sexta-feira, 30 de junho de 2017

PAS776. O «cow-boy» que quase caiu do cavalo

Os momentos em que o xerife tinha de agir eram tão esporádicos que naquela manhã, convencido que nada ia acontecer que exigisse a sua presença, Andrew Jackson fechou a porta do seu escritório e montou na intenção de dar uma volta pelos arredores.
A terra americana é tão fértil em panorâmicas de rara beleza para os olhos daqueles que a sabem apreciar, que em qualquer parte o olhar se extasia diante de paisagens deslumbrantes.
Próximo de Newton City corria um regato que serpenteava por entre a densa vegetação, formando aqui uma cascata com as águas a caírem lá de cima em turbilhão; formando um branco rendado de espuma na base do rochedo, acolá; límpidas e serenas como um lago a onde o gado ia beber e a erva crescia viçosa, sempre emoldurado num colorido paisagístico que seduzia.
Eram estes os locais que mais agradavam a Andrew Jackson e que este preferia para os seus passeios.
Sentava-se sobre as raízes de uma das árvores altíssimas, defronte do curso de água, deixando o cavalo livre, e entregava-se aos seus pensamentos, às recordações dolorosas ou felizes que nunca o abandonavam. Refletia no que tinha sido a sua vida e meditava naquela parte da Declaração da Independência de quatro de Julho de mil setecentos e setenta e seis, que ele tinha decorado:
«São verdades incontestáveis para nós: que todos os homens nascem iguais, que o Criador lhes conferiu certos direitos inalienáveis, entre os quais o de vida, o de liberdade e o de buscar a felicidade.»
Andrew Jackson ainda não conseguira alcançar a felicidade e estava profundamente convencido de que já era demasiado tarde para o tentar. Trinta e nove anos de vida, sete dos quais ao serviço da Lei e da Justiça, haviam--lhe endurecido o coração e destruído a esperança de atingir esse dom tão caro ao coração dos homens. Por alturas dos seus vinte anos e num espaço de tempo que durara até próximo dos trinta, Jackson pensava, como todos os da sua idade, em abandonar aquela vida de aventuras e encontrar uma alma gémea da sua, com a qual fundaria o seu lar, primeiro passo para a felicidade. Depois, com o rodar dos tempos, apercebeu-se que não tinha feitio para aquelas coisas, que o seu coração estava demasiadamente empedernido para amar e que, principalmente, estava a ficar velho.
Agora ao perlustrar o que ia ser o seu futuro, via que estava só, tão só como o ermita que foge do contacto humano, a velhice a aproximar-se a passos agigantados... Trinta e nove anos! Num ápice atingiria os cinquenta, os sessenta e depois?...
Ou talvez não durasse tanto. O seu nome podia estar escrito numa bala de um pistoleiro e deixaria o mundo, abandonando o corpo caído sobre o pó da estrada, empapado em sangue. Quem sabe se seria já hoje, ou amanhã?... No Oeste o limite de uma vida não pode ser calculado pela saúde do seu corpo, mas sim pela sorte desse mesmo corpo em não encontrar uma bala disparada que o faça perecer.
Afugentando os seus pensamentos sombrios, um tudo--nada fúnebres, Andrew recordou-se do pedido que o banqueiro lhe fizera para que fosse visitar a filha, cuja propriedade ficava muito próxima dali e resolveu ir até lá.
Tinha simpatizado com a jovem ao sentir o seu peito arfar com os soluços, c ao ver as lágrimas deslizarem-lhe pelo rosto, enquanto comprimia os lábios para abafar os gemidos.
Foi buscar o cavalo e depois de montar dirigiu-se sem pressas para o rancho de «mister» Gradford.
Desde a entrada até ao edifício da habitação, o xerife foi perseguido por um cão preto que ladrava furiosamente, perante o desagrado do solípede que se sentia por certo incomodado.
Este alarido teve o condão de alertar os moradores da casa e quando chegou à porta já era esperado por uma mulher.
— «Trovão»! Aqui!
O canino calou-se e foi aninhar-se aos pés da dona.
— Desculpe, xerife, esta receção tão ameaçadora. O «Trovão» não sabia que o papá o tinha convidado a vir visitar-nos!
Andrew ficou tão perturbado ao fitar os olhos negros daquela mulher, que as palavras lhe morreram na garganta e quase ia caindo por meter mal o pé no estribo ao apear-se.
Não era muito nova, mas conservava ainda a frescura de uma juventude recente. Tinha fartos cabelos compridos a caírem-lhe sobre os ombros e o seu corpo era harmonioso. Mas aqueles olhos... não os podia fitar!
— Venha, minha irmã espera-o ansiosamente.
Amarfanhando desajeitadamente o chapéu nas mãos, Andrew seguiu-a. Se soubesse os tormentos de que ia ser vítima, teria recusado aquele convite.
A residência de «mister» Gradford estava mobilada com um requinte que Jackson jamais vira, de tal forma que começou a matutar se o banqueiro não se divertira à sua custa com aquela conversa no seu gabinete.
Entretanto, a filha do milionário introduziu-o no quarto da irmã.
— A minha irmã Suzy... O senhor...
— Jackson... Andrew Jackson...
A jovem que estava sentada na cama estendeu-lhe a mão livre, com um sorriso simpático.
— Como está? Sente-se aqui à minha beira — e indicou-lhe um dos lados da cama.
Andrew sentiu-se aflito, podia sujar a alvura das roupas com as suas calças de trabalho e dirigiu um olhar suplicante à irmã mais velha. Esta, porém, colaborou com o pedido.
— Esteja à sua vontade.
Por ironia, descontração e à-vontade eram sensações que ele não sentia. Sem outra solução, não teve outro remédio senão sentar-se. A irmã mais velha de Suzy sentou-se não muito distante, numa cadeira almofadada.
— Eu chorei muito quando caí abaixo do cavalo?
— Não... não... Foi até uma menina muito bem-comportada.
A jovem riu.
— Gostava de o conhecer, sabe? para lhe agradecer o que fez por mim e também para o apreciar.
Andrew sentiu um calor subir-lhe ao rosto. Estava a ser «fuzilado» por dois lados, pois os olhos negros estavam constantemente cravados na sua pessoa.
— Antes de vir pus-me a imaginar como você seria e agora confesso que suplanta tudo o que eu imaginei. Não é muito simpático, Helen?
— Então, Suzy, não deves dizer essas coisas, pois o senhor Jackson não fica à vontade — ralhou a mais velha.
— Ora. Não é crime dizermos o que sentimos e «mister» Jackson não se zanga, pois não?
— Não... Não... Porque havia de zangar-me?
Suzy soltou uma gargalhada apaziguadora.
— O papá disse-me que é um homem valente. Conte--nos a sua vida, «mister» Jackson.
— Suzy, este senhor veio a nossa casa visitar-te, muito amavelmente, e não o deves aborrecer — voltou a interromper a irmã mais velha.
— Está a ver, «mister» Jackson, está a ver? A minha irmã Helen está sempre a ralhar-me por tudo e por nada, e não se lembra que já tenho dezanove anos e sou, portanto, uma senhora...
Andrew conseguiu algum sangue-frio para dizer:
— Vejo, menina Suzy, que já está quase boa e dentro de pouco tempo terá esquecido o seu acidente. Peço-lhes desculpa, mas tenho de regressar ao povoado, vim aqui apenas de passagem, é possível que estejam à minha espera para resolver qualquer assunto — e levantou-se.
— Oh! Já vai! Mas promete vir à festa dos meus anos que o papá vai organizar? A Helen e eu teríamos muito prazer.
— A sua irmã... Bem, virei, terei o maior gosto em vir...

quinta-feira, 29 de junho de 2017

PAS775. Uma amazona em perigo

Tinha uma necessidade urgente de desabafar consigo mesmo. Aquelas armas e aquele cavalo traziam-lhe à mente um nunca mais acabar de recordações. Há dez anos que não montava, que não arriscava a sua vida, que não ouvia o disparo de uma arma! Há momentos, quando premiu o gatilho para acalmar os contendores, sentiu que o seu vibrava de emoção! Que esforço tremendo tivera que fazer para se habituar àquela vida calma, sem perigos, à monotonia de um quotidiano sem história. Andrew Jackson que percorrera todos os estados da União no desempenho das suas missões, convertido depois em barbeiro e agente funerário.
— Socorro! Socorro!
Jackson despertou das suas divagações a tempo de ver uma mulher que fazia esforços desesperados para deter o seu cavalo que corria numa velocidade doida.
Imediatamente esporeou a sua montada e fê-lo tão bruscamente que o animal relinchou de dor e empinou-se nas patas traseiras, antes de partir em cavalgada veloz.
Andrew esperava que a amazona se segurasse o tempo suficiente para que ele a pudesse segurar, mas tal não aconteceu. A mulher desequilibrou-se e rolou no solo, enquanto a sua montada prosseguia em desfilada.
O xerife desmontou e correu para ela. Ao reparar na beleza e na juventude da amazona sentiu que ficava perturbado. Nunca as suas mãos tinham tocado numa mulher tão jovem e tão bela! Felizmente que ela não tinha perdido os sentidos e num exame rápido Jackson verificou que tinha um braço partido. Os seus olhos estavam marejados de lágrimas e gemia com dores.
— Tenha calma, menina, já vai ficar boa.
Improvisou o melhor que lhe foi possível umas talas, com uns bocados de madeira que encontrou, e amarrou--lhe o braço fraturado.
— Diga-me onde a devo levar, menina.
— Sou a filha de «mister» Gradford — respondeu-lhe a jovem entre soluços.
Andrew surpreendeu-se com esta afirmação, mas reagiu prontamente e levantando a jovem nos seus braços vigorosos, colocou-a sobre o seu cavalo, montando em seguida.
«Mister» Gradford tinha uma sumptuosa propriedade à entrada da povoação, onde também criava gado.
Vagarosamente, com os cuidados que o estado da jovem requeria, o xerife fê-la transportar no seu cavalo ao rancho do banqueiro. À entrada passou por um vaqueiro que ao tomar conhecimento do que tinha acontecido à filha do patrão esporeou a sua montada em direção ao palacete onde estes viviam. Assim, quando Jackson chegou à residência do milionário encontrou um grupo de pessoas à sua espera que, sem quaisquer apresentações ou mais delongas, tomaram ao colo a jovem ferida e transportaram-na para o interior, deixando o xerife sozinho e sem saber a atitude que devia tomar.
— Já foram chamar o médico? — perguntou a um vaqueiro que ia a passar.
— Já sim, senhor. Foi o meu colega McKinley quem o foi chamar.
Vendo que nada mais tinha ali a fazer, Andrew Jackson resolveu regressar ao povoado.

