sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

PAS828. Um xerife em fuga

Stanzerville ocupava uma área superior àquela que, na realidade, lhe corresponderia em função do número dos seus habitantes. Quando, havia cerca de um mês, Harold Rodney chegara à cidade, erguia-se, no extremo sudoeste desta, uma construção que lhe despertou a atenção. Agora, enquanto cavalgava ao lado de Karl Stanzer e de «Ghost», sentiu novamente a curiosidade de saber o que seria aquilo. «Mister» Stanzer seguiu-lhe o olhar.
— Uma das melhores coisas que fiz na vida —disse com orgulho. — E já realizei muitas coisas bem feitas — acrescentou. — Não sabes o que é aquilo?
— Parece uma cisterna gigantesca — respondeu Rodney examinando a obra com toda a atenção.
—É realmente uma cisterna — foi a resposta. —Stanzerville cresceu... Cresceu por onde tinha de crescer, mas não havia água. Eu desviei o curso de um afluente do rio Boise e construí essa cisterna. Todas as pessoas bebem da minha água e, se eu quisesse, num dado momento poderia matá-las à sede.
— Toda a água consumida por Stanzerville provém desse depósito? — indagou Harold.
— Sim — respondeu o outro.
Os seus olhos vagueavam pela paisagem. De onde estavam, divisava-se quase toda a cidade. À esquerda, vários homens trabalhavam num longo valado •com tapume.
— E o que é aquilo? — perguntou.
Stanzer olhou-o de relance e, acto contínuo, voltou--se para «Ghost».
— Diz àqueles homens que se apressem. É preciso — ordenou. Depois, dirigindo-se a Rodney: — Não é da tua conta, rapaz. Não te trouxe aqui para me fazeres perguntas. — Ergueu-se um pouco na sela. — Gostarias de ser o xerife de Stanzerville?
—Esse cargo não está ocupado? — interrogou Rodney com brandura.
O outro esboçou um gesto de impaciência.
— Não te fiz uma pergunta para que me respondas com outra. Gostarias de ser o xerife de Stanzerville?
— Claro que sim, chefe!
— Receberias o melhor ordenado da tua vida e o trabalho não te mataria... — acrescentou com uma risadinha que fez eriçar os cabelos da nuca de Harold. — Mas já sabes: obediência absoluta às minhas ordens ou às de «Ghost». Compreendeste?
— Sim, chefe.
Os olhos de «mister» Stanzer, grandes e pestanudos, fixaram-se no rosto de Rodney. Embora o dono de Stanzerville quisesse tornar hipnótico o seu olhar, este tornava-se um tanto esquivo, quando alguém o enfrentava durante uns momentos. Harold não o quis contrariar.
—E isto não é tudo. O xerife actual serviu os meus interesses, mas já não vale grande coisa, entendes? É um homem embrutecido pelo álcool, um inútil. Harold assentiu com um movimento de cabeça.
— Devo pedir-lhe a insígnia? — perguntou.
— Não! — foi a resposta. — Tens de tirar-lha. Esse indivíduo estorva-me. Uma das tuas primeiras obrigações, ou melhor, a primeira, será a de eliminares o xerife. Assim, o teu direito ao cargo será maior. Compreendeste?
— Devo, pois, eliminá-lo?
— Sim. E agora. — Estendeu o braço, com o gesto de um homem que envia cem mil soldados para a guerra, e dísse:
— Cumpre a tua primeira obrigação de novo xerife. Mas... discrição! Não actues onde todos possam ver-te, entendido?
Harold levou a mão à aba do chapéu, simulando uma continência, e partiu a galope.
Um momento depois, entrava na povoação e parava a montada em frente do comissariado. O xerife dormitava numa cadeira, a cabeça descaída sobre o peito. Sabendo que nesse instante estariam muitos olhos a observá-lo, Rodney despertou-o com uma brusca sacudidela.
— Que há? — perguntou o homem mirando-o com um olhar vago.
— Oiça-me bem, xerife — disse Harold em voz baixa. — Consegue entender-me?
— Eu... Você está preso por ter desrespeitado a autoridade... — mas, ao ver expressão de Harold, pareceu adquirir consciência.
— Não há tempo a perder -- disse Rodney olhando-o fixamente.
— Ordenaram-me que o matasse, mas não quero fazer isso. Não olhe lá para fora! Volte-se para mim. Levá-lo-ei da cidade e pensarão que vou liquidá-lo. Agarre em tudo aquilo que lhe possa fazer falta e prepare-se. São ordens de «mister» Stanzer. percebeu?
O xerife despertara por completo e ergueu-se no' tanto trémulo.
—Não dará cabo de mim? -- perguntou. — Isto não será uma armadilha?
— Se assim fosse, matava-o já aqui. Vamos, depressa!
O xerife retirou uma bolsa da gaveta da mesa. Harold levantou a voz para que o ouvissem no exterior.
—Vamos já, xerife. Não perca mais tempo, com seiscentos demónios!
Saíram para a rua.
—Monte no seu cavalo — ordenou Harold — ouça o que ouvir, não faça caso.
Atravessaram a cidade. O xerife tremia na sela e, de quando em quando, passeava em redor os seus olhos de cevado, mostrando não compreender lá muito bem o que se estava a passar. Duas milhas mais adiante de Stanzerville corria o afluente do Boise que servia para encher o depósito construído por «mister» Stanzer.  Harold Rodney deteve a montada junto de uns amieiros, à beira do rio.
— E agora, homem, fuja e não volte mais a Stanzerville.
— O... o... obrigado — gaguejou o xerife.
E desapareceu por entre o arvoredo, vagarosamente.

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