domingo, 24 de maio de 2020

KNS039.10 O bandido escondia-se atrás da estrela

David, entrou decidido no vestíbulo do hotel; atravessou-o ante a expressão admirada do porteiro. Sem vacilar, cumprimentou-o:
— Boas tardes.
Esta saudação conteve o porteiro, que se decidia a interrogar o jovem. David subiu a escada sem pressa aparente, mas quando chegou ao cimo, em rápidas passadas foi até à porta do quarto da cantora e, tocando-lhe levemente, verificou que estava aberta; com um brusco empurrão, abriu-a de par em par. Permaneceu imóvel no umbral, vendo como Strond tentava colocar a almofada sobre o rosto da jovem. O «pistoleiro» soltou-a, sobressaltado pela inesperada intervenção do seu inimigo.
— És um cobarde, Strond! Só tens valentia para as mulheres.
— Maldito advogado!
E Strond, com um rápido movimento, puxou do revólver. Mas os seus lábios lançaram uma horrível imprecação ao sentir um doloroso impacto no peito. As suas mãos poisaram com angústia sobre a mortal ferida, enquanto o seu «Colt» caía no chão. Cambaleante, deu alguns passos para David, que permanecia imóvel, olhando-o fixamente, compreendendo que poucos segundos tinha de vida. Caiu no chão como fosse uma pedra.
Perla levantou-se da cama a soluçar e lançou-se noa, braços do jovem. David apertou-a com afeto, tentando tranquilizá-la.

—Calma; esse homem já está morto.
— Foi horrível! Queria matar-me!
— Já sei. Por isso fiz o possível por chegar a tempo.
— Obrigado, senhor Murray, salvou-me a vida.
— Não tem importância, Perla.
Ouviram-se passos precipitados no corredor. O jovem apanhou uma manta e colocou-a sobre os ombros da artista. O porteiro e mais alguns homens detiveram-se à porta, olhando estupefactos o cadáver de Strond.
— Que aconteceu? — perguntou o porteiro, com voz trémula.
—Esse homem tentou assassinar miss Day.
Nenhum dos presentes se atreveu a responder, coibidos pela firme atitude de David. Este dirigiu-se ao porteiro.
— Tem algum quarto livre neste andar?
— Tenho, sim, senhor.
—Miss Day ficará nele. Amanhã sairá de Bristol.
O porteiro concordou com um gesto e dispôs-se a cumprir a ordem recebida. David acompanhou a raparig2 para o outro quarto.
— Sei quem é o assassino, senhor Murray.
— Eu também sei, Perla. Obrigado, pelo seu interessa neste assunto.
— Tinha o dever de salvar Jimmy Derek. É um belo rapaz; tenho grande parte de culpa no seu desvairado comportamento.
— Nada disso; não pense assim. Agora descanse um pouco.
Ao chegar ao vestíbulo, perguntou ao porteiro:
— Já avisaram o xerife?
—Já, sim, senhor.
— Muito bem, diga-lhe que me encontrará no «Grand Saloon».
David, sem esperar a resposta do porteiro, saiu do hotel e dirigiu-se para o «saloon». Não tinha a menor dúvida que lá encontraria Art Kearney; desejava enfrentar-se com ele. Nessa ocasião dispararia para matar, a menos que o bandido se lhe antecipasse.
Empurrou a porta e entrou no local, decidido. Verificou logo que não se tinha enganado. Art Kearney estava sentado a um canto. O «saloon» tinha pouca gente e foi fácil para David caminhar em linha recta para o rancheiro. Kearney permaneceu calmo. O novo comissário não possuía provas para acusá-lo. Negaria formalmente as suas acusações, fazendo-o fracassar.
— Olá, Kearney! Como tem passado?
O rancheiro ficou surpreendido por estas inesperadas palavras. Sorriu e respondeu:
— Esplendidamente. E você, Wallace?
—Já se esqueceu que o meu nome é Murray?
— Não o compreendo...
— Não acredito... Mas isso não tem importância; vim avisá-lo para não esperar mais por Andrew Strond.
Apesar do domínio que tinha sobre si mesmo, Kearney não pôde esconder um sobressalto.
— Que quer dizer com isso?
— Que Strond não virá.
— Parece estar muito seguro disso.
— Naturalmente. Eu matei-o.
— O senhor matou Strond? Que motivos tinha para fazê-lo?
— Bastantes, e qualquer deles suficientes para o matar como um cão danado.
— Não o compreendo.
Kearney pronunciou estas palavras para ocultar o seu nervosismo e readquirir a calma.
— Não represente, Kearney. Foi Strond quem assassinou James Taft, fazendo recair as suspeitas sobre Jimmy Derek, de cujo revólver se tinham apoderado quando o rapaz estava embriagado. Ontem, na sua companhia e doutro «pistoleiro», tentou matar-me e há alguns minutos evitei que ele assassinasse cobardemente Perla Day.
— Ë uma mentira infame! —exclamou Kearney, furioso 
Todos os clientes cercaram os dois homens, escutando, com avidez as suas palavras. A sua indignação irrompeu, com violência e iam a lançar-se sobre Kearney. David conteve-os com um gesto enérgico.