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Passaram-se dois dias sem que nada de importância se passasse. Na tarde do terceiro dia, o xerife recebeu no seu gabinete a visita de «mister» Gradford em pessoa. — Boa tarde, «mister» Jackson.
— Boa tarde, «mister» Gradford. Como está a sua filha? — perguntou o xerife indicando ao banqueiro a única cadeira que havia no compartimento, além da sua, para que se sentasse.
— Obrigado, xerife, vai indo bem. Tenho uma dívida para consigo, não?
O milionário parecia ter descido das alturas onde por vezes o poder do seu dinheiro o guindava e falava com cordialidade. A dor faz com que os homens se esqueçam da posição' social que usufruem e se irmanem num elo de fraternidade. Era o que estava a acontecer ao banqueiro que naqueles dois dias tinha sido visto a caminhar \4 a pé pelo povoado, esquecendo talvez a opulência que anteriormente o rodeava, a sumptuosidade do seu coche vistoso e isto, porque estava preocupado com o desastre ocorrido com a sua filha.
«Mister» Gradford era baixo, levemente entroncado e os olhos, pequenos pontos luminosos no seu rosto bolachudo, tinham um fulgor especial, pareciam perfurar a alma dos outros à procura dos seus segredos.
— Não pense nisso, «mister» Gradford. Lamento apenas que a minha intervenção não tenha sido mais oportuna, pois se me adiantasse um pouco mais teria evitado a queda de sua filha. Todavia, quando eu já estava próximo, ela desequilibrou-se e caiu.
— Se o senhor não lhe tivesse prestado imediata assistência e se não passasse naquele momento por ali, só Deus sabe o que poderia ter acontecido à minha pobre filha, ferida e sem forças para regressar a casa. Estou-lhe muito grato, «mister» Jackson, e para tudo o que precisar de mim estou ao seu dispor e não se acanhe em procurar-me.
— Agradeço, «mister» Gradford, mas deve compreender que eu não procedi daquela maneira para obter uma recompensa. O senhor não vai julgar que eu abandonava a ferida se ela não fosse sua filha.
— Eu sei, eu sei. Mas o que eu lhe estou a oferecer não é de modo algum uma recompensa, é antes para que saiba que tem alguém sempre pronto para o que precisar, e peço-lhe que não fique melindrado com isto.
— De modo algum, «mister» Gradford, e agradeço...
— Tenho também a pedir-lhe desculpa porque na aflição do momento todos o abandonaram à porta de minha casa, o que de maneira alguma pode ser considerado um gesto educado. Se eu estivesse presente as coisas passar-se-iam de outro modo...
— Eu compreendo, «mister» Gradford. Confesso que fiquei um pouco indeciso sobre o que havia de fazer, mas depois de perguntar a um vaqueiro se já tinham chamado um médico, vi que a minha presença não era necessária e resolvi regressar ao povoado.
— Sou portador de um recado que lhe é dirigido, «mister» Jackson. A minha filha pede-lhe que logo que possa a vá visitar. Disse que gostava de conhecer quem a socorreu, porque na altura do acidente não viu sequer se o senhor era novo ou velho, se era um vaqueiro ou um «cow-boy» ...
— Terei o maior prazer, «mister» Gradford, só receio não possuir os atributos de cultura para fazer uma visita agradável.
— Ora, ora. Você baseia essas suas palavras no aspeto exterior que vê na minha família, na minha propriedade e residência, mais opulenta de que qualquer outra, no facto de sermos ricos, de termos dinheiro, etc., e julga que torcemos o nariz ao que é simples, ou humilde! Está redondamente enganado! Não nasci rico, «mister» Jackson. Quando me fiz homem vi que tinha apenas estas duas mãos para construir as bases do meu futuro e foi à custa de muito trabalho e o suor do meu rosto, que eu atingi a minha atual posição. É por este motivo que eu tenho educado os meus de modo que estejam aptos a conhecer o mundo, compreendendo a riqueza e a pobreza... Não tema, portanto, «mister» Jackson, que a sua visita a minha casa seja menos apreciada.
Era notável como aquele homem se desdobrava em personalidade! Ele ali estava, sentado em frente da secretária de Andrew, falando com uma afabilidade e naturalidade tais, como se fosse um simples rancheiro. Onde estava então o rico e impenetrável «mister» Gradford que dirigia e segurava todos os cordelinhos do Banco? Andrew estava estupefacto.
 

quarta-feira, 28 de junho de 2017

PAS774. Procura-se um xerife

— Gallapo além de camarada de profissão era também um grande amigo meu. Se fosse possível perdoar os delitos de um homem atentando nos motivos que o forçaram a ser um criminoso, ele seria perdoado. O seu destino entrou na sua fase mais negra quando os seus inimigos não podendo vingar-se na sua pessoa — era terrível com os «Colts»! — assassinaram-lhe a mulher depois de terem praticado na sua pessoa a mais humilhante selvajaria. Quando Gallapo soube disto quase que enlouqueceu. Imediatamente pediu a sua demissão, embora todos nos esforçássemos para que tal não acontecesse. Transformou-se num bêbado incorrigível. O álcool acabou por lhe arruinar completamente a razão e começou a dar que falar quando formou o seu bando, assaltando diligências e caminhantes. Procurei esquivar-me ao cumprimento da minha missão, mas as ordens eram terminantes «detenha-o vivo ou morto». A Lei tem de ser justa e imparcial. Era muito difícil, se não impossível, liquidar Gallapo. Eu convenci-me que talvez conseguisse convencê-lo a entregar-se em nome da nossa camaradagem e amizade. Segui-o de Kentucky a Illinois, onde o encontrei. Quando lhe disse que se rendesse, ele gritou-me de dentro da sua cabana que o fosse matar, que estava só e que o que eu podia fazer em nome da nossa amizade era matá-lo! Respondi-lhe que não fosse burro que havia uma possibilidade de se salvar. Como resposta ele apareceu à porta da barraca, trazia os braços caídos ao longo do corpo... Não estava bêbado, olhou-me de frente e disse-me:
«— Vou-te matar, Andrew!»
«Eu conhecia a sua velocidade em «sacar». Refleti numa fração de segundo o que devia fazer. Compreendi que tinha de lutar porque a minha morte de nada adiantaria, já que ele continuaria a trilhar o mesmo caminho.
— «Somos amigos, Gallapo! Não faças tolices!» — gritei-lhe.
— «Nada, Andrew. Ou tu, ou eu!» — foi a sua resposta.
«As suas mãos desceram para os coldres... Nunca pensei ser tão rápido! Fui o primeiro a disparar e ele caiu. Corri e vi que o ferimento era mortal, estava a agonizar. Com a precipitação não tive tempo de calcular a pontaria. Segurei-lhe a cabeça e as suas últimas palavras foram: «Obrigado, Andrew. És um bom amigo!» Estava morto. Só então reparei que tinha feito um crime: Gallapo estava desarmado! As suas armas estavam dentro da cabana, sobre uma mesa, e debaixo tinha deixado um bilhete com as mesmas palavras: «Obrigado, Andrew. És um bom amigo!» Propositadamente ele tapara-me os coldres com as mãos e fizera o gesto de «sacar» para que eu o alvejasse... Ninguém poderá calcular o efeito que este ato teve na minha consciência. Gallapo queria morrer, mas eu queria que ele vivesse!
«Pedi para que me julgassem em tribunal e me executassem como castigo. Nada disto aconteceu. O juiz entendeu que eu não era um criminoso, embora o gritasse que sim. Em vez de uma execução deram-me um diploma no qual enalteciam o meu feito. Pedi a minha demissão...».
Andrew tinha as feições contraídas e os nervos crispados, de tal forma que todos recearam o pior.
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— Então, «mister» Jackson, isso já passou — disse o banqueiro.
— Tem razão, «mister» Gradford. No entanto, esta parte do meu passado atormentar-me-á até ao fim da minha existência...
— Porque não procura esquecer...
Que julga o senhor que eu tenho feito? Compreendemos, «mister» Jackson.
— Por tudo isto os senhores já veem que não resolvem coisa alguma se me nomearem xerife deste povoado. Pelo contrário, chegará o dia em que alguns bandidos conheçam o meu poiso e recordem promessas antigas. Então só a minha morte os afastará destas paragens.
— Já lá vão dez anos, «mister» Jackson.
— Não creio que esse espaço de tempo seja suficiente para que eles esqueçam a morte de um irmão, de um amigo, ou de um chefe. Eles virão, «mister» Gradford.
— Receia-os?
— Sim, a paz e os valores da terra estão em jogo. „ Se fosse incumbido de eleger o novo xerife quem: seria o seu eleito, «mister» Jackson?
— Não sei. Os senhores estão mais habilitados do que eu, nasceram aqui, conhecem todos os habitantes. Ouvi «mister» Gradford dizer que havia outro candidato. Talvez esse seja o mais indicado.
— John Whistler? O povo não gosta dele, é um avarento da pior espécie e, com franqueza, receamos atribuir-lhe a nomeação. Aparte esse não vemos mais ninguém indicado para o lugar. Constituímos uma população de trabalhadores, criadores de gado, agricultores, todos têm os seus afazeres que lhes roubam todo o tempo e não vamos entregar o cargo aos nossos filhos. Nenhum completou ainda vinte anos, seria nomear uma criança para um lugar de muita responsabilidade, não lhe parece, «mister» Jackson? Não temos outra solução que não seja nomear o senhor xerife de Newton City.
— Posto o problema nesse pé, não vejo também soluções, cavalheiros. Não quero que julguem que fujo ao perigo. Se desejarem nomear-me já sabem o risco que correm.
— Compreendemos, «mister» Jackson, mas confiamos em si. Se quiser fazer o favor de nos acompanhar ao escritório da autoridade, teremos o maior prazer em lhe entregar o emblema que o identificará.
— Estou ao vosso inteiro dispor.
Os cinco homens tinham-se levantado e caminharam para a saída. Quando abriram a porta verificaram que havia uma multidão reunida em frente da casa de Andrew. O sussurro das vozes extinguiu-se com a saída dos «poderosos» da cidade.
O banqueiro levantou os braços para indicar que ia falar.
— Cidadãos de Newton City, correspondendo aos nossos desejos «mister» Andrew Jackson acaba de aceitar o lugar de xerife da nossa cidade!

