segunda-feira, 15 de agosto de 2022

CLF002.05 A «Rainha da Festa» chega e provoca sarilhos no bar

 

Joan Milnor, a filha do granadeiro da região, era uma mulher dura, orgulhosa e despótica com todos.

De uma beleza pouco vulgar, sabia-se desejada por todos, e como estava sempre rodeada de aduladores, que faziam tudo quanto ela queria, cada dia era mais difícil de tratar com ela.

Durante dois anos seguidos, graças à equipa de vaqueiros que serviam seu pai, ela tinha sido a «Rainha» da festa, gozando em ser quem dispunha de tudo na cidade, no curto prazo do seu «reinado».

Iam a caminho da cidade, depois de terminada a faina do rodeio, ela e uns quantos vaqueiros, entre os quais o capataz Tracy, que fizera da ilusão de casar com Joan, o fulcro de toda a sua vida.

— Pode estar certa, patroa... Este ano voltará a ostentar as fitas dos prémios.

As palavras do vaqueiro adulavam-na.

— É isso que eu espero de vocês...

Os olhos de Joan brilharam de orgulho e satisfação.

— Para celebrar antecipadamente o triunfo, convido-a a ir a casa de Fairmont — disse Tracy, o capataz.

— Todas as mulheres que há nessa casa odeiam-me... Não me atrevo a lá ir...

— É porque sabem que é muito mais bonita do que todas elas e têm inveja.

Para Joan era uma alegria sentir-se assim adulada.

Quando chegaram à cidade, entraram no saloon de Fairmont que, ao ver quem era, correu a cumprimentá-la, dizendo-lhe, no entanto, a seguir:

— Não é conveniente, nestes dias, que entre na minha casa... Há aqui muitos forasteiros...

— Não te preocupes com isso, Fairmont — disse Tracy. — Corre por minha conta fazer-lhes compreender a realidade.

Olívia era a mulher mais bonita que havia no «bar». Acercou-se corajosamente de Joan para lhe dizer:

— Sei que não me estimas e é até possível que me odeies. Mas não deves permanecer aqui em dias de festa. Bem sabes o que são os vaqueiros quando bebem um pouco de «whisky».

— O que tens de fazer é deixar-nos tranquilos—disse Tracy — e mete-te nos teus assuntos.

E empurrou-a.

— Tu não és o homem que interessa e convém a esta rapariga. O que ela precisa é de quem lhe fale com clareza e até com dureza, para compreender que está equivocada, pois estou certa de que, no fundo, não é como aparece diante dos outros.

E Olivia voltou-se. Mas não pôde dar muitos passos, porque Tracy, saltando como um gamo, agarrou-a pelo braço, fê-la voltar, enquanto lhe gritava:

— Vais pedir agora mesmo perdão a esta senhorita... Ouves?

— Eu não a ofendi. Disse com sinceridade o que penso dela.

— É certo, Tracy — disse Joan — Deixa-a. Ela não me molestou.

— Obrigada, «rainha»! --- disse Olívia, inclinando--se diante dela.

Joan conteve o capataz; mas quando a instâncias da jovem, saíram para a rua, Tracy disse:

— Há-de lembrar-se do que disse.

— Não tem importância. É preciso ter em conta que a sua vida não é agradável e deve andar desgostosa, por ter de suportar os que se saciam de bebida.

Para Joan, a verdadeira causa do aborrecimento de Tracy era Olívia ter dito que ele não era o homem que lhe convinha. E sorria, ao pensar nas palavras da rapariga.

Joan encontrou-se com seu pai, que lhe disse que estavam a chegar na diligência uns amigos seus, aos quais tinha de atender, porque eles estavam acostumados a todas as comodidades de S. Francisco e a uma vida diferente. Acabou por pedir-lhe que o acompanhasse à estação das diligências, para esperar os viajantes.

Os que já ali estavam à espera do veículo, cumprimentaram com todo o respeito o pai de Joan e esta, com a admiração que a sua presença despertava sempre.

Assim que chegou a diligência, apearam-se logo vários viajantes, vestidos com elegância, indo cumprimentar o pai de Joan com efusão e afeto.

