segunda-feira, 31 de outubro de 2022

BRV014.08 Planos contra o homem de negro


Nas pequenas povoações não existe a palavra segredo. Quando se procura ou há necessidade de ocultar um facto, e se pronuncia esta palavra, é como se se ateasse fogo a um rastilho de pólvora, pois a chama corre, alonga-se, retorce-se, avança em ziguezague ou em linha recta, mas não se detém enquanto não esgota o combustível. O falatório só para quando não há mais ouvidos.

Assim se soube que Erdman se havia enamorado de Beatriz. Assim se soube que a queria tornar sua esposa. Alguém suspeitou que Beatriz era uma simples artista, embora possuísse uma voz maravilhosa e isso se soubesse também.

Soube-se, finalmente, que Roger Novack a havia cortejado. O rei de Wichita não podia aceitar semelhante insulto. Era desafiar a sua honra, ridicularizá-lo... Era feri-lo porque ele amava Beatriz. Era ofendê-lo porque ele era rei. Roubar a noiva a um homem era um claro desafio.

Michael Erdman era valente e hábil com as armas... Mas Roger Novack havia demonstrado uma habilidade portentosa e era de supor que estava acostumado a tais lutas. Talvez tivesse dedicado toda a sua vida a isso, enquanto Erdman aprendia a conduzir gado e a domar cavalos.

domingo, 30 de outubro de 2022

BRV014.07 Dissertação sobre os prazeres da pradaria


A sala de jantar do hotel, que também era restaurante público, era uma sala agradável onde havia umas quinze mesas servidas por duas raparigas louras que se viam e desejavam para atender todos os clientes, conseguindo, mercê da sua eficiência, dar por vezes a impressão de que seis raparigas absolutamente iguais serviam em mesas diferentes.

— A menina que toma? — perguntou uma delas inclinando-se diante de Beatriz.

— Qualquer coisa, tenho bastante apetite e tudo me agradará. Especialidade da casa... se tem alguma especialidade.

A rapariga afastou-se com um suave frufru do seu vestido comprido e Beatriz dirigiu um olhar aborrecido ao resto dos comensais.

sábado, 29 de outubro de 2022

BRV014.06 O primeiro beijo de Beatriz… em Wichita



O «Starlight Saloon» era, como Beatriz supunha, de escassas dimensões e humildes intenções. Ainda assim, por ser o mais antigo de Wichita e por estar no Oeste, podia considerar-se como um local de luxo onde nem toda a gente podia entrar.

Ali iam os homens mais ou menos importantes, fazendeiros, agricultores, granjeiros, caçadores, comerciantes e algum mineiro que naturalmente, houvesse feito fortuna. Um letreiro na própria porta e outro no balcão, colado um grande espelho diziam: «Proibido usar armas» e, pelos vistos, parecia que todos obedeciam, pois nem só um dos homens que estavam no estabelecimento tinha arma e, à entrada, numa espécie de bengaleiro, alinhava-se quase meia centena de cinturões-cartucheiras com as suas mortíferas cargas. O ar não estava ainda muito carregado pois era cedo e, embora houvesse muita gente, não se gritava.

sexta-feira, 28 de outubro de 2022

BRV014.05 Duelo à moda do Oeste traz anjo da guarda ao cavaleiro de negro


Beatriz Block despertou quando o dia já ia alto. Não tinha relógio e, pela altura do sol, calculou que passava das dez da manhã.

Saltou da cama e vestiu um roupão de seda azul e aproximou-se da janela, afastou a cortina e deu uma olhadela à rua. Estava absolutamente solitária, como quando chegara.

Havia dormido mais de doze horas e por isso não se tinha informado sobre o quer que fosse que tornava tão solitária a famosa Main Street de Wichita. Agora o sol havia pousado sobre o tecto azul da cidade e envolvia-a no seu manto de fogo, obrigando as pessoas a refugiarem-se em casa esperando a noite, única altura em que, embora se respirasse um ar quente, pelo menos não se introduzia nos pulmões fogo puro.

quinta-feira, 27 de outubro de 2022

BRV014.04 Encontro romântico e armadilhado com o homem de negro


Archibald Carr estava sentado a uma mesa situada a um canto dos mais escuros do «saloon». Os seus dedos brincavam nervosamente com o copo por onde se servia de uísque de dois em dois minutos, aproximadamente. Quem o estivesse a observar teria pensado que esperava impacientemente que decorresse aquele espaço de tempo para o poder encher e beber com a mesma ansiedade de sempre. Contudo, não era isso que ele esperava. Dois jovens aproximaram-se da sua mesa e sentaram-se após um breve cumprimento.