terça-feira, 27 de junho de 2017

BIS132. Os três cavaleiros do mal

 
(Coleção Bisonte, nº 132)


Andrew Jackson foi um agente federal que, tendo abatido um amigo no cumprimento do dever, se retirou para a povoação de Newton City, com o objetivo de iniciar uma nova vida entre quem não conhecesse a sua vida anterior.

Estabeleceu-se aí como barbeiro, ganhou a simpatia de todos e os anos foram passando. Um dia foi eleito para o cargo de xerife e, mal o seu nome ultrapassou as fronteiras da cidade, esta começou a ser visitada por bandidos que tinham contas a ajustar com ele. Foi assim que se viu perante «Os três cavaleiros do mal».

Eis um livro muito engraçado de um autor português. Ficam algumas passagens para criar o desejo de o lerem completamente no Novelas.

 

segunda-feira, 26 de junho de 2017

PAS773. Duas mulheres corajosas

Betty foi atrás do companheiro.
Lorna apareceu e dirigiu-se a eles:
— Desculpe-me, Roy, mas quero falar à Betty.
As duas, mulheres afastaram-se, confundindo-se com as demais. Roy estremeceu. Não escutou a frase de Lorna. A sua atenção concentrava-se em Elmer Morrison. Este encontrava-se na companhia de Doone. O guarda-costas, ao cabo de uns minutos, afastou-se do chefe e saiu da sala. Adams seguiu-o com um andar felino. Alcançou-o, quando o homem se preparava para contornar o edifício.
— Doone! — e a sua voz soou como um tiro no silêncio da rua.
O bandido voltou-se rapidamente e os dois homens ficaram a olhar um para o outro...
De repente, Doone lançou-se contra Roy. Este recebeu-o com um tremendo soco no meio do peito, logo seguido de outro na ponta do queixo. Doone ergueu os pés do solo e caiu de barriga para o ar. Sem perda de um segundo, rolou sobre si mesmo e ao levantar-se a sua mão desceu para o cano da bota. A voz seca de Adams deteve--lhe o gesto:
— Quieto, miserável! Quieto ou crivo-te de balázios! Empunhava o revólver que sacara do coldre oculto debaixo do braço.
— Está armado! — exclamou Doone estupefacto.
— Tal como tu, meu sapo! — gritou Adams. — Deita fora a faca, vá! E depressa!
Com um extremo cuidado, Doone obedeceu. Depois, principiou a falar:
— Agora...
— Não me servirei da arma, cão! — disse o forasteiro.
Atirou para longe o revólver e avançou. Doone esperava-o. Roy fez-se descuidado e o punho do inimigo partiu, veloz, em direção ao seu queixo. Roy desviou o golpe com o antebraço direito e empregou o punho esquerdo. Doone recebeu o violento murro em plena boca. Baixou os braços, cuspindo sangue e alguns dentes e ficou paralisado durante uns instantes. Depois, cambaleou e caiu no solo como um fardo.
Roy aproximou-se e contemplou-o longamente. Por fim, Doone começou a mover-se. Parecia incapaz de levantar-se.
Mas, de repente, as mãos que apoiava no chão ergueram-se com a velocidade de um relâmpago. Roy Adams apanhou com a terra nos olhos e ficou momentaneamente cego. O bandido soube tirar partido das circunstâncias Com os dois punhos martelou o rosto do seu rival e, em seguida, atirou-o contra a parede do armazém, com um soco poderoso. Roy Adams foi a terra, encostado ao madeiramento. Doone avançou para ele...
O silêncio da rua viu-se quebrado por dois estampidos. Sem um lamento, sem um grito, o facínora estatelou-se no solo.
Roy levantava-se, precisamente, nesse momento. Conforme pôde limpou os olhos. O que viu, então, deixou-o abismado. Doone, a seus pés, morto e bem morto. Tinha três balas nas costas. Junto dele, o revólver do forasteiro. Roy abaixou-se e recolheu-o. O cano ainda estava quente...
Nessa altura a rua encheu-se de ruídos. O baile havia parado, logo ao primeiro tiro, e as pessoas saíam do armazém. Como punhais, vários olhos cravaram-se no jovem. Este ainda não se refizera da surpresa e continuava com a arma na mão. Morrison foi o primeiro a falar:
— Assassinou Doone! Matou-o pelas costas! Vamos, temos que fazer justiça!
— À forca!
Roy olhou para o homem que tinha gritado. Era um dos rancheiros a quem havia sido apresentado durante o baile. Uma pessoa decente, sob todos os aspetos. Sorriu com ironia.
— Eu não o matei. Isto é uma armadilha!
Mas antes de terminar, verificou que não o acreditavam. Empreendeu a retirada, tentando fugir para trás. Na sua desorientação, nem sequer se lembrava da arma que possuía. Quando deu conta desse facto, era demasiado tarde. Várias mãos, mãos como garras de animal selvagem, caíram-lhe em cima. Viu-se derrubado no meio de maldições. Nunca soube quem exibiu a corda. Quando o levantaram, tinha o rosto ferido e as mãos atadas atrás das costas. A voz do xerife fez-se ouvir:
— Um momento! — gritou. — Este homem...
— Cale-se, xerife!
Foi obrigado a obedecer. Um círculo ameaçador fechara-se em torno dele. Os homens pareciam loucos corno lobos sedentos de sangue. E o mesmo vaqueiro continuou a falar:
— Que vai dizer, xerife? Que ele deve ser julgado? Apanhámo-lo com as mãos na massa! Nós somos a Lei! Creio que a sentença é bem clara!
O juiz Burke também passava um mau bocado. As paixões estavam desencadeadas. É bem sabido que no Oeste ninguém podia, naquela época, matar uma pessoa pelas costas, ainda que esta merecesse mil vezes esse castigo. Um rumor de colmeia elevou-se de todos os lados. A rua estava cheia de gente.
— Enforquemo-lo!
— Traz a corda, Holden!
Estes gritos e outros parecidos soavam de toda a parte.
— Não fui eu! Juro! Faça alguma coisa, xerife!
O representante da Lei não respondeu. Via-se nitidamente que tinha medo. A voz de Adams soara de um modo estranho. Dirigia-se ao xerife mas os seus olhos fitavam Betty que ficara parada à porta do armazém, com um ar inexpressivo. Os seus olhares cruzaram-se. A jovem voltou as costas e entrou lentamente no estabelecimento.
Adams gelou. Nunca a supusera capaz de ver nele um assassino. Precisamente a mulher por quem teria dado a vida, se ela lha pedisse. Recordava como Betty havia correspondido ao beijo...
Os seus pensamentos foram bruscamente interrompidos. Principiavam a empurrá-lo. A pancadaria chovia-lhe nas costas. Meio inconsciente, pareceu aceitar com indiferença a sorte que o esperava. Se Betty... A única coisa que Morrison não conseguiria era vê-lo tremer. Apesar dos socos e dos empurrões, ergueu-se em toda a sua estatura. Havia algo de impressionante naquela atitude. Corno que por bruxedo, deixaram de bater-lhe. Roy deteve-se.
— Oiçam-me! — bradou. — Eu não o matei! Sei que não me acreditam. Sei que me querem enforcar. Avante, pois! Mas não me segurem. Irei sozinho!
Ali, apreciava-se a coragem. Em silêncio, seguiram-no até urna das árvores do largo. De um ramo alto, pendia a corda fatídica. Numa das suas extremidades via-se o nó corrediço. A outra ponta estava atada ao arção da sela de um cavalo.
O que dava pelo nome de Holden, mantinha o laço aberto e sorria. Há muito tempo já que em Ely não se enforcava ninguém e aquilo não deixava de ser um espetáculo.
Muito calmo, Roy Adams deteve-se diante dele. Holden preparou-se para lhe passar a corda em volta do pescoço. O círculo de curiosos fechou-se mais. Roy fitou--os um a um. Por fim, os seus olhos cravaram-se em Morrison, como setas. Ninguém, nem sequer este último, conseguiu aguentar o brilho das suas pupilas. Então, o forasteiro que viera de Current, falou:
