block já chegara diante da forca fatal. O xerife empurrava-o para que subisse os três degraus. O carrasco tinha as mãos metidas nas algibeiras das calças e olhava-o com uma indiferença que chegava a ser piedosa. Parecia dizer: «Não te assustes; não é nada grave. como se fosses tomar uma purga um pouco desagradável, mas depois sentir-te-ás perfeitamente.»
Uma purga que lhe comprimira a garganta, que lhe faria secar a língua e dançar no ar como um boneco desarticulado. E depois ...
Não sabia se depois no seu cérebro se faria o silêncio, o nada ... A parte terrível da morte era essa, o «depois»; esse misterioso depois que ninguém conhece.
Segundo o cura, podia encontrar ânimo na sua própria inocência e na paz da sua alma.
Alguém, não se lembrava quem, dissera-lhe que era melhor ser justiçado inocente; um homem sente certo desprezo, ou pelo menos encontra-se numa situação superior à daqueles que o condenam.
Bom alivio!
— Avança, Octave — insistiu o xerife, com a sua voz opaca, sem expressão.
A quantos dissera o mesmo?
Subiu o primeiro degrau e, de repente, a multidão calou-se. Agora já toda a gente o via ... Mas, não compreendiam que estava inocente?
O carrasco aproximou-se dele. Continuava a ser piedoso, quase indulgente. Pelo menos, havia qualquer coisa de humano no seu gesto de estender a mão para lhe segurar no braço.
Recusou a ajuda e acabou de subir. Alcançou o alçapão, o buraco quadrado pelo qual desapareceria o seu corpo ... mas não de todo, só metade, ou menos, talvez apenas os pés; dependia, de terem tomado bem, ainda que fosse a olho, a sua estatura.
Olhou a multidão. O juiz estava à frente, o juiz Austin Driffield. Com a sua sobrecasaca preta, parecia um corvo, de rosto cor de cinza, olhos opacos, fechados, malignos.
Parecia sorrir enquanto contemplava o condenado.
— Cumpra-se a sentença.
Octave sentiu a imperiosa necessidade de gritar. Descobriu que uma coisa áspera, seca, lhe rodeava o pescoço. Eram as mãos delicadas do carrasco.
O juiz ordenara que se cumprisse a sentença. Já não havia remédio. Já era tarde para voltar atrás, mas morreria dizendo que estava inocente. Gritaria ...
Mas não chegou a gritar; outro grito se antecipou ao dele. Um grito desesperado, lancinante ... tão lancinante quanto pode ser um grito feminino.
Uma rapariga nova corria para ali, para ele, para o juiz, para a forca ... para as mãos do carrasco, para a corda ...
— Não! Está inocente!
Octave não a conhecia. Nunca a vira. Era alta, esbelta, tinha uma comprida cabeleira loura que esvoaçava ao vento como as crinas de um cavalo, rosto pálido, olhos desorbitados, boca convulsa ...
Conseguiu vê-la, apesar da distância.
Nas suas mãos brancas, que se levantavam suplicantes, na palidez do seu rosto angustiado, na sua voz lancinante, Octave Block pôs a sua vida.
Mas a rapariga não alcançou o juiz, nem a forca, nem o carrasco, nem a corda ...
Caiu de repente como um touro abatido por uma bala ... como uma nuvem de fumo dourado.
Ficou imóvel, de bruços no solo, quieta, sem respirar.
De súbito, Octave sentiu que qualquer coisa lhe oprimia o pescoço e que o chão lhe fugia debaixo dos pés. A opressão do pescoço tornou-se dolorosa, mas não muito, assim como a da nuca. Faltava-lhe a respiração, asfixiava ...
A sentença fora cumprida. Menos dolorosa, menos terrível do que supusera. Dançou na corda, à espera do médico que devia certificar a sua morte, como em toda a execução legal.
Mas o médico estava ajoelhado junto do corpo da rapariga loura, que virara de rosto para cima.
— Está morta, doutor?
— Sim.
— De que morreu?
Era difícil sabê-lo ... Muito difícil.
— Pois de... de comoção. O coração não resistiu e falhou.
Era uma explicação.
O xerife, do patíbulo, reclamava a presença do facultativo.
— Doutor, verifica a morte ou arriamo-lo?
— Vou já — respondeu o médico.
Passara-se tudo com muita rapidez. A execução de Octave Block nem sequer fora espetacular. Quase não havia testemunhas que a tivessem presenciado, pois a morte da rapariga atraíra a atenção de toda a gente.
Os passos do xerife ressoaram no pavimento de madeira do corredor. O tilintar das chaves, reunidas em molho, era lúgubre para o prisioneiro.
— Chegou a hora, Octave. Rezaste?
O xerife era um velho de respeitável barba branca, magro, de tez pálida, doentia; os ombros, ligeiramente curvados, acusavam o peso de sessenta e sete anos.