— Porque nos mandaste chamar, Carr?

— Roger Novack regressou. Sabiam?

— Toda a gente sabe em Wichita.

— Temos de o matar — murmurou Carr, deitando bebida no copo e bebendo-a de um trago. — Vem por causa de minha irmã, outra vez.

quarta-feira, 26 de outubro de 2022

BRV014.03 Viagem para Oeste e encontro com um cavaleiro de negro


O comboio avançava lastimosamente, soprando, ou melhor resfolegando. A subida não era muito íngreme nem o peso muito excessivo; contudo, ameaçava parar, incapaz de manter o esforço que vinha realizando desde há três dias.

Assomada à janela, desejando sentir no rosto a carícia do ar, mas recebendo apenas lategadas de sal, Beatriz Block orava para que a máquina não parasse.

A paisagem era desoladora e tornava difícil imaginar a tragédia com um mínimo de filosofia. A paisagem resumia-se à extensa pradaria limitada pelo azul do céu no horizonte; a pradaria, a Leste limitada pelo próprio horizonte; deserto o Sul e desconhecido o Norte.

terça-feira, 25 de outubro de 2022

BRV014.02 O marido traído morre ao limpar a sua honra


O ginete desmontou lentamente do cavalo junto das arcadas que rodeavam o pátio do pequeno convento, banhado profundamente pela luz da lua. As coronhas de nácar dos seus revólveres e as partes metálicas lançaram reflexos acerados que chegaram a relampejar nas paredes brancas cheias de sombras.

Vestia completamente de negro, roupas caras e sedosas; e lenço que lhe rodeava o pescoço era também negro, tal como o chapéu de abas largas. Negras eram as luvas que trazia e negras as botas brilhantes com esporas de prata.

Com um gesto atou as rédeas do cavalo num poste de madeira e, inclinando para cima a aba do chapéu, olhou lentamente à sua volta. Apoiou a mão direita na coronha branca do revólver e começou a andar procurando fazer o menor ruído possível.

O cavalo quis segui-lo, mas, ao sentir as rédeas presas, parou conformando-se, mas soltou um ruidoso relincho que fez sorrir o homem mostrando, à luz da lua, uma dentadura extraordinariamente branca, perfeita.

— Está quieto e cala-te, «Quick». Vais acordar os reverendos.

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

BRV014.01 Uma mulher quer partir para o Oeste



Beatriz Block libertou-se do ébrio que tentava abraçá-la e afastou-se do balcão. Parou, sem dar por isso e sem qualquer intenção definida, junto de uma mesa onde se jogava póquer.

As paradas eram baixas e por isso, sobre a mesa, havia pouco dinheiro embora, à volta dela, houvesse muitos jogadores. Dos feitos nunca passavam de três a um mesmo jogo e nunca faziam «blufs».

Um dos jogadores — que perdia desde que Beatriz observava o jogo — quis fazê-la afastar-se usando maus modos, mas a rapariga continuou ali recalcitrantemente. Os ânimos sossegaram e tudo voltou à normalidade.

Afastou-se por fim aborrecida, por entre as cadeiras, olhando provocantemente para os clientes do Starling Night Club que, na realidade, não prestavam demasiada atenção à sua formosura. Agitou preguiçosamente o ar com o seu leque de plumas e voltou para junto do balcão, aproveitando o facto de o ébrio lá não estar.

domingo, 23 de outubro de 2022

BRV014.00 Uma fórmula para nos livrarmos de «Veneno no sangue»

A jovem Beatriz estava farta duma vida de tédio a ser assediada por ébrios num bar de Columbia e decidiu partir para Oeste, terra de homens bravos, galanteadores e aventureiros. Mal sabia que iria encontrar-se com um indivíduo, um cavaleiro todo vestido de negro, que não hesitava em atirar-se a qualquer rabo de saia e enfrentar os seus maridos se estes tentassem defender a sua honra.