— Restam-te setenta e duas horas de vida, Morrison. Não adiantarás nada com a minha morte. Nem com a minha nem com a de «miss» Turner. A tua hora soou! A sua voz era extraordinariamente firme.
Morrison sorriu, mas o seu sorriso não lhe saiu para fora dos dentes. Que queria dizer o homem com aquilo? Furioso, gritou:
— Despacha-te, Holden!
Outros gritos apoiaram-no. Ao que parecia, em Ely tinham pouca memória.
— Pronto!
— Precisas de uma ama-seca?
De novo, os gestos rudes dos homens. Holden ergueu os braços e colocou o laço no pescoço de Roy que não pestanejava, olhando em redor. De súbito, o forasteiro levantou impercetivelmente uma sobrancelha.
«Dinamite» aproximava-se, feroz, mostrando os dentes. Da sua boca, para não variar, pendiam as rédeas quebradas. Adivinhou as intenções do animal. Atacaria as pessoas, dar-se-ia uma debandada geral, mas... ele, Roy Adams, estava amarrado. Não poderia montar. E se o fizesse não lhe serviria de nada. Cravá-lo-iam de balas.
Quando abriu a boca para gritar ao cavalo que se afastasse, o som de um tiro abafou o rumor da multidão. Holden encolheu-se, instintivamente. O seu chapéu fugiu-lhe da cabeça, levado por uma bala certeira. Estabeleceu-se um silêncio pesado e todos se viraram para a retaguarda. Na porta do armazém, encontrava-se novamente Betty. Tinha nas mãos os revólveres do jovem, um dos quais deixava escapar uma ténue espiral de fumo.
Mudos de assombro, os homens, agora, não logravam mover-se.
— Mantenham-se quietos! — gritou Betty com energia. — Liberte-o, Holden! Depressa!
Holden dispôs-se a obedecer. Morrison, então, interveio:
— Cobardes — grunhiu. — É uma mulher! Não disparará! E adiantou-se para o cavalo em cuja sela estava amarrada a corda. A sua intenção era clara. Pretendia espantar o animal.
Mas não chegou onde desejava. Betty premiu o gatilho e soou uma detonação. Elmer Morrison levou as mãos à cabeça, ergueu-se na ponta dos pés e rolou pelo solo como um saco cheio de chumbo.
Sem aguardar novas ordens, Holden obedeceu. A multidão estava como que eletrizada. Ninguém ousava mover-se. Pois se havia sucedido aquilo a Morrison!...
Holden retirou o laço do pescoço de Roy e, com uma faca, cortou a corda que o manietava. Quando se viu livre, Adams caminhou até ao armazém. Cambaleava um pouco. Procurou evitar a linha de tiro de Betty. Esta atirou-lhe um dos revólveres. Apanhou-o no ar e com a arma na mão, a sua expressão mudou como por encanto. O seu ar feroz gelou alguns corações. Voltou-se para a multidão e, de revólver em punho, foi retrocedendo até chegar junto da rapariga.
— Betty... — disse. — Eu...
— Eu sei, Roy. Parta tranquilo — aconselhou. — Saia do vale pelo caminho que o conduziu ao rancho. Quando atingir o cima do monte, volte à direita. A cerca de umas duas milhas há um grupo de árvores. Atrás delas, o mato é espesso. Atravesse-o. Encontrará uma porção de rochas. Perto delas existe uma caverna. Instale-se lá. Irei levar--lhe provisões, logo que possa...
— Dentro de cinco dias, Betty...
— Mas...
— Cinco dias. Antes disso não me encontrará.
Colocou o cinturão, sem deixar de mirar a multidão. A rapariga tão-pouco deixava de visar os grupos, no meio de um silêncio sepulcral. Viram dois homens correr para Morrison. Não tinha morrido, mas um sulco de sangue marcava-lhe a testa e ia até à orelha.
— Necessito de meia hora, Betty — disse, agora em voz alta.
— Uma hora, Roy!
Ergueram os olhos, descurando a vigilância. Lorna Kelly estava encostada ao parapeito da janela e empunhava, com mão firme, uma carabina. Ela não perdeu de vista a multidão, apesar de ter falado.
— Obrigado, Lorna. Não o esquecerei!
Aproximou-se de «Dinamite» e uma vez na sela, cumprimentou as jovens e enfiou o revólver no coldre. Depois, voltou-se, de novo, para os que o observavam e deteve os olhos em Morrison que já tinha uma ligadura a envolver--lhe a cabeça. Amparavam-no os dois homens que o haviam socorrido.
— Morrison — gritou, cheio de fúria — deixo aqui «miss» Turner! Se lhe sucede algo... vou buscar-te nem que seja à tumba! E isso, depois de arrasar e incendiar o povoado!
Outra vez aquela confiança toda! Que andaria a tramar? Nem Betty Turner o sabia, quando o viu esporear o cavalo que se dirigiu, num galope veloz, para a saída da povoação...
Por uns instantes o seu coração deixou de pulsar. A estrada encontrava-se bloqueada. Haviam-na cortado com carroças atravessadas. Ao chegar mais perto, reparou que não tinham desatrelado, dos veículos, os animais. De repente, algo pareceu rebentar diante dele. O clarão do disparo iluminou o vulto de um homem. Um sopro de morte roçou-lhe por uma orelha. Agachou-se e sacou a arma com uma rapidez fulminante. Divisou o mascarado e fez fogo contra ele. A figura negra cambaleou. Roy Adams não se preocupou mais com o atirador. Estava a chegar à linha das galeras. Dirigiu a montada em direção aos animais. A altura das cobertas era excessiva, mesmo para um cavalo como «Dinamite». Talvez por cima das mulas... Falou suavemente ao seu alazão.
— Tens que saltar, «Dinamite». É preciso passar, seja como for!
Sentiu que se retesavam os poderosos músculos do animal e viu-o reduzir, de súbito, a corrida. «Dinamite» baixou os quatro traseiros... Julgou que voava. Foi um salto impressionante e magnífico. Ultrapassou a barreira formada pelos animais atrelados, e continuou num galope frenético. Não parecia ter despendido qualquer esforço. Lá atrás ficavam duas mulheres corajosas.

domingo, 25 de junho de 2017

PAS772. A rapariga mais bonita do baile

 À entrada do baile, Adams entregou as armas. Betty, com um bonito vestido azul que lhe realçava o busto e uma capa a cobrir-lhe os ombros, estava realmente encantadora. Parecia uma bonequinha de porcelana do século XVI. Ficou descansada quando o viu retirar o cinturão.
Roy exibia um adesivo sobre o olho esquerdo. Era uma recordação, o único sinal que restava do brutal combate. Sabia que tinha de entrar desarmado no armazém. Mas, lembrando-se da coronhada que recebera, antes de sair do rancho, enfiou um «Colt» «38» no coldre que usava debaixo do braço. Não gostava de servir de boneco.
Cingindo-a pela cintura, principiou a dançar com a jovem, ao som de uma coisa que parecia música. Mas os seus olhos não olhavam para a rapariga. Pelo contrário, só fixavam as outras mulheres. Betty não pôde fazer mais que registar o facto. Durante uns minutos, conservou-se calada. Depois, indagou:
— Para onde olha com tanta insistência, Roy?
— Observo as raparigas de Ely — respondeu cheio de calma. — São preciosas!
— Muito amável — replicou ela um tanto agastada.
— Não se zangue, Betty. Estou a fazer comparações. Quero saber qual é a mais bonita.
Betty franziu as sobrancelhas.
— E então? — perguntou.
— É você, sem dúvida...
— Senhor Adams, nunca pensei...
Calou-se e dançaram em silêncio pelo espaço de uns minutos. Rodopiando com grande habilidade, Roy levou-a até à porta que dava para o alpendre. Havia algo de estranho nos seus olhos quando parou de dançar. Betty mirou-o, tentou retroceder mas ele segurou-a por um braço. Depois, lentamente, puxou-a para si e beijou-a. Sem saber bem o que fazia, a jovem correspondeu à carícia.
Adams, então, libertou-a. Sem dizer uma palavra, girou sobre os calcanhares, amaldiçoando-se mentalmente. Acabava de acontecer, precisamente, o que ele havia tratado de evitar por todos os meios.