Para Octave Block, era uma aparição fantasmagórica. Olhou-o aterrado, enquanto as suas palavras lhe feriam os ouvidos.
— Não!!!
O xerife não se perturbou. Parecia que estava habituado a escutar aquela negativa dos lábios dos prisioneiros condenados à morte. Prevendo-a, manietara-o na tarde anterior, depois do jantar, enquanto o condenado dormia um sono estranho.
Meteu a chave na fechadura e fê-la girar. Todos os seus gestos eram lentos, monótonos, dotados dessa segurança e lentidão que dá os muitos anos de ofício.
Empurrou a porta e afastou-se para um lado, à espera que o prisioneiro saísse da cela.
— Não! Não, xerife!
— Vamos, Octave. Custar-te-á menos se te resignares.
— Estou inocente.
— Já sabemos, Octave — respondeu o xerife, para não o contrariar. — Todos os condenados à morte o estão, mas morrem. Sais ou tenho de te tirar?
Octave Block avançou dois passos e estremeceu ao ficar debaixo da verga de ferro da porta. Era a linha divisória entre a vida e a morte. A vida ficava atrás dele, naquela cela escura, da qual se ouvia o ruído produzido pelos que viviam; à frente estavam a rua, o sol, as pessoas ...e a morte.
— Vamos, Octave, estão à tua espera.
A morte não esperava, não podia esperar. Levantara-se a forca. Havia cinco dias que Octave escutava as marteladas e as vozes dos operários.
Devia lá estar o carrasco, Possivelmente, viera de Austin, pois em Llano não tinham carrasco próprio. Como seria o carrasco? Imaginava-o com uma gadanha gigantesca, a qual se aproximava do seu pescoço e a gadanha convertia-se numa corda que apertava... apertava...
Não importava. Mas imaginava toda a povoação, reunida à volta da armadilha mortal, à espera de assistir à execução, pela qual toda a gente abandonara o trabalho. Veriam o espetáculo, e depois dele terminado retirar-se-iam, comentá-lo-iam durante um dia e depois tudo cairia no olvido.
Mas estava inocente!
Ele não matara aquela mulher, era incapaz disso!
No entanto, tinham-no acusado e, sem se poder defender, fora condenado à morte.
Chegara a sua hora ...
— Vamos, vamos... Por que esperas?
Eram segundos de vida que ganhava. Segundos ... Para quê? Quanto mais depressa aquilo acabasse, mais depressa deixaria de sofrer.
Avançou um passo, dois ... atravessou o limiar; saiu para o corredor. O xerife colocou-se a seu lado e começaram a andar ao mesmo tempo. O policia teve de se amoldar ao seu passo, que era lento, hesitante.
Detiveram-se no gabinete. Não estava lá ninguém. Apenas o xerife o acompanharia até ao cadafalso.
E para quê mais gente? Não podia fugir.
— Vamos ...
Que estranha pressa era aquela?
A mão do policia segurou-o por um braço. Repeliu-a e caminhou por sua própria vontade.
A luz deslumbrante do amanhecer feriu-lhe as pupilas, habituadas à obscuridade. O sol rompia por entre uns montes distantes.
Era um disco enorme, rubro. Era como sempre, o de sempre ... o que Octave Block nunca mais veria.
Havia muita gente lá fora. Não faltava ninguém, absolutamente ninguém; até parecia que tinham vindo doutros lados para presenciar a injusta execução.
Formavam um corredor estreito, pelo qual ele devia passar.
Que fariam? Inclinariam a cabeça? Envergonhar-se-iam de permitir que se cometesse aquele crime? Pediriam ... pediriam que lhe perdoassem a vida?
Continuou a andar. Meteu pelo corredor humano que levava à forca. Estava ali, na pequena praça. Construída de madeira nova, branca, serrada com esmero.
Os primeiros olharam-no com curiosidade, assim como os segundos. Não quis cravar os olhos em ninguém. Estava inocente. Ninguém inclinou a cabeça. Nem se mexiam; limitavam-se a olhar.
Atrás dele, o corredor desfazia-se. Aquela gente seguia-o, em magote, murmurando em voz baixa.
Faltavam poucas jardas para chegar à fatídica construção. Notava-se o cheiro a madeira de pinheiro.
Sentiu uma dor intensa no ventre. O passo tornou-se--lhe mais lento, mais indeciso.
O carrasco esperava-o. Era forasteiro, uni tipo gordo e baixo, de olhos oblíquos, que o observavam como se quisesse calcular-lhe o peso e a altura.
Também lá estava o juiz ... o senhor juiz, «mister» Austin Driffield, com a sua sobrecasaca de boa fazenda, de bom corte, preta; camisa branca, gravata escura e chapéu branco, de feltro, de abas largas ... Um grosso charuto na boca.
«Estou inocente!», desejaria gritar-lhe, precisava ou ansiava por lhe gritar. Mas não o fez; limitou-se a olhá-lo, a censurar-lhe com a vista a injustiça que cometera.