Mas o seu destino iria também cruzar-se com o de um rico rancheiro a quem a sua voz e o seu canto encantaram num dia em que fez uma visita ao bar de Wichita. Em pouco tempo, o rancheiro Erdman desfez-se em amabilidades com ela e acabou por lhe propor casamento.

Mais uma vez, o destino levou-a a encontrar-se com o cavaleiro de negro e a traição ensombrou de novo a sua vida. Parecia que transportava «Veneno no sangue»… Será que algo iria fazer com que alguma vez se livrasse desse estigma?

Este é talvez o melhor livro de Fred Dennis, um livro que vale a pena ler apesar do tom jocoso com que por vezes nos brinda nas palavras proferidas pelo «cavaleiro de negro». Por esse motivo, vamos publicá-lo a partir dos próximos dias.

BIS341. A corda era o único castigo

(Coleção Bisonte, nº 341)

terça-feira, 18 de outubro de 2022

BIS207.13 Regresso ao Llano Estacado com projeto para um hospital


Os três homens, agachados junto a uma moita, espiavam o caminho. O barulho dos cavalos soava muito perto, mas não se viam os animais. 

— Onde diabo...? O barulho vem desse lado! — indicou Matt Coleman, levantando-se um pouco. 

Então, ao levantar-se, viu os cavalos. Baixou-se rapidamente, murmurando: 

— Não vêm pelo caminho, vêm pelo campo, atrás de nós! Não disparem se não for preciso; mandá-los-emos parar quando chegarem aqui, é preciso evitar que nos escapem! Disparem só se fugirem. Vou tentar enganá-los. 

Os dois homens tinham os revólveres nas mãos, preparados. Matt Coleman esperou, levantando-se quando os cavalos estavam quase sobre eles. Ergueu os braços, gritando: 

— Alto, por favor, não se assustem, não é um assalto. Façam o favor de... 

segunda-feira, 17 de outubro de 2022

BIS207.12 Cavalos para os bandidos


O quarto de Bertha ficava ao fundo da cozinha. A boa mulher disse à rapariga: 

— Deite-se tranquila. O Jones e eu dormiremos em qualquer dos outros quartos, se tivermos tempo para descansar, pois estes novos clientes vão tardar em ir para a cama. Agora puseram-se a jogar às cartas. Mau ofício, este de estalajadeiro! 

Maria ficou sozinha no quarto. A rapariga estivera quase a confiar-se a Bertha, mas resolvera não o fazer, porque sabia que, tratando-se de dinheiro, não podia confiar em ninguém. Nem naquela boa mulher que a protegia. 

Esperou uma meia hora. Aqueles homens que procuravam o pai dela ficariam toda a noite na estalagem. Tinha, portanto, um bom avanço. 

— Mas... onde estarão eles agora? Nem sequer sei por onde vêm, não serei capaz de os encontrar de noite. E, no entanto, tenho de o tentar! 

domingo, 16 de outubro de 2022

BIS207.11 A jovem impostora foge para devolver o dinheiro e tem inesperado encontro


Em Green River tinham descrito a Grosvenor a carroça em que viajava a família Andella. Tinha-lhe descrito o homem que a vendera. Jim não era perito em seguir rastos, mas até uma criança de cinco anos poderia seguir as profundas marcas deixadas sobre um terreno molhado pelas recentes chuvas. Jim Grosvenor seguiu-as durante dois dias, e cada vez as achava mais recentes e profundas. Uma tarde seguiu-as para fora do trilho, para um descampado. 

— Estão ali, a descansar. E melhor tomar algumas precauções. O ferreiro deve estar decidido a tudo. Quando um homem honrado se decide a cometer um roubo como o dele, já nada o detém. 