sábado, 24 de junho de 2017

PAS771. Em defesa da jovem Betty

Nessa noite, no escritório do rancho, Roy Adams escrevia aos seus amigos de Current, contando-lhes tudo quanto lhe havia acontecido. Informava-os de que se encontrava numa povoação chamada Ely e ao mesmo tempo fazia-lhes um pedido. Adivinhava, de antemão, a resposta. Betty entrou naquele momento, interrompendo-o. Trazia na mão o chapéu do forasteiro e, no rosto, uma enorme palidez.
— Roy — disse. — Que sucedeu? Que significa este buraco?
— Refere-se ao rasgozinho do chapéu? — perguntou com um ar sério. — É que senti muito calor. Para refrescar a cabeça resolvi fazer esse respiradoiro. Como vê, nada de importante.
— É o cúmulo, Roy! Isto foi produzido por uma bala de carabina...
— Bravo! Não querem ver que me associei com uma rapariga tão esperta como eu?
O rosto da jovem crispou-se. Disse qualquer coisa entre dentes, deu um pontapé numa cadeira e atirou-lhe o chapéu à cara. Depois, furiosa, girou sobre os calcanhares e saiu do aposento. Roy ria à gargalhada...
Nessa manhã, Betty acordou muito cedo. Havia muito barulho lá fora. Vestiu-se rapidamente e pestanejou assombrada. Roy Adams, com o tronco hercúleo nu, partia lenha. Chamou-o. O homem largou o machado e aproximou-se dela.
— Olá, Betty! — exclamou. — Deixo-lhe este trabalho. Tenho hoje muito que fazer na povoação.
E encaminhou-se para um dos barracões onde havia dormido na véspera. Pouco depois, Betty viu-o sair completamente vestido. Acabava de ajustar o cinturão, quando a rapariga lhe intercetou o passo, para lhe dizer numa voz cheia de angústia:
— Pelo amor de Deus, Roy! Deixe os revólveres em casa! Tem inimigos no povoado. Se for desarmado, ninguém se meterá consigo.
Por instantes, Roy vacilou, enquanto a mulher perguntava a si próprio porque é que havia dito aquilo. Em seguida, muito vagarosamente, o moço desapertou o cinturão e entregou-o a Betty.
— Tome-o — disse. -- Talvez seja melhor assim.
E, sem esperar resposta, deu meia volta e dirigiu-se para a cocheira. Daí a pouco saía já montado e, num galope furioso, atravessou o desfiladeiro, a caminho da povoação.
Betty, com uma expressão indefinida a marcar-lhe o rosto, viu-o partir.
Roy apeou-se de um salto à porta do Banco. Entrou resolutamente no edifício e acercou-se de um dos «guichets».
— Desejo ver o diretor — disse.
— Imediatamente, senhor Adams.
Ficou espantado. Pelos vistos, já toda agente o conhecia. O empregado retirou-se, voltando pouco depois. Fez um aceno a Roy e este acompanhou-o. Pararam diante de uma porta e o seu cicerone bateu devagarinho. Uma voz autorizou a entrada e Adams empurrou a porta. Um homem de uns sessenta anos, cabelo encanecido e rosto bondoso, ergueu-se do cadeirão que ocupava e deu-lhe as boas-vindas, em tom cordial.
— Sente-se, senhor Adams. Diga-me o que deseja...
— Venho abrir uma conta-corrente. Quero que fique em nome de Betty Turner, mas não desejo que ela o saiba. Se me acontecer alguma coisa, o senhor contar-lhe-á tudo. A minha última vontade é que ela vá para o Leste, com esse dinheiro, depois de queimar e arrasar a propriedade. Não quero que ninguém tire partido do rancho. Sou sócio dela e creio poder impor a minha vontade, neste particular.
Puseram-se de acordo rapidamente. Roy despediu-se do banqueiro. Instantes depois, encontrava-se diante do escritório do xerife. Entrou com um ar decidido. O representante da Lei estava recostado num cadeirão e com as enormes pernas cruzadas em cima da secretária. Ao ver o visitante, levantou-se de um salto.
— Seja bem-vindo! — exclamou. — Sente-se, por favor. Fez uma pausa e acrescentou: — Que o traz por cá?
Roy atirou o chapéu para cima da secretária.
— Isto — respondeu com secura.
O xerife pegou no «Stetson» e passou um dedo pelo buraco da copa. A sua expressão tornou-se grave.
— Carabinas! — exclamou. — Como foi?
Roy contou o que se passara e no fim, perguntou:
— Diga-me, xerife, nunca fizeram uma batida na zona do desfiladeiro?
— Uma única vez, quando da morte do senhor Turner. Estive no local onde o senhor parou. Pregaram-me um tiro neste ombro — disse, apontando a omoplata esquerda. — E, logo a seguir, deram cabo do meu cavalo.
— Sem embargo — respondeu Adams — podemos fazer qualquer coisa. Rodear a montanha, tentar descobrir o refúgio... Deve situar-se, com certeza, perto da nascente do rio que banha as terras de «miss» Turner.
— É difícil, senhor Adams. Devo dizer-lhe que se não tenho feito nada é porque me encontro sem a ajuda de ninguém. Que pode fazer um homem sozinho?
Adams não retorquiu. Quando falou, o xerife ficou abismado.
— Onde posso comprar um bom cavalo? Um animal que seja dócil?
— Um cavalo ou... Eu posso vender-lhe uma égua. Venha. Vou mostrar-lha...
Levou-o às traseiras da casa. Numa espécie de estrebaria construída de madeiros toscos, havia umas quantas montadas. O olhar entendido de Adams pousou numa égua de fina estampa, branca como um floco de neve.
— É esta, xerife? Quanto quer por ela?
— Duzentos dólares.
— Está bem.
Despediu-se do representante da Lei. Voltaria mais tarde para tomar posse do animal. Os seus passos encaminharam-no, agora, para o armazém. Uma rapariga loira, de olhos azuis e rosto simpático, saiu detrás do balcão, quando o viu entrar. Estendendo--lhe a mão, a jovem saudou-o:
— Seja bem-vindo a minha casa, senhor Adams.
— Parece saber mais a meu respeito do que eu acerca da senhora — replicou o forasteiro.
— É natural! Quem não conhece em Fly o homem que desafiou Morrison e a sua quadrilha? Sou amiga íntima de Betty. Permito-lhe que me trate por Lorna. Que deseja?
— Pois eu... — tartamudeou como um rapazinho apanhado em falta. — Quero... um par de ves... vestidos e um tra... traje de mon... montar. São para «miss» Betty. Escolha-os a senhora. Do melhor que possua. E nesse mesmo instante pensou no absurdo de tudo aquilo. A sua visita ao Banco, os vestidos para ela...
Que se estaria a passar? Mas se apenas a conhecia há setenta e duas horas! Seria que andava a enamorar-se de Betty Turner?

sexta-feira, 23 de junho de 2017

PAS770. Um demónio chamado «Dinamite»

Depois de percorrer uma grande distância, fixou o olhar nas montanhas que se desenhavam no horizonte. Dirigiu a montada para lá. Queria escalar aqueles picos. Do alto, tentaria descobrir algo relacionado com o tal bando de ladrões de gado.
À medida que ia avançando, sentia-se esmagado pela magnífica grandeza da paisagem. Tudo aquilo não se comparava com o que havia imaginado. O monte mais próximo era uma imensa mole de granito e basalto, cheia de sulcos profundos e de grutas que formavam um vasto labirinto. Rochas e mais rochas, aqui e ali. Foi obrigado a reconhecer que um homem instalado ali nas alturas, com uma carabina nas mãos, tornaria o local inexpugnável. Poderia cobrir, sem perigo para ele, quase todo o terreno plano por onde agora cavalgava.
Se os ladrões de gado tinham a sua guarida numa das fragas que principiava a distinguir, ser-lhe-ia impossível desalojá-los dali.
E, não obstante...
Sim, era isso! No seu rosto duro, surgiu a claridade de um sorriso. Um plano começava a nascer-lhe na mente.
Deteve o cavalo. O rio, no sopé do monte, formava uma espécie de lagoa. Diante de Roy, uma queda de água com cerca de cento e cinquenta pés de altura. A água, ao evaporar-se por efeito dos raios solares, mudava continuamente de cor, oferecendo um espetáculo impressionante e maravilhoso. Roy apeou-se da montada e retirou da bolsa da sela o pequeno embrulho que Betty lhe tinha dado. Deixou o cavalo à solta e preparou-se para almoçar. Para tal, sentou-se no solo. Uma vez saciado, ergueu-se e dirigiu-se ao animal:
— Bem, «Dinamite», creio que...
Calou-se bruscamente. O terrível garanhão levantava a cabeça e fixava os olhos assassinos na sua pessoa. Depois, mostrando os dentes e relinchando, correu para Roy. Adams saltou uma praga surda e abrigou-se por detrás de uma árvore, empunhando o «Colt».
— Maldito selvagem! Olha que te prego um tiro, embora contra vontade! Está quieto, tinhoso!
O animal estacou. Empertigou ainda mais a cabeça e soltou um sonoro relincho. Acto contínuo, voltou-se de costas, atirou um par de coices para o ar e, subitamente acalmado, continuou a mordiscar a erva como se nada tivesse ocorrido.
Adams inclinou o «Stetson» para a testa e coçou a nuca com um ar perplexo.
— Diabos! — exclamou. — Dir-se-ia que troça de mim!
O seu olhar agudo cravou-se na cascata. Resolveu aproximar-se dela. Queria encontrar um caminho que o levasse até à nascente. Por fim, deixou para trás a vegetação luxuriante da margem e os seus pés principiaram a pisar calhaus e areia. Quase de repente descobriu o que
procurava, uma senda estreita que serpenteava por entre as rochas, elevando-se mais e mais.
Decidiu segui-la a pé. Naquele caminho de cabras o cavalo não lhe serviria de nada.
Mal havia posto o pé em terra quando teve de dar um salto fantástico, de cabeça, para um montão de pedras, em busca de proteção. Alguém, munido de uma potente carabina, acabava de lhe arrancar, com uma bala, o chapéu da cabeça. Amaldiçoou-se por não ter previsto o atentado. Agora só contava com os seus revólveres. Uma pobre defesa contra um bom atirador de carabina. Espiou por entre os penhascos, sem nada ver. Com as armas em riste, ergueu aos poucos a cabeça. Os minutos foram decorrendo, carregados de angústia. Francamente, não compreendia aquilo. A não ser que se tratasse de um aviso., .
Subitamente, um ruído à retaguarda sobressaltou-o. Voltou-se como uma áspide, pronto disparar.
Um sorriso desenhou-se-lhe nos lábios. A menos de dez jardas, o seu cavalo fitava as alturas. Roy não ligou importância ao facto. Não tardou, porém, que o animal soltasse um relincho. Depois, a erva atraiu, de novo, as suas atenções. Adams abandonou o refúgio, colocando o chapéu. Saltou para a montada e, lentamente, empreendeu o regresso.

