O quase agreste cemitério de Passo Estreito encontrava-se à saída do sector Oeste da povoação, ocupando um declive da pouco elevada colina. Não estava longe porque assim era mais cómoda dar sepultura aos que deixavam o mundo. Tal como Chuck havia dito, o caminho constituía um curto passeio ao longo da qual, excetuando algumas dúzias de árvores empoeiradas, cresciam com profusão os catos e as estevas mexicanas, denunciando a proximidade da fronteira pela aspereza da paisagem.
Ali respirava-se paz, total recolhimento, silêncio típico de cemitério. Não existiam nem a vaidade nem o orgulho. Todos os que habitavam a última morada tinham os mesmos privilégios, idêntica posição e análoga fortuna. Os túmulos eram singelos, alguns mesmo sem lápide. Um monte de terra e uma simples cruz bastavam para assinalar a cova onde jaziam — decompondo-se em pó — as grandes ambições, os ódios, os amores mais violentos... Era uma pequena povoação de mortos situada muito próxima da dos vivos. Para os segundos persistiam as preocupações; os primeiros de nada necessitavam. Tinham chegado à meta onde irremediavelmente terminam todas as ambições humanas.
Não se via ninguém pelas cercanias e isto causava em Chuck uma sensação de bem-estar e de solidão que ele desejava em tais momentos. O vento, intermitente, levantava nuvens de poeira cujos impalpáveis grãozitos iam açoitar os descarnados braços das cruzes piedosas. O Sol caía a prumo, queimando como fogo implacável e cozendo as terras na imensa panela do Arizona. Não lhe foi difícil localizar a sepultura de sua mãe, porque apenas uma centena ocupava o fúnebre declive. Deteve-se diante dela, descobrindo-se reverentemente e leu a irregular inscrição na cruz, onde se tinha respeitado o nome de solteira, talvez porque o apelido do marido tivesse sido tão manchado em vida como agora o estava o do filho.
Este era o epitáfio. Não havia datas, porque talvez o ignorassem aqueles que se encarregaram de a enterrar, e Chuck estava muita longe dali no momento em que aconteceu a desgraça. Permaneceu imóvel, com o claro chapéu nas mãos, os olhos fixos na tumba de simples terra e no murcho raminho de margaridas que descansava sobre ela. Não pôde evitar uma pergunta que o torturava como uma maldição.
Quem deixara ali as flores? Não tinha família em Passo Estreito. Talvez se tratasse de um desconhecido que sentiu, em vida, sincero carinho pela desventurada Magda Layson. Estava dentro da lógica, mas, por mais esforços que fizesse, era-lhe impossível recordar a pessoa capaz de se sentir nessa obrigação e que o tivesse visto na povoação.
O raminho estava seco pelo sol e pela falta de água. Pelo menos devia ali estar havia uns três ou quatro dias. Teria dado qualquer coisa para conhecer a boa alma e agradecer-lhe os incómodos. Talvez fosse algum daqueles velhos que se afastavam agora com respeito à sua passagem. O doutor James, Peter Slanger... o próprio Hancock, que sempre se portara cordialmente com os Camely. Quem sabe? Podia ser qualquer deles... e talvez nenhum. O certo, a única coisa certa, é que ali repousavam os restos mortais da sua mãe, que havia flores no seu túmulo e que ele, depois de cinco anos passados, voltava a achar-se na sua presença ainda que fosse apenas sob um ponto de vista simbólico.
Talvez ela o estivesse contemplando lá do alto, voltados para ele os seus bondosos olhos e com um luminoso e doce sorriso nos lábios. Chuck Camely sentiu necessidade de lhe falar, mas a emoção embargava-lhe a voz pondo na sua garganta um apertado nó e comprimindo-lhe os lábios. Quantas coisas relembrou em tão pouco tempo, banhado pelo infernal sol e acariciado pelo vento que levantava nuvens de poeira! A sua infância, a adolescência, aquela fuga desenfreada no dia fatal. Sim, tinham passado cinco anos. Mas... que são cinco anos na vida de um homem, quando ele volta a cabeça para olhar o passado? Apenas cinco minutos. «Cinza» Mildson teve razão ao predizer-lhe que nunca deveria ter voltado a Passo Estreito.
