— Sooooh! Quietos, cavalos! — gritava o carreiro, puxando pelas bridas que lhe permitiam manejar o veículo sobre o solo duro e seco e que parecia uma prancha de metal, posta no forno.
Quando conseguiu que parassem, deitou o chapéu para trás e olhou as aves que descreviam uns círculos que eram sintomáticos para ele.
— Esperem aqui! — disse, dirigindo-se aos animais —. Tenho tanta pressa como vocês em chegar à pedreira.... Há aqui qualquer coisa que talvez precise do meu auxílio...
E com um passo incerto pelas dificuldades do terreno, avançou com firmeza. Calculou mentalmente numas trezentas jardas a distância que o separava do ponto em que as aves vigiavam.
Quando chegou a uma pequena meseta, sobre a colina mais próxima, viu um cavalo caído e um homem inclinado sobre ele, a tirar-lhe a sela.
Não podia haver dúvidas acerca do que se passara. As aves, com o seu olfato especial, haviam-se dado conta da morte do animal e esperavam a ausência do cavaleiro, para cair sobre a sua presa.
O carreiro devia ter sido visto, porque o cavaleiro, abandonando a sela, empunhou com rapidez o rifle.
— Cuidado! — gritou o carreiro. — Não tenho nada contra si! Vi as aves a pairarem e vim espreitar, para saber o que acontecera.
O cavaleiro não respondeu nada, mas permaneceu com a arma apontada. O carreiro continuou a avançar, sem medo. Quando chegou próximo dele, acrescentou:
— No outro lado da colina, tenho o meu carro. Podes ir nele, se te diriges para a pedreira.
— Não faço a mais pequena ideia do lugar onde estou, e nada sei para onde ir. Fiquei sem cavalo, o que é uma grande contrariedade, porque não disponho de dinheiro para comprar outro...
O carreiro olhou com atenção para o animal morto e depois para o cavaleiro. E exclamou:
— Mataram-no a tiro!
— Exatamente!... Eu vinha a fugir de uns homens que me perseguiram durante muitas milhas. O animal foi ferido há algumas horas e acabou por morrer aqui... Nunca julguei que pudesse durar tanto tempo. Quando entrámos nesta parte tão seca e quente, os meus perseguidores voltaram a garupa.
— Podes trabalhar na pedreira. Costumam admitir todos os que chegam e queiram trabalhar. Chamo-me Hal Boyer e estou como carreiro no bórax. Não é um trabalho lá muito agradável, mas não pagam mal. Cem dólares por mês I
— É um bom ordenado! — disse o cavaleiro - -O meu nome é Preston Madison.
Hal fitou-o, surpreendido.
— Disseste Preston Madison?
— É o meu nome.
O outro coçou a cabeça.
— Será conveniente que dês outro nome, quando chegares à pedreira!
— Não compreendo! — disse Preston, intrigado. Porque hei-de dar outro nome que não seja o meu?
— Porque há duas semanas chegou à pedreira Preston Madison.
Os olhos de Preston abriram-se com assombro.
— Não é possível!... Eu chamo-me Preston Madison!...
— Pois asseguro-te que há pouco chegou ali outro com o mesmo nome. Por sinal, tornou-se muito amigo do capataz geral.
— É muito estranho! Chamar-se-á assim, na realidade?
— Pelo menos, foi esse nome que deu! Por isso, é melhor inventares outro nome. Suponho que não te há-de importar muito.
— É que não me acostumarei, facilmente. Sou capaz de não responder pelo nome que der... Creio que, chamando-me realmente Preston Madison, não é correto que o oculte!...
— Dei-te um conselho!... Agora podes fazer o que quiseres!...
— Como é esse Preston?
— Muito alto também, mas não tanto como tu!
— Sabes alguma coisa da sua pessoa?
Preston ficou pensativo.
— Não... porquê?
— Porque a perseguição que me fizeram foi originada por eu dizer o meu nome. Eu não lhes tinha feito nada e chamaram-me muitas coisas desagradáveis... vi-me obrigado a disparar e creio que matei alguém...
— Na pedreira, ninguém sabe nada da vida dos que ali trabalham. E tu deves guardar o mesmo silêncio.
— Continuo sem compreender nada. Mas visto insistir nisso, é porque terá as suas razões... julga que encontrarei lá trabalho? — continuou Preston.
— Julgo que sim... Que linda sela que tens... é um belo trabalho. Foi oferta de um índio «navajo» ... É trabalho dele!...
— E tem as iniciais bem visíveis!... Tens de inventar um nome que coincida com elas...
— Estava a pensar nisso... — disse Preston — Serei Pete Mason.
— Admirável!... Podes vir comigo?... Guardarás a sela, no carro... Os dois cabemos bem nele, debaixo do toldo, por causa do Sol... Mas, espera! Que bom «rifle»!
