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Na sua juventude tinha trabalhado como ajudante de um fotógrafo de feira. Com ele, percorria os povoados, particularmente nas épocas festivas, aproveitando essas oportunidades para tirar fotografias a vaqueiros ricos, a casais de noivos e a grupos de amigos ou de famílias inteiras, que só quando deparavam com fotógrafos ambulantes podiam satisfazer o capricho de se retratarem a sós ou em grupo, para conservarem aquela recordação através dos tempos.
Ives Hyan, que assim se chamava o fotógrafo, tinha conseguido economizar uns dólares e adquirir uma máquina própria, com a qual se tornou independente do seu patrão, e como conhecia bem a região e ofício, decidiu trabalhar por conta própria.
Ives tinha sido casado. Tinha um filho do matrimónio que nada se parecia com o pai, pois enquanto este era baixito e feio, o rapaz era alto, forte, ágil e bem favorecido de feições.
O rapaz, chamado Sterling, não gostava de fotografia e por mais que o seu pai o tivesse feito viajar com ele, quando já tinha cerca de catorze anos, nada conseguiu. O ofício repugnava a Sterling e mais ainda, a miserável vida de nómada que o seu pai levava, saltando de feira em feira, comendo mal e dormindo pior, para ganhar alguns dólares, para sustentar a sua mãe.
Sterling expôs o seu problema ao pai, quando atingiu os dezassete anos. Gostava da vida do campo, ao ar livre e tinha decidido ser «cow-boy».
Seguiria a sua vontade, ganharia um ordenado decente e poderia ajudar a sua mãe entregando-lhe parte do dinheiro, sem prejuízo do que o seu pai lhe desse também.
Ives teve que ceder. O rapaz procurou rancho e não ficou no de Dick Sirvais, nos arredores de Leslie, porque o seu proprietário não queria aprendizes de vaqueiro.
Sterling sentiu uma raiva surda quando ao oferecer-se a Dick, este se riu e o despediu, de maneira depreciativa, recomendando-lhe que seguisse a profissão do seu pai, que seria mais lucrativa. O jovem, que tinha o sangue bastante quente, respondeu-lhe:
— Não vim cá, para que me aconselhe o caminho tomar pois sou, eu, quem o hei-de escolher. Ofereci-me para trabalhar; se não precisa, basta dizê-lo. O resto sou eu quem decide.
— Ferves em pouca água, rapaz — respondeu Dick rindo — mas se é assim, pior para ti. Julguei que te aconselhava o melhor, pois não tens aspeto de pode sequer mungir urna vaca...
— Tenho dezassete anos e estou a desenvolver-me e, apesar do meu aspeto, tenho força suficiente par atirar o laço e completar o trabalho.
— Então vai tirar a prova a outro rancho, porque no meu só há lugar para vaqueiros já feitos.
Sterling experimentou outros ranchos e por fim encontrou um a quinze milhas dali, onde foi admitido e contra o que dissera Dick, demonstrou que acabaria por ser um «cow-boy» forte, valente e conhecedor d seu ofício.
Muito contente, Sterling vinha no princípio d todos os meses a casa, entregar a sua mãe, parte d seu modesto ordenado, passando o dia em sua companhia. Via pouco o seu pai. Viajava muito, tirando foto grafias pelos quatro pontos cardeais do Estado, regressando a casa para descansar, de quatro em quatro meses. Um dia, não pôde empreender a viagem que tinha projetado. A sua mulher, bastante frágil, adoeceu.
Ives receou o pior e avisou o filho. Este chegou quase na altura em que morria a sua mãe.
Depois do enterro, Sterling perguntou ao pai:
— E agora, o que é que vai fazer?
— O mesmo de sempre, meu filho. E agora mais do que nunca, pois servir-me-á de distração para esquecer muitas coisas. Esta mísera profissão obrigou-me a viver afastado da tua mãe, oitenta por cento do tempo. Tive que deixar de olhar por ela e abandoná-la para que mal pudéssemos comer e... creio que morreu mais de tristeza e de miséria moral, que da doença. A vida é assim e há ocasiões em que amaldiçoo o dinheiro e quem o tem de sobra. Era capaz de matar, só para recuperar os anos de miséria que passei, apesar de ser um homem que nunca fugiu ao trabalho.