Prendeu as rédeas do cavalo a uma moita e empunhou o revólver. Tinha comprado aquela arma ao fugir de Telluride e do segundo Matt Coleman. Estava carregada e parecia uma boa arma, apesar de nunca a ter disparado. Abrindo caminho entre a erva alta e azulada, viu o toldo da carroça e depois o veículo. Havia rastos de uma fogueira junto dele. Os cavalos de tiro, animais pesados, pastavam a um lado, dentro de um cerco de cordas. 

sábado, 15 de outubro de 2022

BIS207.10 Os impostores fogem com uma fortuna


O cemitério de Telluride não costumava receber muitas visitas, salvo durante as horas que se seguiam aos tiroteios. As pessoas fugiam do lugar sempre que podiam, de modo que Jim Grosvenor e os homens que ali o tinham conduzido não seriam incomodados. 

Jim Grosvenor, apesar de estar rodeado pelos revólveres daqueles homens, apesar de ouvir como os armavam, parecia não notar a sua presença. Pensava apenas na jovem que ele julgara ser Lena Coleman, aquela bela jovem de doce olhar que tinha ficado em Green River. 

— Se a Lena morreu, se está aqui enterrada... aquela rapariga é uma impostora, deve ser uma das filhas do Benjamin Andella, enganaram-me para ficarem com o dinheiro do Coleman. Enganou-me o ferreiro e enganou-me ela, com os seus olhos inocentes, enganou-me também... 

sexta-feira, 14 de outubro de 2022

BIS207.09 A lápide delatora / o legítimo herdeiro


Maria Andella, que tinha aprendido a responder quando lhe chamavam Lena, quase não falava, quase não sorria. Dissera ao pai: 

— É uma canalhice, estamos a enganar um homem bom que arriscou a vida para encontrar a Lena Coleman. 

— E já a encontrou, filha. Tu és a Lena! 

— Oh, mamã! O dinheiro transformou-nos a todos! Não devíamos ter feito isto! 

—O teu pai decidiu-o, ele sabe o que nos convém. Ao fim e ao cabo, a Lena não existe; portanto, não privámos ninguém do seu dinheiro. Minha filha, o que deves fazer é olhar menos para esse jovem, é preciso que ele parta, pois, a sua presença aqui é um perigo constante. Em qualquer momento podemos ter um deslize e denunciar-nos. É necessário que o doutor Grosvenor volte à sua terra. 

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

BIS207.08 Um fardo de roupas velhas


Na modesta casa de Benjamin Andella ardia a mecha de um candeeiro. A sua luz, não muito intensa, a família entreolhava-se, pálida e desalentada. 

O homem que se fazia chamar Harold bebia lentamente uma garrafa que encontrara na cozinha e que continha aguardente. Sorria ao ver os seus prisioneiros, apesar de já começar a sentir impaciência. 

Por vezes temia que, de algum modo, o doutor Grosvenor, com efeito, tivesse depositado o dinheiro no Banco. Até que se tranquilizou, pensando: «Está à espera da noite para vir. É isso». 

Fez-se noite. A família Andella continuava quieta, sem falar. Lá fora, alguém assobiou despreocupadamente as primeiras notas de uma conhecida balada. Harold levantou-se deixando cair ao solo a garrafa de aguardente, na sua pressa de empunhar o revólver. 

quarta-feira, 12 de outubro de 2022

BIS207.07 Preparação de emboscada em casa do ferreiro


Grosemos, que não queria separar-se do cavalo e da maleta com o dinheiro de Matt Coleman, disse a Benjamin que o veria ao anoitecer. Pediu-lhe que lhe dissesse onde vivia. 

— Receio que me vigiem, e não quero levar esses homens a sua casa. Vá, tenha cuidado. Eu irei quando anoitecer. 

— E uma imprudência, podem atacá-lo novamente... 

— Vou estar sempre rodeado de gente, num lugar público; além disso, sei defender-me. Vá para casa e prepare a Lena. Calculo que, para a pequena, seja uma grande emoção ter notícias do pai. 

Benjamin repetiu as instruções para encontrar a casa. Jim foi para o maior «saloon» de Green River, onde atou o cavalo a uma figura de índio que servia de barra, e entrou no estabelecimento com a sua maleta negra. Colocou-se num ponto onde tinha as costas protegidas e de onde via a porta e as janelas. Pediu uma refeição, dispondo-se a esperar. 