— E com as minhas iniciais também!
— Parece de concurso... ganhaste-o nalgum?...
— Não disse há pouco que, na pedreira, ninguém se preocupa com a vida passada de cada um?... — replicou Pete.
— Tens razão. Desculpa! E Hal pôs-se a rir.
Quando chegaram ao carro, acomodaram-se nele e caminharam com lentidão, visto que, naquele terreno, não podiam dar mais velocidade. Conservaram-se calados, durante os primeiros momentos. Mas, por fim, o cavaleiro perguntou:
— Há muitos homens ali, a trabalhar?
— Bastantes. Depende daquilo a que tu chamas muitos... Talvez, uns quarenta...
— Há, assim, tanto mineral?
— Tanto, que não se extrairá em muitos anos, nem mesmo que trabalhassem dez vezes mais...
— E levam-no para muito longe?
— Para Trona. E dali, para um porto de embarque...
— Deve ser um bom negócio! — exclamou Pete.
— Deve ser!
Houve nova pausa.
— Realmente, não compreendo o caso do nome!
E tu, não há dúvida, és Preston Madison. Os pasquins que há no «bar» dão uns sinais que coincidem com os teus!
— Pasquins? — disse o outro, intrigado — A que te referes? Se temos de ser amigos, é melhor que nos tratemos com confiança.
— Li no «bar» uns pasquins, que, ao que parece, chegaram há pouco, e que se referem a ti, Preston Madison... Podes falar disso, se queres... Se te parece melhor, guarda silêncio. Mas esta é a verdadeira razão por que te disse que mudes de nome...
— Pasquins com o meu nome?!... E que dizem que eu fiz?
— Várias coisas e, entre elas, o assalto à diligência, entre Phoenix e Tucson...
— Quem os assina?
— O governador do Arizona.
— Não compreendo!... Mas isso explica o que aconteceu nesse povo... Ao dizer o meu nome, olharam-me com estranheza e chamaram-me assassino e ladrão de gado. Devem ter recebido também esses pasquins...
(') Manifestos, editais ou cartazes afixados em lugares públicos, difamatórios ou satíricos, contra qualquer pessoa, apontando criminosos à execração pública, ou ainda oferecendo prémios pela sua captura-- N do T.
— Sem dúvida... E é muito possível que tenha chegado algum à pedreira...
— Tudo isso é demasiado estranho...
Calaram-se de novo. Só quando chegaram à vista das vivendas da pedreira, é que Pete quebrou o silêncio:
— Parece ama povoação.
— É, quase... há alguns armazéns e estabelecimentos.
— E bares?
— Há um, muito bom.
— É da Companhia?
— Não. É independente. A dona é uma rapariga, com quem não se pode chalacear. E menos ainda, se tiveres em conta que há vários que estão enamorados dela.
— É bonita?
— Não podes fazer ideia! Mas tem um grande valor. Maneja o «Colt», que é o que mantém, na realidade, a distância, os seus admiradores.
Ninguém se preocupou com a chegada do carro. Pelo menos, ninguém lhe deu importância. Não encontraram uma só pessoa, na maior parte do caminho que era como que a rua principal. se vê
— Hoje é dia festivo? — perguntou Pete — Não se vê ninguém.
— Trabalha-se de noite e dorme-se de dia — respondeu Hal. — Mas quando há pressa, também se trabalha de dia. Por isso, encontrarás todos assim como eu: com a pele curtida e enegrecida.
Quando os dois saíram do carro, apareceram à porta de dois armazéns e do «bar» várias cabeças.
— Soooh! — gritou Hal.
Pete pegou na sela de couro cinzelado e encaminhou-se para o «bar», para esperar ali o carreiro. Ao entrar, deixou a sela encostada à porta.
— Olá! — disse aos que se encontravam ali, a resguardarem-se do calor.
— Olá! — responderam num tom seco.
Pete dirigiu-se ao balcão, onde uma mulher jovem e bonita, como Hal lhe dissera, com o queixo apoiado na palma das mãos e os cotovelos, no balcão, o olhava atentamente.
— És novo aqui, não é verdade? — perguntou-lhe ela.
— O mais novo que pode ser quem acaba de chegar — respondeu Pete, sorrindo.
— Vieste no carro do Hal? Parece-me que o vi passar agora.
— Vim, sim. Recolheu-me no deserto, quando perdi o meu cavalo...
— Queres beber alguma coisa?
— Confesso que tenho sede...
— Como te chamas?
— Pete!
Aproximaram-se do balcão alguns curiosos de que Pete não tinha dado conta.
— Que querem vocês? — perguntou a rapariga —Nunca viram um homem?
-- Esperamos que ele nos convide! — disse um.