quinta-feira, 22 de junho de 2017

PAS769. Uma nova ordem no rancho

Manhã bem alta, Adams levantou-se de entre o arvoredo onde havia passado a noite e dirigiu-se para a casa da fazenda. Os seus olhos foram esquadrinhando a paisagem até se deterem, por fim, na figura da mulher que, de mangas arregaçadas acima do cotovelo, deixando ver os braços bonitos e bem torneados, lavava roupa junto do poço. Muito admirado, chamou-a:
— «Miss» Turner!
Ela voltou-se ao mesmo tempo que sorria. Deixou o que estava a fazer e foi ao encontro do jovem.
— Bons dias, madrugador! — saudou-o, trocista. Depois, a sério, perguntou: — Deseja alguma coisa?
— Que faz com tanta roupa?
— Isto — replicou, apontando o poço. — É roupa de gente do povoado. Eu tinha que viver de algo, não acha?
— Bem, «miss» Turner, isso acabou. Termine o trabalho. A partir de hoje, tratará apenas da lida da casa. Quando estiver aborrecida por lhe sobrar tempo... Sente-se! Eu tratarei do resto.
Os lindos olhos verdes da rapariga miraram-no, agradecidos. Sem saber porquê, Betty sentiu um rubor a tingir-lhe as faces.
— Quer que o acompanhe às pastagens?
— Irei só. Creio que tem aqui mais que fazer...
— Como queira. E muito obrigado por tudo, senhor Adams.
— Chamo-me Roy. Nada de cerimónias. Não estou habituado, Sou apenas um simples trabalhador com um pouco de sorte...
— De acordo, Roy — disse ela com um sorriso, fitando-o bem nos olhos. — Farei o que me pede, mas com uma condição. Tem que tratar-me pelo meu primeiro nome: Betty. Somos sócios, não é assim?
Desta vez foi ele quem sorriu, ao mesmo tempo que perguntava:
— Aprecia a equitação, Betty?
— Muitíssimo! Quando meu pai ainda vivia, andar a cavalo era uma das minhas predileções.
— Então, venha comigo. Dar-lhe-ei umas lições...
Intrigada, a rapariga seguiu-o até à cocheira. Com espanto verificou que Adams tomava precauções para entrar no recinto. Para o observar melhor, Betty espreitou lá para dentro. Roy entrou e aproximou-se do cavalo, cautelosamente. O animal levantou a cabeça, saltando um relincho estridente. Em seguida, exibiu os dentes, no vão intento de morder o dono. Vendo que não o conseguia, principiou a escoucinhar a torto e a direito. A cocheira não tardaria a ficar em estilhas. Roy praguejava. Como o cavalo não desistia, apanhou do chão um pedaço de pau e ameaçou quebrá-lo na garupa daquele verdadeiro demónio.
— Maldito sejas! Qualquer dia prego-te um tiro! Quieto, sarnento!
Por fim, o animal ficou tranquilo. Já sem precauções, o jovem colocou-lhe a sela e montou-o, dentro da estrebaria.
— Afaste-se da porta, Betty! Agora segue-se a segunda parte! — gritou para a jovem que o mirava com uma expressão assustada.
Fez pressão com os joelhos no tronco daquele demónio que se pôs em marcha, a passo. Nada sucedeu enquanto o enorme garanhão não se encontrou a umas trinta jardas da casa. Aí, pareceu transformar-se num furacão. Deu, de repente, um salto fantástico e quando voltou a contactar com o solo, quedou-se imóvel, durante uns segundos.
Roy teve a sensação de que lhe haviam quebrado a espinha. O animal, percebendo que não havia derrubado da sela o seu dono, começou a empregar toda a sorte de truques. Saltos de carneiro, curvetas, corridas de um lado para o outro, num campo restrito, paragens de chofre, tudo para atirar com o cavaleiro por cima das orelhas.
Após uns dez minutos de luta selvagem, o cavalo ficou quieto, com a boca cheia de espuma. Roy fê-lo caminhar em direção a Betty e o animal deixou-se conduzir docilmente.
— Que lhe pareceu? — perguntou ao chegar perto dela.
— É um demónio! Diga-me, Roy: ele reage sempre assim quando o monta?
— Sempre. Agora tenho que ir. Quero dar uma vista de olhos a isto. Arranje-me uma merenda, pois voltarei tarde. Tenciono percorrer tudo. Irei, também, até ao desfiladeiro...
— Por favor, Roy, não vá! Matá-lo-ão logo que o vejam!
— Dê-me o que lhe peço e não se preocupe. Sei defender-me sozinho.
A jovem entrou em casa e ao cabo de uns instantes regressou com um embrulho que entregou a Roy. Este fê-lo desaparecer na bolsa da sela, despediu-se com um aceno de mão e partiu seguindo pelo caminho que o havia trazido ao rancho.
Betty viu-o afastar-se. Uma sombra de preocupação estampou-se no seu lindo rosto. Permaneceu imóvel, a observar o cavaleiro, até que a nuvem de pó levantada pelas patas do cavalo, se perdeu no horizonte.
Ficou muito surpreendida, ao reparar que dizia baixinho:
— Deus queira que tudo «te» corra bem, Roy. Depois... depois não creio que te deixe partir...
As suas faces tingiram-se de carmim, enquanto murmurava:
— O que é que se está a passar, Betty?
Mergulhada num mar de confusões, dirigiu-se lentamente para o poço.
 

quarta-feira, 21 de junho de 2017

BIS131. Trio perigoso

 
 
(Coleção Bisonte, nº 131)


Roy Adams era uma espécie de vagabundo que procurava um local para se estabelecer, levando consigo algum dinheiro. Perto de uma povoação chamada Ely, soube que uma jovem, Betty Turner, educada no Este, era perseguida pelo famigerado Elmer Morrison que lhe pretendia ficar com as terras depois de assassinar a família. Roy resolve combater o poderoso bandido, chegando a pedir auxílio aos seus antigos companheiros em Current.
«Trio perigoso» é um livro bem ao estilo de Joe Mogar, com uma construção um pouco confusa, mas com enorme graça na relação do herói com o seu cavalo que nos merece algumas passagens.
 

 

terça-feira, 20 de junho de 2017

PAS768. Salvo pela serpente

No momento em que a avistou, ao dobrar um cotovelo rochoso, avistou também Roland, que saía. Roland ia bem vestido, como sempre, e levava um baú amarrado à garupa do cavalo, atrás da sela. Viu vir Larsen e compreendeu em seguida do que se tratava. Não perdeu nem um segundo.
Pusera pouco antes em liberdade todos os cavalos, para que ninguém o pudesse perseguir. Agora chegava aquele intruso, mas não duraria muito... Um só disparo bastou para acabar com o animal montado por Larsen. Este caiu pesadamente no chão, enquanto Roland soltava uma gargalhada. A menos de trinta jardas parou e apontou a Larsen, o qual sabia que já não tinha tempo de sacar. E o seu inimigo via-o perfeitamente, porque as primeiras luzes do amanhecer surgiam no horizonte.
A segunda gargalhada de Roland ecoou triunfalmente na claridade leitosa.
— Sabes que estás perdido, Larsen... Sabes que não poderás mexer um dedo antes de eu disparar. E como sei ao que vens, dispararei sem hesitar... Mas antes quero dar-te a satisfação de te dizer que tinhas razão... Sim, eu fiz assaltar a diligência e depois arranjei as coisas de modo a ficar com todo o ouro. E tu deste-me uma pequena fortuna, para me ajudares! Se tivesse tempo, oferecer-te-ia uma bonita lápida, boneco, mas não tenho. Antes de passar uma hora atravessarei a fronteira do México, de modo que penso acabar contigo agora mesmo...
Larsen necessitava desesperadamente de ganhar tempo. Compreendia que ia morrer, mas ainda confiava num milagre, em qualquer coisa... Se o pudesse entreter um minuto ou dois... Se viesse alguém...
— Tu não levas esse dinheiro — resmungou. — Não acredito que o tenhas no baú.
Roland riu de novo.
Podia perfeitamente não responder àquilo, mas pensou que seria mais bonito matar Larsen depois de lhe mostrar claramente o seu triunfo. E como o caído não podia tentar nada, soltou com uma das mãos a correia que prendia o baú ao lombo do cavalo e passou-o para os joelhos, tudo sem grande esforço e sem deixar de olhar Larsen.
— Muito bem — riu. — Vou atirar para cima da tua cabeça um punhado de pesos mexicanos para que morras mais tranquilo. Convence-te! Olha!
Abriu bruscamente o baú e, nesse momento, os seus olhos dilataram-se de horror, ao mesmo tempo que soltava um espantoso grito de agonia.
A serpente saltou-lhe raivosamente aos olhos e à boca. Instilou-lhe profundamente o veneno que armazenara durante as suas horas de fome e reclusão. Roland caiu do cavalo e a serpente voltou a mordê-lo outra vez, e outra... até que Larsen, repugnado, lhe estoirou a cabeça com a sua última bala.
Quando, uns minutos mais tarde, chegou Ingrid, encontrou-se com o incrível espetáculo. E, sem palavras, lançou-se, chorando, nos braços de Larsen, sabendo que do fundo daquela dor, do fundo daquela incerteza, nasceria uma vida nova para os dois, uma vida que nunca devia ter quebrado.
Larsen murmurou:
— Foi essa serpente... Não sei quem diabo a escondeu ali...
E do Além, os homens da quadrilha de Roland — e, especialmente, o que gostava de animais e escondera ali aquela serpente para que não a matassem soltaram talvez uma gargalhada sinistra...