— Quando anoitecer, poderei desaparecer entre as ruelas. 

terça-feira, 11 de outubro de 2022

BIS207.06 Mais uma impostora em perspetiva


Na entrada do grande curral, pendia o cartaz com o nome da empresa: «Denver-Great Lake, Diligências». 

Dentro do curral, duas desconjuntadas diligências queimavam-se ao sol, as capas de tinta saltavam delas como escamas. Uma delas tinha sido voltada, e um homem suado trabalhava nas molas, tentando ajustar uma nova chapa. De uma barraca próxima saiu um tipo magro, que gritou: 

— Benjamin! Acabas com isso? Esse carro tem de partir amanhã para o Lago! 

Benjamin Andella levantou-se. Estava muito envelhecido, já não era o gigante poderoso de outros tempos. As suas roupas eram quase miseráveis. 

— Lamento, senhor Jano, a reparação é complicada. 

— Não me venhas com desculpas! Não conheces o teu ofício? Não te pago para que percas tempo: acaba esse carro hoje mesmo, não poderás ir embora antes de o fazer!

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

BIS207.05 O império de Llano Estacado é arrasado


Matt Coleman viveu pelo menos mais duas semanas depois da partida do doutor Grosvenor. Duas semanas que passou quase permanentemente no portal, junto de uma mesa repleta de remédios, olhando fixamente para o caminho por onde poderia chegar-lhe um telegrama com notícias da filha, ou talvez a própria filha. 

Os criados da casa iam de um lado para o outro, em silêncio. Matt, mesmo tão perto da morte, continuava a impor o respeito a todos. No fim de duas semanas desde a partida de Grosvenor, Matt Coleman viu uma nuvem de p6 no caminho. Levantou-se um pouco, para deixar-se cair de novo sobre a cadeira, murmurando: 

— Não devo fazer esforços, agora menos que nunca. E preciso que viva... 

Em breve pôde contar os cavalos que se aproximavam. Eram cinco. 

domingo, 9 de outubro de 2022

BIS207.04 Um médico honesto parte em busca da rapariga mais rica da América


Jim Grosvenor corou. 

— Caramba, sufocou-me! Não estou habituado a elogios, deve ser por isso! Obrigado, senhor. 

— Você não é honrado por eu lho dizer, por isso não tem de agradecer-me. Esta porca doença! Primeiro amarrou-me a esta cadeira, e muito em breve enviar-me-á para a cova. Quando, exatamente? 

— Sou médico, não adivinho. Já lhe disse que... 

— Sim, muito em breve! Resta-me pouco tempo, pois! Sente-se nessa cadeira, Jim! O que vou dizer-lhe é muito importante. Já deve ter calculado que a fortuna de que falei aos meus homens realmente existe. 

Jim Grosvenor sentou-se, muito intrigado, avisando: 

— Não tenho interesse no seu dinheiro, senhor. Receberei os meus honorários. Esse dinheiro... 

— Bah! Vai dizer-me que esse dinheiro está manchado, que vem de delitos! Tudo isso são palavras. De qualquer modo, não vou oferecer-lhe o meu dinheiro, se é isso que teme. Quero, simplesmente, que o entregue ao meu herdeiro. 

sábado, 8 de outubro de 2022

BIS207.03 16 malas de couro com «dinheiro»


— O «Senhor» quer ver-te, John. Hoje mesmo. 

O homem que acabava de receber aquela mensagem, levantou-se do banco, deitou algumas moedas para cima do balcão e saiu a toda a pressa da taberna onde se encontrava, enquanto o que o tinha avisado voltava a montar a cavalo e saía a galope da povoação.

John dirigiu-se ao estábulo público, selou um bom cavalo, e meteu pelo caminho do Norte, porque, quando o «Senhor do Liano Estacado» o chamava, John sabia muito bem que não podia atrasar-se. Antes de chegar ao seu destino, John encontrou outro cavaleiro. Os dois homens olharam-se. John perguntou: 

— Chamou-te também? 

— Sim, parece que voltamos a reunir-nos. Já ia sendo altura! Já pensava que o «Senhor» se retirara por completo. 

— Mas continua a pagar-nos, rapaz. Enquanto nos paguem não nos podemos queixar. Não é assim? 