— Esqueça isso e falemos do futuro... Onde é que vai ficar?
— Aqui. Para recordar. Quando acabar os meus giros, virei passar aqui uns dias e poderei assim, ver-te também. Só tu me restas no mundo e não me posso separar de ti.
— Tem razão e o meu maior desejo seria ser mais velho, ganhar mais e poder-me casar para o ter a meu lado, para deixar de andar como um judeu errante... mas, é impossível. Eu fiz há pouco vinte anos e pouco ganho. Talvez que com o tempo...
— Não te rales. Eu sei defender-me e sou duro. Por outro lado, estou tão acostumado a esta vida, que se me privassem dela, creio que morreria de tédio. Mais tarde, talvez a minha saúde se vá ressentindo e então sinta a necessidade do sossego...
Passados uns dias, Ives voltou à sua vida errante e ficou combinado que Sterling viria, de vez em quando, deitar uma vista de olhos pela cabana.
Ives regressou bastante contente, de uma das suas viagens. Tinha-se tornado amigo dum jornalista, que recolhia material exótico, para uma revista que se publicava no Este e depois de uma grande conversa, Ives mostrou-lhe umas fotografias, que tinha tirado a uns índios das Reservas Cheyennes. Algumas satisfizeram o periodista, que comprou umas cópias e contratou com ele outras, que devia mandar à revista para serem publicadas. Mais tarde mandar-lhe-iam um vale, para Rapid City.
Ives aproveitou a oportunidade e fartou-se de fotografar os índios, dando-lhes cópias, com o que ficavam satisfeitíssimos.
Um dia, pouco antes de Bendix ter sido encontrado morto, Ives regressou à sua cabana e depois de algum descanso, voltou ao seu trabalho, para um pedido que lhe tinham feito da revista. Pretendiam publicar uma ampla reportagem, ilustrada com os retratos dos chefes Cheyenne e pediam-lhe todas as fotografias que pudesse enviar.
Ives cumpriu o contrato, mas desta vez, tardou em empreender o seu habitual giro pelas povoações. Quando o seu filho o visitou, estranhou a sua falta de pressa em partir e perguntou-lhe:
— O que é que tem, pai? Está doente?
—Bem, doente... precisamente não estou, mas muito cansado. Vou ficar uns dias mais aqui, para ver se acalmam os meus nervos, para continuar, de novo, o meu trabalho. Juro-te que estou a começar a ficar farto desta vida e... gostaria de fazer qualquer coisa para a abandonar. Vou ser se consigo o exclusivo dos retratos dos índios para a minha revista e com o que me derem, abandono isto. Se o conseguir, demolirei este covil, construirei uma casa nova e arranjarei uma pequena horta. O tratamento desta distrair-me-á e não me sentirei aborrecido. Sterling achou boa a ideia.
Mas um dia, deixaram de ver Ives na vizinhança e julgaram que tinha partido. Contudo, uma tarde, um cão dum pastor, parou à porta da cabana e pôs-se a uivar lastimosamente. O dono, estranhando a atitude do cão, aproximou-se e ao verificar, que a porta apenas estava encostada, empurrou-a e entrou. Recuou assustado. Estendido no chão, jazia um homem com um tiro na cabeça e outro no peito. Era Ives, o fotógrafo.
O pouco que havia na cabana tinha sido revolvido e lançado para o chão com raiva; a máquina fotográfica partida e pisada e as cópias que o fotógrafo possuía, rasgadas e espalhadas pelo chão. Tudo parecia indicar que o móbil do crime tinha sido uma esperança inverosímil de lucro, pois ninguém o podia supor, com dinheiro escondido. Mas quem tinha cometido o crime, devia ter acreditado, pois não deixara recanto por revistar. O comissário viu-se de novo obrigado a agir, mas tão inutilmente como um mês atrás, com a morte de Bendix e ante o fracasso, comunicou o sucedido ao «sheriff» de Rapid City.
(Coleção Kansas, nº 16)
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