segunda-feira, 19 de junho de 2017

PAS767. Atrás de outra mulher

O gesto felino dos dois homens foi acompanhado por um grito angustioso de Ingrid. Esta gemeu ao pressentir que Larsen ia morrer, ao adivinhar muitas coisas que ele quisera manter secretas, abafadas, mortas...
Impulsivamente, correu para o xerife, enquanto repetia:
— Não! Não...
Dois disparos simultâneos perfuraram o ar. Todos os presentes soltaram um grito de espanto ao ver o gesto de Larsen, que se atirava de lado ao chão e empregava a mão do flanco ferido para tirar o revólver e fazer fogo com ele. A dor foi terrível, mas sabia que só era necessário empunhar o revólver. Apontar, não. Estava diante de Rocket e àquela distância não podia falhar.
Num duelo daquele género só há tempo de disparar uma bala, e Rocket falhou a sua. O seu inimigo fizera justamente o movimento contrário àquele que imaginava. Quando quis retificar, já era tarde, porque uma bala se lhe alojara no coração. Caiu de bruços e expeliu uma grande golfada de sangue pela boca. Antes de morrer, murmurou:
— Nunca julguei que tivesse de morrer... numa aldeola... tão miserável... Maldito seja o infer...
Não pôde dizer mais nada. De repente, tudo se tornou vermelho e, mais tarde, negro. Uns segundos depois, até esse negro deixava de existir...
Larsen aproximou-se dele e tirou calmamente, de uma das algibeiras do xerife, um recorte de jornal de dois anos atrás. Sabia que Rocket o trazia sempre. Devagar, como se com isso desse cumprimento à. sua última vontade, estendeu o recorte à espantada Ingrid.
— Está aqui um desenho da rapariga que quis salvar... — disse, lentamente. — A rapariga atrás da qual fui. O irmão deste homem violentou-a e levou-a consigo. Mais tarde assassinou-a. Segui a sua pista durante quase um ano, até que acabei com ele e a vinguei. Se olhares esse desenho, encontrarás tu própria a explicação. Essa rapariga era muito parecida contigo. Quando soube o que lhe acontecera, senti o mesmo que sentiria se fosses tu a vítima e não me consegui conter... Durante a minha perseguição escrevi-te duas cartas, tentando explicar-te o que se passava, mas devolveste-mas sem as abrires. Julgaste que fora atrás de outra mulher, quando precisamente com isso te provava que...
Não quis continuar. Para quê? Para que abrir mais aquela ferida que sangrava de novo? Mas foi ela quem terminou a frase.
A sua voz pareceu tremer no ar quando disse:
— ...que o teu amor por mim era superior a todas as coisas. E fui eu... eu...
Agora era Ingrid quem não se atrevia a terminar, quem não podia. Mas Larsen também não lhe deu oportunidade, porque recuou, saltou para o cavalo e fê-lo tomar a direção da casa de Ingrid. Sabendo que ia para a cavalariça, o animal lançou-se num galope desenfreado.
Ingrid suplicou:
— Depressa, dêem-me um cavalo! Dêem-me um cavalo, por Deus!
Um dos presentes ofereceu-lhe o seu, quando já Larsen, no seu frenético galope, estava prestes a chegar à casa.

domingo, 18 de junho de 2017

PAS766. Reencontro

Gretchen, a criada, fitou-a com sobressalto.
-- Conhece este homem?
— Sim, conheci-o há anos.
— Pela cara de espanto que fez, parece ter visto um ressuscitado...
— De certo modo, é isso.
—Donde o conhece?
 A mulher engoliu em seco, penosamente.
— Não tem importância. Todos nós conhecemos, ao longo da vida, bastante gente; pessoas que nos convêm e pessoas que não nos convêm.
— Adivinho que este homem é dos que não convém conhecer...
— Talvez... Mas deixemo-nos de conversa, Gretchen. A primeira coisa a fazer é tratar-lhe da ferida.
Rasgaram com uma faca a camisa de Larsen e descobriram-lhe o peito forte. Viram que a bala passara entre duas costelas, abrira orifícios de entrada e salda e produzira pouco mais estragos do que esses. Mas as dores deviam ter sido insuportáveis e a perda de sangue fora bastante importante.
As duas mulheres lavaram a ferida e desinfetaram-na, o que arrancou a Larsen um gemido de dor.
Terminado o curativo, Gretchen murmurou:
— Onde o deitamos, «miss» Ingrid?
-- No quarto de hóspedes. Teremos de o velar toda a noite, para o caso de acordar, mas não lhe daremos de comer. Só um pouco de água.
— Eu faço o primeiro turno, «miss» Ingrid. Adivinho que não gostaria de ter uma conversa com ele.
— Claro que não. Quanto menos nos virmos, melhor para os dois.
— Então, procurarei que não se encontrem. Dentro de três ou quatro dias, este homem estará em situação de poder voltar a galopar, se as coisas não se complicarem.
— Não se complicarão. Vamos, ajuda-me.
As duas transportaram penosamente Larsen, que ainda não recuperara os sentidos, e dirigiram-se para um pequeno quarto que havia ao lado da sala de jantar. Depositaram-no na cama e cobriram-no com um lençol.
Ao saírem do quarto, Gretchen, a mulher mais velha, olhou fixamente para Ingrid.
— Esse homem era perseguido por alguém. Que acontecerá se quem o deseja apanhar for o xerife?
— Será um bom sarilho. Ter-me-ei convertido mais ou menos em sua cúmplice.
— Não seria melhor dar parte? Na cidade, como quem diz a meia dúzia de passos, temos um xerife...
— Não — murmurou Ingrid, abanando lentamente a cabeça. — Primeiro quero saber a verdade. Não o denunciarei sem saber porque o perseguiam.
— Apesar disso, pressinto que lhe guarda rancor, um velho rancor que jamais conseguiu dominar. Engano-me?
— Não, não te enganas, Gretchen. Esse homem é talvez a pessoa que mais odeio no mundo.
— Porquê?
— Há coisas de que não gosto de falar. Velhas coisas que até seria melhor esquecer para sempre.
— Que se passou entre si e esse homem, «miss» Ingrid?
Ela apertou os lábios, até que estes formaram no seu rosto uma máscara quase cruel.
— Estivemos quase a casar-nos — sussurrou. — Há três anos.