Os homens não falaram mais, enquanto os cavalos galopavam alegremente. Em breve um terceiro cavaleiro, que apareceu por um caminho lateral, se uniu a eles. Uma pancada na aba do chapéu foi a única saudação. 

sexta-feira, 7 de outubro de 2022

BIS207.02 A tragédia chega a Telluride e ceifa a vida de duas crianças


No dia em que Lena Coleman cumpriu sete anos, quando havia quase dois que vivia com os Andella, chegou a Telluride um grupo de vaqueiros conduzindo gado, um grupo que imediatamente se assenhoreou das ruas, fazendo escândalo. 

Benjamim, o ferreiro, que os viu da sua oficina, subiu a casa para avisar a mulher. 

— Margaret, não deixes as crianças saírem de casa. Hoje vai ser um dia movimentado. Chegaram vaqueiros com dinheiro fresco e vão acabar aos tiros. 

Margaret Andelia tinha emagrecido, pois um ano antes tinham tido mais duas filhas, gémeas, e o trabalho da casa era muito duro para ela. Apesar das filhas maiores a ajudarem. 

— A Maria e a Virgínia estão na cozinha, Benjamin. Elas obedecerão. Mas essa endiabrada criatura, essa Lena dos demónios…! 

— Não fales assim da Lena. É apenas uma criança. 

quinta-feira, 6 de outubro de 2022

BIS207.01 O «Homem que fazia chover» procura um lar para a filha


O homem voltou-se para o interior do carroção, murmurando: 
— Lena! Não te mexas, não fales nem saias daí aconteça o que acontecer e ouças o que ouvires. Entendes? 
Do escuro carroção chegou uma afirmativa. O homem repetiu: 
— Não te mexas. Cobre-te com a manta e não te mexas. 
O carroção era velho, chiava, parecia que de um momento para o outro ia ficar em pedaços. Mas o condutor, que era jovem, manejava-o com habilidade, esquivando as pedras e os buracos do caminho, que abundavam muito. 
O condutor, moreno e forte, cobria-se com um endurecido chapéu alto, e tinha um bigode negro, grande, ao estilo mexicano, ainda que não fosse mexicano, mas sim virginiano. Vestia uma camisa vermelha e usava dois revólveres. As suas feições, angulosas e duras, refletiam uma tremenda energia. 
O caminho era estreito, muito difícil e o homem exigia dos cavalos o máximo esforço; por vezes parecia que as rodas não tocavam no solo. 

quarta-feira, 5 de outubro de 2022

BIS207.00 Quem vai ficar com o «Dinheiro Maldito»

Matt Coleman deixou a filha à guarda de uma família em Turidilla e partiu para longe, procurando um meio de ganhar sustento. Não conseguiu mais do que comportar-se como um bandido chantagista que, apoiado nos seus subordinados, fez fortuna à conta dos que lhe pagavam os serviços de «segurança». Mas a sua saúde degradou-se e, perante a notícia de que não teria mais do que uns meses de vida, tentou fazer chegar a sua fortuna à filha que, entretanto, tinha morrido num acidente.

Desconhecendo a triste sorte da filha encarregou um médico honesto de procurar a família de acolhimento para lhes entregar o dinheiro. Estes, ao saberem do que se tratava, fizeram com que uma das suas filhas passasse pela filha de Matt Coleman e receberam a fortuna do bandido.

O problema é que alguns dos que serviram Coleman também se achavam com direito ao dinheiro e resolveram perseguir os seus novos possuidores sem sucesso, Para complicar a questão, a menina impostora resolveu apaixonar-se pelo médico e um primo de Coleman apareceu a reclamar a fortuna como seu legítimo herdeiro e denunciou a aldrabice, chegando a levar o médico junto da campa onde repousavam os restos mortais da verdadeira filha de Coleman.

Cesar Torre mostra nesta novela toda a sua mestria para a construção de situações de difícil solução. Tudo se desenrola com naturalidade e a narrativa ganha um crescendo de emotividade e mistério, fazendo com que o leitor tome o partido do médico e da menina impostora, mas nunca se desligando da simpática figura do ferreiro que acolheu a menina. E o final não poderia ser melhor do que o narrado para a população de «Llano Escalado» um local que este autor parece privilegiar nas suas novelas.