-- Pois eu aconselho-o a que não o faça.
— E eu assim farei, pois estou quase sem dinheiro — retorquiu Pete.
— Sempre restará algum para convidar um velho amigo — disse outro. Pete fitou-o.
— Estás certo disso? Pois não me lembro de ter-te visto vez alguma.
— Vamos lá! É preciso ter muito má memória. Serve-me de beber, Nora. Pagará o meu amigo Pete.
— Não te preocupes! — disse ela para o recém-chegado — Não faço caso... Ele faz sempre o mesmo com todos os que chegam, pela primeira vez. E parece-me que só dois é que o convidaram a beber.
— Não me agrada que te metas nos nossos assuntos — protestou o outro.
A rapariga serviu um refresco a Pete. Ele bebeu-o, sem descansar.
— Continuo com sede... Mas este animou-me bastante. Sabes tratar os que atravessam este deserto!
— Então?! Convidas-me ou não?
— Já ouviste que trago pouco dinheiro!
— Aqui, não é preciso. Nora fia-nos a todos.
— Então, não é necessário que sejas convidado—observou Pete.
— Pensas trabalhar aqui? — perguntou ela.
— Se me admitirem, é o único meio de ganhar para comprar um cavalo. Quando o conseguir, continuarei a viagem!
— Vinhas para a pedreira? — perguntou um dos homens.
— Não. Ia de passagem — respondeu Pete. — E se não me matassem o cavalo, é possível que não tivesse sabido que existia aqui este grupo de vivendas e de homens.
— Louca imaginação! — exclamou outro. — É o mesmo que outros têm dito!
Pete fitou-o, sem lhe responder.
— Já bebeste? — perguntou Hal, entrando. — Já sabes, Nora! Um triplo, com muita soda!
— Que tal essa viagem, Hal? Já reparaste? Este novato nega-se a pagar-me um «whisky»!
— E porque o havia de fazer? — objetou Hal.
— Também tu? — protestou aquele que queria ser convidado, à força.
— Tens um quarto para este rapaz, Nora? — perguntou Hal, sem fazer caso do importuno. — Tenho, sim.
— Vou falar ao capataz, para que lhe dê trabalho —disse Hal.
E olhando para Pete, indicou-lhe com um gesto que esperasse.
— Não creio que o admita! — exclamou o chupista.
— Admite todos. E este rapaz é forte. O que interessa a Leo é que trabalhe. Ele está sempre a protestar que vocês são uns «sornas» ...
Hal entrou no escritório, onde foi encontrar o capataz.
— Já me disseram que trouxeste um passageiro no carro. Quem é?
— Não conheço. Perdeu o cavalo no deserto e quer trabalhar aqui...
— Falarei primeiro com ele — disse Leo.
— Nunca fizeste isso — observou Hal.
— Os tempos mudaram. Irei contigo até ao «bar».
— Como quiseres. Mas devo dizer-te que é um rapaz bastante forte. Mais do que qualquer dos que estão aqui, a trabalhar...
— Agrada-me isso. Pelo menos, será um dos que não enganam no trabalho.
Os dois entraram no «bar». Nora fitou o capataz com atenção. Este era um homem ainda novo, de olhos cinzentos, acerados e duros. Era bastante alto, mas não tanto como Pete. A medida que avançava, sorria para a rapariga.
— Porque me fitas assim, com tanta atenção?
— Porque me surpreende ver-te aqui, a estas horas!
— É que Hal disse-me que há aqui um rapaz que quer trabalhar.
— Mas tu nunca fizeste isso — observou Nora.
— O mesmo lhe disse eu — comentou Hal. — Mas replicou-me que os tempos mudam e parece que quer deitar uma olhadela, ao meu amigo...
Pete examinou o capataz, Leo Franklim.
— É este que quer trabalhar? — perguntou o capataz, ao carreiro.
— Sou eu mesmo.
— Hal disse-me que o teu cavalo morreu no deserto. Estava doente?
— Adoeceu no caminho. Apanhou uma indigestão de chumbo — respondeu Pete, sorrindo.
— Mataram-to? Quem foi?
— Eu sei lá... não os conheço... Mas hei-de encontrá-los um dia...
— Conheces as condições nesta pedreira? É preciso trabalhar firme e duro. Se o fizeres bem, ganharás cem dólares por mês! É preciso extrair a quantidade de bórax, correspondente àquela quantia. Se a ultrapassares, receberás a diferença. Se não chegares, a diferença para menos é descontada no ordenado do mês seguinte.
— Aceito as condições. Hei-de ganhar para comprar um cavalo. — E depois?
— Isso é comigo! — replicou Pete — não creio que entre nas condições do trabalho...
— Como quiseres. Amanhã podes começar. Hoje deves precisar de descanso!
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