Quando ele lhes apresentou sua filha, dois ou três assobiaram significativamente enquanto um outro dizia:

— Já vejo que não exageravas sobre a beleza da tua filha!... É um anjo.

Estas palavras lisonjearam Joan, que sorriu satisfeita. Enquanto se encaminhavam para casa, um deles, não querendo perder tempo, disse-lhe:

— Não compreendo como pode agradar-te viver entre estes homens que cheiram sempre a estábulo. Como as mais belas joias, tu precisas dum estojo... viver numa cidade como S. Francisco, invejada pelas mulheres e desejada pelos homens... Poderias visitar a Europa e...

O velho Charlton Milnor interrompeu o adulador, para lhe perguntar por alguns amigos.

Tracy acompanhava-os, um pouco molestado, por não ter sido apresentado. Só no fim é que Charlton o fez, sem que os elegantes recém-chegados lhe ligassem a menor importância. Mas Tracy consolava-se ao pensar que esses homens não seriam capazes de conseguir para a rapariga as fitas dos prémios, que era o que ela mais desejava nesses dias.

— Não me agrada esse capataz... — voltou a dizer o primeiro visitante — É ordinário e vulgar... E, no entanto, está apaixonado por ti. Tu não mereces um homem desses. Precisavas, sim, de...

Milnor interrompeu-o de novo.

— Vamos para casa, se querem lavar-se... Sairemos depois, para ver a cidade.

Com efeito, não se demoraram ali, muito tempo.

— Agora vamos beber qualquer coisa a casa de Fairmont — propôs Milnor.

Todos entraram. O velho Milnor pediu champanhe para oferecer aos amigos.

Quando beberam dois copos, o forasteiro adulador convidou Joan para dançar. O pai disse-lhe que era perigoso irem dançar, porque os vaqueiros poderiam considerar que ela devia dançar com todos. Mas a rapariga respondeu que bailaria com quem quisesse.

Apesar disso, dançaram pouco, porque um dos vaqueiros, entendendo o que o pai de Joan tinha dito, tocou no ombro do elegante.

— Vai-te daqui, parolo! — disse este. — A pequena não dança com mais ninguém, senão comigo...

— Danço com quem quero! — declarou ela, demonstrando que era caprichosa e inconsciente.

— Isto não se pode consentir — protestou o vaqueiro — É uma ofensa para nós...

— Já disse que só baila comigo. Portanto...

Fairmont aproximou-se e, ao ver a atitude dos vaqueiros, ordenou à orquestra que deixasse de tocar...

— O senhor não devia ter feito parar a orquestra — disse o elegante que dançava com Joan.

Por seu lado, Olívia aproximou-se deles e disse a Charton Milnor:

— O senhor não devia ter consentido que sua filha andasse aqui a dançar... Podia organizar uma festa em sua casa.

— Tu, cala-te... — disse o elegante par de Joan.

— Não falo contigo — retorquiu Olívia. — Cheiras demasiado a «vantajista». Falava com o pai dela... E agora digo-lhe que tenha cuidado com ela e contigo, porque não és o que pareces. Sabes que te conheço há anos, embora as coisas não corressem tão bem como hoje e não pudesses vestir assim.

Joan ficou surpreendida, ao ver o elegante bater em Olívia, gritando-lhe ao mesmo tempo:

— Toma!... Isto é para aprenderes a distinguir e a tratar as pessoas!

— Cobarde — exclamou a rapariga — Doeu-te eu dizer que te conheço, como esses outros que vieram contigo... Conheço-os, sim. Vi-os fazer batota com as cartas em Carson City, em Sacramento e S. Francisco.

O outro ia a bater-lhe de novo. Mas sentiu o seu pulso agarrado com força. Era Chester que, tendo entrado no «bar», vira o seu gesto e interviera, a evitar a agressão.

— Essa encadernação obriga um homem a comportar-se como um cavalheiro... Mas já que preferes assim, dar-te-ei por minha vez para que aprendas a tratar com mulheres...

E com a outra mão, com uma rapidez assombrosa, pregou-lhe um soco no rosto.