Ali respirava-se paz, total recolhimento, silêncio típico de cemitério. Não existiam nem a vaidade nem o orgulho. Todos os que habitavam a última morada tinham os mesmos privilégios, idêntica posição e análoga fortuna. Os túmulos eram singelos, alguns mesmo sem lápide. Um monte de terra e uma simples cruz bastavam para assinalar a cova onde jaziam — decompondo-se em pó — as grandes ambições, os ódios, os amores mais violentos... Era uma pequena povoação de mortos situada muito próxima da dos vivos. Para os segundos persistiam as preocupações; os primeiros de nada necessitavam. Tinham chegado à meta onde irremediavelmente terminam todas as ambições humanas.
Não se via ninguém pelas cercanias e isto causava em Chuck uma sensação de bem-estar e de solidão que ele desejava em tais momentos. O vento, intermitente, levantava nuvens de poeira cujos impalpáveis grãozitos iam açoitar os descarnados braços das cruzes piedosas. O Sol caía a prumo, queimando como fogo implacável e cozendo as terras na imensa panela do Arizona. Não lhe foi difícil localizar a sepultura de sua mãe, porque apenas uma centena ocupava o fúnebre declive. Deteve-se diante dela, descobrindo-se reverentemente e leu a irregular inscrição na cruz, onde se tinha respeitado o nome de solteira, talvez porque o apelido do marido tivesse sido tão manchado em vida como agora o estava o do filho.
MAGDA LAYSON
Descanse em paz
Este era o epitáfio. Não havia datas, porque talvez o ignorassem aqueles que se encarregaram de a enterrar, e Chuck estava muita longe dali no momento em que aconteceu a desgraça. Permaneceu imóvel, com o claro chapéu nas mãos, os olhos fixos na tumba de simples terra e no murcho raminho de margaridas que descansava sobre ela. Não pôde evitar uma pergunta que o torturava como uma maldição.
Quem deixara ali as flores? Não tinha família em Passo Estreito. Talvez se tratasse de um desconhecido que sentiu, em vida, sincero carinho pela desventurada Magda Layson. Estava dentro da lógica, mas, por mais esforços que fizesse, era-lhe impossível recordar a pessoa capaz de se sentir nessa obrigação e que o tivesse visto na povoação.
O raminho estava seco pelo sol e pela falta de água. Pelo menos devia ali estar havia uns três ou quatro dias. Teria dado qualquer coisa para conhecer a boa alma e agradecer-lhe os incómodos. Talvez fosse algum daqueles velhos que se afastavam agora com respeito à sua passagem. O doutor James, Peter Slanger... o próprio Hancock, que sempre se portara cordialmente com os Camely. Quem sabe? Podia ser qualquer deles... e talvez nenhum. O certo, a única coisa certa, é que ali repousavam os restos mortais da sua mãe, que havia flores no seu túmulo e que ele, depois de cinco anos passados, voltava a achar-se na sua presença ainda que fosse apenas sob um ponto de vista simbólico.
Talvez ela o estivesse contemplando lá do alto, voltados para ele os seus bondosos olhos e com um luminoso e doce sorriso nos lábios. Chuck Camely sentiu necessidade de lhe falar, mas a emoção embargava-lhe a voz pondo na sua garganta um apertado nó e comprimindo-lhe os lábios. Quantas coisas relembrou em tão pouco tempo, banhado pelo infernal sol e acariciado pelo vento que levantava nuvens de poeira! A sua infância, a adolescência, aquela fuga desenfreada no dia fatal. Sim, tinham passado cinco anos. Mas... que são cinco anos na vida de um homem, quando ele volta a cabeça para olhar o passado? Apenas cinco minutos. «Cinza» Mildson teve razão ao predizer-lhe que nunca deveria ter voltado a Passo Estreito.
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