— Além disso, é o chefe da quadrilha de ladrões de gado que assola a região.
— Você enlouqueceu, Wallace!
— Não; não me chamo Wallace e você sabe-o perfeitamente. Sou David Murray, advogado de Topeka.
Um murmúrio de surpresa acolheu esta revelação, enquanto Art Kearney sorria com desprezo.
— Art Kearney, em nome da Lei, está preso.
— Não é você que me prenderá — respondeu o rancheiro, com o semblante lívido.
— Para mim, é o mesmo apanhá-lo vivo ou morto observou David, com calma.
— Quando não me matou no primeiro combate, cometeu você o maior erro da sua vida.
— Tratarei agora de corrigi-lo.
— Não terá essa sorte.
Kearney empunhou o seu «Colt» e disparou com fantástica rapidez. Os dois tiros pareceram o mesmo, mas a verdade é que a bala de David se antecipou por uma ínfima fração de 'segundo, fazendo com que o tiro disparado por Kearney só lhe roçasse levemente o ombro.
O rancheiro apoiou-se à parede. Um fio de sangue corria-lhe dos lábios. O olhar vidrado poisou-se com ódio no seu inimigo. Com um supremo esforço levantou o braço armado, na intenção de matar David; mas este não o perdia de vista e tornou a disparar. Desta vez, o tiro mortal penetrou entre os olhos de Kearney, matando-o instantaneamente.
— Um assassino a menos — murmurou David Murray.
A porta abria-se constantemente, entrando curiosos, ávidos de conhecer o acontecido. Afastaram-se para deixar passar o xerife. Este aproximou-se de. David, enquanto olhava para o cadáver de Kearney.
— Que significa isto, Wallace?
— Matei os assassinos de James Taft. Foi feita justiça.
— Não compreendo! — exclamou Carroll, perplexo.
— Ë fácil de compreender. O meu nome não é Wallace Smith, mas sim David Murray.
A compreensão estampou-se no rosto do xerife.
— Ë incrível! Você é o advogado de Jimmy Derek?
— Em carne e osso, xerife.
—Com os diabos! Não percebo como um homem da cidade conseguiu realizar as proezas que o senhor levou a cabo.
—É muito fácil; sempre disse com prazer, que antes de ser advogado fui vaqueiro.
— Isso não explica como conseguiu vencer os seus inimigos, tão poderosos.
David, com um rápido movimento, apoderou-se do revólver de Carroll. Fê-lo girar velozmente na mão, mudando-o de uma para a outra, enquanto dizia:
— Desta forma; procurando sempre antecipar-me aos meus adversários. Agora já verificou a minha habilidade, não é verdade, xerife?
E voltou a pôr a arma no coldre de Carroll, que tinha ficado estático. Este assentiu, com um movimento de cabeça.
— É fantástico! Não sei que admirar mais, se a sua habilidade com as armas ou como advogado.
— É um grande elogio, xerife.
— Não posso deixar de o fazer ao homem que conseguiu impor a ordem e a Lei na cidade de Bristol.
— Que lhe parece, se formos ao seu escritório fazer um relatório completo do que se passou? Desejo transmitir quanto antes para Topeka a inocência de Jimmy Derek.
— É uma excelente ideia, senhor Murray.
Os dois homens saíram do «saloon», seguidos pelos olhares assombrados dos circunstantes, que ainda não estavam refeitos da surpresa recebida. Carroll abriu a porta e com um gesto convidou o jovem a passar. David obedeceu sem vacilar. Quando se voltou, encontrou-se em face de Carroll, que lhe apontava um revólver. No rosto do xerife desenhava-se um duro sorriso.
— O senhor é muito esperto, Murray, mas, neste caso, enganou-se.
David não manifestou surpresa nem temor perante a inesperada atitude do xerife. Continuou olhando para ele calmamente.
— Que quer dizer?
— Levante as mãos, não faça nenhum movimento suspeito ou de contrário dispararei! Também sou um excelente atirador.
— Nunca duvidei de que Clem Gainer não fosse um hábil «pistoleiro». Com que então, já sabia da minha identidade, Murray?
— Sim, suspeitava quem era o senhor.
—Cometeu um grande erro em não me desmascarar.
— Não foi possível; o senhor é muito hábil.
— Mais do que imagina. Kearney e Strond eram simples instrumentos meus; não tinham personalidade.
— Suspeitei disso imediatamente. Não julguei nenhum deles capaz de planear projetos tão ambiciosos.
Naturalmente — concordou Carroll, com um sorriso orgulhoso —, só quem podia fazer isso era Clem Gainer.
—Como lhe ocorreu este plano?
— Muito simplesmente. Ninguém possuía os meus sinais particulares; atuei com habilidade para o conseguir. Aproveitando esta circunstância, consegui que me nomeassem xerife de Bristol. Kearney e Strond obedeciam a todas as minhas ordens e assim conseguimos roubar grandes manadas de gado. O meu plano consistia em apanhar os maiores ranchos da região e depois desembaraçar-me desses dois «pistoleiros». Você evitou-me esse incómodo... embora mais cedo que aquilo que eu, desejava.