— E vocês, muito cuidado... Esta rapariga disse há pouco que cheiram a «vantajistas». Pois asseguro-lhes que temos aí cordas para todos. Não é verdade, rapazes?

Os vaqueiros responderam com um grito que assustou os companheiros do castigado e o próprio Charlton.

— Vai-te daqui! — disse Chester, dando-lhe outro soco, fazendo-o cair ao lado dos seus companheiros. — E muito cuidado, meus amigos — acrescentou, empunhando um «Colt», ao mesmo tempo que se dirigia a Joan. — Quanto a si, senhorita, deve pensar que não pode ser tão caprichosa, nem ofender os vaqueiros, que são muito mais dignos do que esses cobardes que a acompanham. E devo dizer-lhe também que, como mulher, não me agrada nada. Possivelmente, se vestisse como corresponde ao que diz ser, estaria melhor. A parvoíce e a estupidez dos que a rodeiam é que a envaideceram, fazendo-lhe crer que é bonita, com o que não estou de acordo. E tu, cobarde, vais pedir perdão a esta mulher a quem bateste, há pouco. E não te demores porque eu não tenho paciência para esperar e estou desejando ter oportunidade de mover o dedo indicador... Mas faz isso de modo que todos se inteirem do teu arrependimento pelo acto cobarde que praticaste.

— Não sabes o que estás a fazer, rapaz — disse-lhe Olívia. — Não devias ter intervindo. Todos estes são inimigos perigosos. Não te fies no seu aspeto suave. Todos eles são «pistoleiros».

— Podes estar tranquila...

— E essa rapariga vai odiar-te porque lhe falaste de uma maneira a que ela não tem estado acostumada. Adularam muito a sua beleza, que não posso negar seja extraordinária. E não creias que, no fundo, seja má.

— Tudo isso está muito bem. Mas alguma vez devia ouvir as coisas pelo seu nome.

— Parte quanto antes, se queres viver mais algum tempo — aconselhou-o Olívia. —Não devias defender uma mulher e menos por ter dito que os conhecias.

E Olívia pôs-se a chorar, o que fez comover Joan. Ela estava também de acordo em que não era justo bater numa mulher por ter dito que os conhecia. O que mais a surpreendia era que seu pai fosse amigo deles.

Outro dos elegantes disse, entretanto:

— Não creio que ela já nos tivesse visto. Certamente disse aquilo, porque estava aborrecida.

— É possível que eu os tenha confundido com outros — disse Olívia — Todos os homens assim vestidos parecem-me iguais...

Mas Joan estava agora certa de que ela os conhecia, como antes havia afirmado. A súbita recção do agressor demonstrava que era certo que Olívia o reconhecera.

O caso parecia arrumado. Mas Tracy defrontou Chester para lhe dizer que não estava disposto a consentir que ele falasse a Joan, nos termos em que o fizera.

Chester procurou ainda apaziguá-lo. O outro, porém, chamou-lhe fanfarrão, dizendo-lhe:

— Agora, não tens o «Colt» empunhado, como há pouco...

— É melhor que as coisas fiquem assim — disse Chester calmamente. — Não me importa o que possam pensar de mim, porque não sou escravo da sua beleza, a que não ligo importância.

Com o chicote no ar, a rapariga avançou para ele, dizendo-lhe:

— Vou dar-lhe o castigo que merece e...

— Se me toca, dar-lhe-ei com ele.

Joan não acabou de fazer o movimento, porque Chester arrancou-lhe rapidamente o chicote da mão, fazendo o que prometera.

— Que isto lhe sirva de lição — disse o valoroso rapaz, atirando o chicote para longe.

Os vaqueiros estavam vigilantes e foi isto que conteve Tracy.

— Já sei que, neste momento, se pudesse matar-me-ia. Mas confio em que, quando estiver só, reconhecerá que é justo o que eu fiz...

Joan saiu, seguida dos que a acompanhavam.

Nessa altura, o pai disse-lhe:

— Ele avisou-te nobremente do que faria.

— O patrão sabe quem é? — perguntou um dos vaqueiros.

— Sei!... — respondeu o velho Milnor — É o sobrinho do xerife.