Recordava-se ainda das suas palavras: «Octave Block, proferido o veredicto de culpabilidade do júri, este tribunal condena-o a ser pendurado pelo pescoço até que sobrevenha a morte. A execução será levada a cabo na madrugada do próximo dia quinze.» ~
Depois levantara-se, agitando de uma maneira estranha as abas da sobrecasaca, passara por diante dele e por fim entre as pessoas que enchiam a sala ...
Block já chegara diante da forca fatal. O xerife empurrava-o para que subisse os três degraus. O carrasco tinha as mãos metidas nas algibeiras das calças e olhava-o com uma indiferença que chegava a ser piedosa. Parecia dizer: «Não te assustes; não é nada grave. como se fosses tomar uma purga um pouco desagradável, mas depois sentir-te-ás perfeitamente.»
Uma purga que lhe comprimira a garganta, que lhe faria secar a língua e dançar no ar como um boneco desarticulado. E depois ...
Não sabia se depois no seu cérebro se faria o silêncio, o nada ... A parte terrível da morte era essa, o «depois»; esse misterioso depois que ninguém conhece.
Segundo o cura, podia encontrar ânimo na sua própria inocência e na paz da sua alma.
Alguém, não se lembrava quem, dissera-lhe que era melhor ser justiçado inocente; um homem sente certo desprezo, ou pelo menos encontra-se numa situação superior à daqueles que o condenam.
Bom alivio!
— Avança, Octave — insistiu o xerife, com a sua voz opaca, sem expressão.
A quantos dissera o mesmo?
Subiu o primeiro degrau e, de repente, a multidão calou-se. Agora já toda a gente o via ... Mas, não compreendiam que estava inocente?
O carrasco aproximou-se dele. Continuava a ser piedoso, quase indulgente. Pelo menos, havia qualquer coisa de humano no seu gesto de estender a mão para lhe segurar no braço.
Recusou a ajuda e acabou de subir. Alcançou o alçapão, o buraco quadrado pelo qual desapareceria o seu corpo ... mas não de todo, só metade, ou menos, talvez apenas os pés; dependia, de terem tomado bem, ainda que fosse a olho, a sua estatura.
Olhou a multidão. O juiz estava à frente, o juiz Austin Driffield. Com a sua sobrecasaca preta, parecia um corvo, de rosto cor de cinza, olhos opacos, fechados, malignos.
Parecia sorrir enquanto contemplava o condenado.
— Cumpra-se a sentença.
Octave sentiu a imperiosa necessidade de gritar. Descobriu que uma coisa áspera, seca, lhe rodeava o pescoço. Eram as mãos delicadas do carrasco.
O juiz ordenara que se cumprisse a sentença. Já não havia remédio. Já era tarde para voltar atrás, mas morreria dizendo que estava inocente. Gritaria ...
Mas não chegou a gritar; outro grito se antecipou ao dele. Um grito desesperado, lancinante ... tão lancinante quanto pode ser um grito feminino.
Uma rapariga nova corria para ali, para ele, para o juiz, para a forca ... para as mãos do carrasco, para a corda ...
— Não! Está inocente!
Octave não a conhecia. Nunca a vira. Era alta, esbelta, tinha uma comprida cabeleira loura que esvoaçava ao vento como as crinas de um cavalo, rosto pálido, olhos desorbitados, boca convulsa ...
Conseguiu vê-la, apesar da distância.
Nas suas mãos brancas, que se levantavam suplicantes, na palidez do seu rosto angustiado, na sua voz lancinante, Octave Block pôs a sua vida.
Mas a rapariga não alcançou o juiz, nem a forca, nem o carrasco, nem a corda ...
Caiu de repente como um touro abatido por uma bala ... como uma nuvem de fumo dourado.
Ficou imóvel, de bruços no solo, quieta, sem respirar.
De súbito, Octave sentiu que qualquer coisa lhe oprimia o pescoço e que o chão lhe fugia debaixo dos pés. A opressão do pescoço tornou-se dolorosa, mas não muito, assim como a da nuca. Faltava-lhe a respiração, asfixiava ...
A sentença fora cumprida. Menos dolorosa, menos terrível do que supusera. Dançou na corda, à espera do médico que devia certificar a sua morte, como em toda a execução legal.
Mas o médico estava ajoelhado junto do corpo da rapariga loura, que virara de rosto para cima.
— Está morta, doutor?
— Sim.
— De que morreu?
Era difícil sabê-lo ... Muito difícil.
— Pois de... de comoção. O coração não resistiu e falhou.
Era uma explicação.
O xerife, do patíbulo, reclamava a presença do facultativo.
— Doutor, verifica a morte ou arriamo-lo?
— Vou já — respondeu o médico.
Passara-se tudo com muita rapidez. A execução de Octave Block nem sequer fora espetacular. Quase não havia testemunhas que a tivessem presenciado, pois a morte da rapariga atraíra a atenção de toda a gente.