— A sua vaidade ser-lhe-á fatal, Gainer.
-- Que quer dizer?
— Deve tirar esse cartaz em que se oferecem mil dólares pela sua captura.
— Não tem valor; não tem os sinais pessoais.
— Precisamente, por isso é que eu suspeitei.
— É possível, mas não existem muitos homens tão inteligentes como você.
David fez uma vénia trocista.
— Mas dentro em pouco deixará de existir — continua dizendo o xerife.
— Acredito. Por que razão ordenou a Strond que matasse James Taft?
— Isso é outra história.
— Não, tem uma estreita ligação. James Taft era um patife decidido e sem escrúpulos, conhecia-o há muito tempo e aproveitava-se dessa circunstância para exigir-lhe grossas quantias. Taft era ambicioso e muito exigente; você estava saturado de satisfazer os seus constantes pedidos de dinheiro, e furioso por estar submetido ao domínio desse patife. Esperava uma ocasião propícia para se desembaraçar dele, pois Taft era muito perigoso com o revólver na mão. Se suspeitasse que você o queria matar, era muito capaz de ir a Topeka e denunciá-lo; sempre cobraria a recompensa de mil dólares que ofereciam pela sua captura. Não está certo tudo o que estou a dizer, Gainer?
O bandido concordou, sorrindo.
— Continue, Murray; é um prazer conversar com um homem inteligente.
— A ocasião apresentou-se quando Jimmy Derek se embriagou e ficou a dever três mil dólares a Taft. E talvez Derek não se embriagasse sozinho, mas sim graças aos convites dos seus homens. Estou enganado?
— Não, não, tudo está certo — confirmou o xerife. -- Prossiga, por favor.
— Uma vez embriagado Derek, Andrew Strond apoderou-se do seu revólver e surpreendendo Taft no seu quarto, disparou à traição contra ele, limpou a arma e deixou-a junto do cadáver. A culpabilidade de Jimmy Derek ficava assim sobejamente demonstrada.
— É uma lástima ter de matar um homem tão inteligente. Nós, os dois, teríamos feito grandes coisas juntos.
— Nunca me associaria com um assassino como você — respondeu David, com desprezo.
— Acredite que lamento, Murray, mas vejo-me obrigado a matá-lo.
— Não oponha resistência e entregue-se, Clem Gainer.
Gainer soltou uma gargalhada trocista.
— Tenho tudo previsto. A sua morte ficará justificada; um bandido da quadrilha de Kearney que vingou o seu chefe. Apesar de todos os meus esforços, não consegui prendê-lo. Ninguém se lembrará de suspeitar de mim.
— Está tudo muito bem preparado; você tem um espírito privilegiado para fazer mal. Mas neste caso não terá sorte nenhuma.
— Porque não? Quem o poderá impedir?
— Eu.
— O senhor? Deixa-me rir! Não tardará a jazer no solo, banhado no próprio sangue.
— Engana-se, Gainer. Eu não vou morrer — refutou David, com tal serenidade, que o bandido ficou impressionado.
Deu um passo para o facínora. Gainer com o dedo no gatilho, gritou:
— Quieto, Murray; um passo mais e disparo!
David avançou, e o bandido premiu o gatilho. Soou um estalido seco, e Clem Gainer ficou aturdido, e depois olhou com incredulidade para o seu inimigo. Furioso, apertou o gatilho duas vezes mais, com idêntico resultado.
— Maldição! Que significa isto?
—A explicação é facílima, Gainer. Suspeitei de si, quando me preparou a emboscada, fazendo-me seguir para o sul. Os ladrões de gado estavam à minha espera, e foi você que fez com que eu fosse ao encontro deles. Eu sabia que era o assassino, que era Clem Gainer, mas não o podia provar. Por isso estendi-lhe esta armadilha. Detrás dessa porta, estão dois homens que ouviram tudo o que dissemos. Percebeu?
— Sim, maldito! Mas não explicou qual a razão por que falhou o meu «Colt».
—A explicação também é facílima. Não queria expor-me aos seus tiros. Por esse motivo arrebatei-lhe o revólver no «saloon». Ao realizar a minha exibição com ele, só tinha um motivo; tirar-lhe as balas.
Gainer soltou um rugido de furor e empunhando o revólver pelo cano, lançou-se contra o jovem, com a intenção de lhe abrir o crânio. David evitou o golpe, saltando para o lado, e ao mesmo tempo o seu punho golpeou com dureza o estômago do bandido. Este, incapaz de suportar a força do golpe, ficou estendido no solo. Naquele momento entraram na sala Weeks e o vaqueiro.
Ao vê-los, Gainer fez um esforço e levantou-se. Elevou o braço para golpear David, mas este achava-se atento aos seus movimentos, e com um terrível direto na mandíbula, pô-lo a dormir. Weeks e o vaqueiro pegaram-lhe para o levantar, mas o bandido não saiu da inconsciência e não ouviu as palavras de Harold Weeks.
— Acabou a tua carreira de criminoso, Clem Gainer.

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