— Sim?! Pois se veio para ver as festas, não creio que o consiga — disse Joan.

Charlton e Tracy, o capataz, olharam-se, surpreendidos.

— Mas veio...

— E parece que dará guerra—acrescentou o vaqueiro — Que temperamento o seu!... E que estatura!

Os vaqueiros que estavam no «bar» advertiram Chester de que tivesse cuidado com o dono e os que acompanhavam este, bem como com Joan. Chester sorriu.

— Estejam tranquilos... Sei que são perigosos e estarei alerta...

— Não julgues que essa rapariga caprichosa vá ordenar que te castiguem numa luta nobre. Ela o que quer é que sejas castigado...

— Repito que estejam tranquilos!

Pouco depois, Pete sabia o que se passara, pela boca do barman, que acrescentou:

— Esse rapaz é um louco se fica aqui, depois do que se passou...

— Parece que sabe defender-se...

— Não é o suficiente. Aqui costumam disparar pelas costas, quando se discute com outro.

— Não devias falar assim — observou Pete — Se o teu patrão sabe... Conheço as pessoas e sei que posso confiar em ti...

56 —

— De todos os modos, tens de ser cauteloso. É que eu vi matar um forasteiro, que não fez nada. E creio que foi porque o meu patrão o conheceu. Devia ser um agente... E todos julgam que foram Bowler e Appleton... Mas foi o patrão quem disparou pelas costas... Não me atrevi a dizê-lo, quando o xerife apareceu... para prender os dois.

— O que deves fazer é calar-te...

Os outros continuaram a advertir Chester.

— Se conhecesses como nós os homens do rancho de Milnor estarias mais preocupado.

— Não se inquietem... Saberei defender-me.

Pouco depois, Chester encaminhou-se para o escritório de seu tio.

— Disseram-me o que fizeste no «bar» de Fairmont — exclamou o xerife — É preciso muito cuidado. Isto é um viveiro de cobardes e patifes.

— Não te preocupes. Já vi com quem tenho de tratar. Mas não os conheces bem para saber que não se deve ter o menor descuido.

— Sabias que aquele forasteiro que mataram no «bar» foi atacado pelas costas?

— Sabia, sim. Vi na Morgue. Devia ter sido o próprio Fairmont... Todos o fitavam com medo. Mas não se pode provar nada.

— Cobarde!

— Como não te conhecia então, receei que tivesses sido tu o morto... E tinha de considerar-me culpado da tua morte, por ter-te escrito, para que viesses...

— Vamos presenciar as festas e os exercícios? —perguntou Chester.

— Vamos. Devo presidir ao júri. Não tenho outro remédio.

— Acompanho-te...

— 57

 

— Verás que aqui há bons vaqueiros, embora sejam os forasteiros os que põem a nota de luta. «Se fosse só desta zona, o velho Milnor ganharia sempre. Soube escolher os seus homens. Já ganharam dois anos seguidos, permitindo que seja Joan, quem figure como Rainha das Festas. É isso que a traz envaidecida.

— Afinal, ela não parece tão má. Pelo menos, não se aborreceu muito comigo, por causa daquilo... Claro que terá dito que me vai matar...

— E é muito capaz de fazê-lo — disse o xerife. — O melhor é não apareceres na sua frente, durante uns dias.

— Ora! O perigo já passou...

— De qualquer modo, não te ponhas na sua frente.

E tio e sobrinho encaminharam-se para o local da festa. Todos os olhavam, um pouco intrigados; a maior parte deles cumprimentavam o xerife com agrado.

— Ali está a equipa do Milnor, a rodear a sua mascote. Joan é quem ordena tudo o que se refere à intervenção dos seus «cow-boys».

Joan foi também avisada, por Tracy, da chegada de Chester.

— Estou desejando castigá-lo como merece.

— Deixa isso. O que é preciso, é ganhar...

— Podes estar tranquila... Hás-de ter todas as fitas dos exercícios.

Joan não ocultava a alegria ao ouvir estas palavras, e procurou Chester com o olhar. Mas ele não a olhou, nem um só momento.

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