sábado, 17 de junho de 2017

PAS765. Um cavalo transporta um homem ferido

Era uma casa branca, limpa e bem construída. Tinha um só piso, mas não lhe faltava nada para ser cómoda. Nalguns aspectos, como nas flores e nas cortinas que adornavam as janelas, notavam-se os cuidados de mão feminina.
Quando o cavalo se deteve, Larsen, que conservara inconscientemente um difícil equilíbrio, escorregou e caiu por terra. Apesar da pancada, não recuperou os sentidos.
O ruído que produziu, junto a um relincho do cavalo, fez que se acendessem uma luz dentro da casa. A porta desta abriu-se e a figura de uma mulher que segurava um candeeiro de petróleo recortou-se no limiar.
Era uma mulher nova e vestia uma comprida e quase transparente camisa de dormir. Ao princípio só viu o cavalo, mas ao acercar-se dele distinguiu o vulto caído por terra e uma exclamação de espanto brotou-lhe dos lábios.
Notou sem demora que aquele homem estava ferido, embora não lhe pudesse ver o rosto. Levantou o candeeiro e chamou:
— Gretchen!
Uma mulher de meia idade apareceu no limiar poucos segundos mais tarde. Era loura e devia ter sido bonita na sua juventude, mas agora estava prejudicada pela sua excessiva corpulência. Ao ver o vulto caído aos pés da outra mulher, arqueou uma sobrancelha.
— Que é isso?
— Não sei; parece um homem ferido.
— Algum pistoleiro...
— Talvez, mas, em todo o caso, devemos ajudá-lo.
— Que dirá o seu marido quando regressar e souber que deu alojamento a outro homem?
—E apenas um ferido; além disso, não discutas as minhas ordens, Gretchen. Ajuda-me a levá-lo para dentro.
A outra mulher obedeceu e as duas conseguiram arrastar Larsen, que deixou na terra um leve regueiro de sangue.
A casa estava bem arranjada e as cores predominantes nela eram o banco e o vermelho. Era acolhedora e bonita e adivinhava-se que as pessoas que viviam nela gozavam de situação próspera.
A mulher nova era a dona daquela casa e indicou à outra uma porta que comunicava com a cozinha.
— Levemo-lo para ali. Estendê-lo-emos em cima da mesa para ver a ferida.
Fizeram um esforço e conseguiram levantá-lo e estendê-lo em cima de uma mesa de mármore, muito comprida, que havia no meio da divisão. A cabeça do homem pendeu para um lado, dando a sensação de que se encontrava morto. As suas feições não se tornaram visíveis, dada a posição em que estava a mulher nova.
Esta pareceu ter de súbito uma ideia.
Saiu de casa e espalhou, com os pés, areia sobre o regueiro de sangue, para que este não fosse visível. Depois levou para a cavalariça o cavalo esgotado e instalou-o no sitio menos visível.
Quando voltou, pôde ver a cara de Larsen.
E então uma nova exclamação de espanto brotou-lhe dos lábios.

sexta-feira, 16 de junho de 2017

ARZ140. A última fronteira

(Coleção Arizona, nº 140)

Iria Larsen atravessar a última fronteira para a liberdade ou encontrar o caminho para a morte? Perseguido por um xerife, irmão de um homem a quem tinha abatido, Larsen chegou ferido à casa de uma mulher a quem tinha abandonado. Esta tratou-o e, quando se afastou, veio a saber que o companheiro dela estava metido num sarilho com o banco que lhe pagava principescamente para proteger o transporte do dinheiro entre México e USA. Decidiu-se a ajudar este homem pelo respeito que ela lhe merecia, mas ele não era tão honesto como ambos supunham. E Larsen viu-se entre o fogo do xerife que o perseguia e o homem que queria preservar o que tinha conquistado, mesmo com meios pouco honestos.
Esta novela é bem ao estilo de Silver Kane com pormenores que só este autor sabe valorizar. Deixamos algumas passagens. A publicação integral inicia-se a 14 de Outubro de 2019.

quinta-feira, 15 de junho de 2017

PAS764. Os vidros que denunciavam um acto cobarde

A interminável noite de espera esgotara os nervos dos homens de Jules Carson. Quando a luz do amanhecer surgiu, eles decidiram que tinha chegado o momento de descansar.
— Assim, com a luz do dia, metade de nós chega para vigiar! — exclamou um deles, para Jules.
— Está bem, vão dormir. Mas não todos, pois quero que alguns fiquem de sentinela.
Jules Carson não saíra da entrada da casa. Estava pálido e com sulcos profundos nas pálpebras. Decidiu continuar ali. Sabia que aquelas horas eram, decisivas para ele.
— Se esses imbecis não vierem, procurarei três homens que os substituam, para entrarem por aqui, disparando, e se escapem depois, deixando um rasto bem visível e o cadáver de Margaret. O xerife não é homem para proceder a averiguações, depois do que eu lhe contar... Conheço-o muito bem...
Acabava ele de pensar em Leo Harrys, quando um dos homens que estava de sentinela, gritou do cercado onde se encontrava:
— Vem aí o xerife, patrão!
— Só?
— Sim, só. Deixamo-lo passar?
— Claro que sim, imbecil! — retorquiu, aborrecido.
Arrepelou-se todo de raiva. Estava excecionalmente nervoso. Que diabo quereria aquele intruso?
— Já sei! — disse para consigo. — Vem dizer-me que os presos conseguiram fugir. Sim, com certeza que é isso o que veio cá fazer, este supremo. idiota...
Leo Harrys chegou diante da casa, com ar bem-disposto.
— Adeus, Jules! Já sabes. que esses tipos...?
— Sim, já sei! Não vens cá para que te felicite, pois não, Leo?
O outro encolheu os ombros.
— Bem... as coisas são como são... Eles surpreenderam-me, uma coisa que pode acontecer a qualquer. Suponho que por uns miseráveis dólares não quererás ter um xerife infalível...
Jules sorriu com desprezo.
— Suponho que não. O que é que o trouxe cá?
Mas Leo Harrys em vez de responder, fez-se desentendido e perguntou:
— Onde está Margaret? Sei que costuma madrugar, e preciso falar com ela.
Jules fez-se pálido e o rosto tornou-se apoplético de furor. Foi só um momento, porque ele recobrou imediatamente a calma, mas Leo Harrys teve tempo de ver a sua reação.
— Margaret dorme — respondeu Jules. — Deixa-a em paz, Leo. Não quero que a incomodem, agora.
O xerife desmontou sempre com a mesma calma estereotipada no rosto.
— Lamento, mas ela deve vir comigo à povoação para assinar uns documentos, acerca da queixa contra esse rapaz... aliás, sei que ela não se aborrecerá se eu lhe bater à porta do quarto para a despertar.
Os nervos de Jules Carson, já crispados pela noite de vigilância, deram de si, e o tio de Margaret saltou para a frente do xerife, gritando furioso:
— Não entres! Já te disse que não se pode incomodá-la!
Leo Harrys não fez caso.
— Então, Jules! replicou ele, sempre com o mesmo tom calmo. — Somos velhos amigos, e Margaret não se importará até de que eu entre no seu quarto para a acordar.
Resolutamente, Jules agarrou-o por um braço.
— Não sejas parvo! Já te disse que não podes entrar! Deixa ficar os documentos e eu te os mandarei já assinados!
Então, Leo Harrys cometeu a imprudência de dizer:
— Será que a tens prisioneira, Jules?
O assassino de Howard Carson empalideceu ainda mais e explodiu de raiva. «Sacou» velozmente o «Colt», engatilhando-o ao mesmo tempo que o erguia.
Sem hesitar pôs a arma junto à cara do xerife. Este, surpreendido, ouviu-o dizer:
— Cala-te! Esta casa é minha e não tens direito de entrar nela, sem um mandado judicial! Não é assim que diz a lei?
Harrys manteve-se sereno, respondendo de forma a não elevar a voz:
— Que eu saiba a casa não é tua, Jules. É de Margaret! «Ainda» não é a tua casa...
Acentuou demasiadamente a palavra «ainda». Tanto, que Jules Carson percebeu perfeitamente a sua intenção. Os lábios do miserável tio de Margaret cerraram-se mais, tornando-se uma ténue linha. Estava lívido de raiva e de medo.
— Que estás a insinuar?
Leo Harrys replicou furioso:
— Larga esse revólver, Jules! Cometes um delito grave, ao empunhá-lo contra .mim! Quero ver a tua sobrinha! Falo claro, ou precisas dum tradutor?
O outro hesitou por momentos, mas depois baixou a arma lentamente e guardou-a no cinturão.
— Desculpa, Leo. Estou nervoso e vou dizer-te o que se passa. Minha sobrinha... Acontece que se apaixonou por esse Dale Miller, o dos «mustangs»...
Ante a estranheza do xerife, esclareceu:
— Sim, bem sei que, primeiro, fez com que ele fosse preso... Mas as mulheres são todas loucas. Quando ontem à noite soube que ele fugira da prisão fingiu sentir-se desolada. — Não te engano, Leo, isto é demasiado grave para mim. Ela foi com dois homens procurá-lo, para o ajudar a escapar. E eu não podia dizer-te que Margaret estava tentando auxiliar um fugitivo, como deves compreender. Essa a razão porque comecei por te mentir.
Jules falava com a cabeça baixa, e expunha com dificuldade a versão que inventara. Não tinha um espírito muito brilhante, de forma a poder imaginar dum momento para o outro uma história daquelas, mas o esforço a que era obrigado, fazia-o parecer mais sincero.
Pelo menos, Leo Harrys acreditou nas suas palavras.
— Sabes, neste assunto, há uma enorme confusão! — disse. — O assassino do teu irmão... Ainda não compreendi a razão por que o mataram...
Jules pareceu perceber no tom de voz do xerife que estava a ponto de acreditar no que lhe dissera e reforçou a sua explicação.
—Pois é fácil de compreender, Leo. Ele ia descobrir o esconderijo desses ladrões de cavalos. Porque eles são ladrões de gado. Os «mustangs» foram sempre um bem comum e eles não têm nenhum direito de se apropriar deles e de vendê-los por um preço que rebaixa o preço de todos os outros ganadeiros. Ainda que nenhuma lei o diga, o costume faz lei, xerife!
Convencido, Leo Harrys acenou afirmativamente com a cabeça.
— Sim, é certo — murmurou entredentes. — Não devia ter dado ouvidos a esse homem que...
— De que homem falas?
O outro esquivou-se a dizer.
— Não é nada. De qualquer maneira. também há quem diga que são animais selvagens, que pertencem a quem os apanha, como sucede com todos os outros animais que andam pelas montanhas.
— Não discutamos, agora, tais pormenores, Leo. Estou preocupado por Margaret e creio que mandarei alguns homens buscá-la. Se ela se encontra junto de Dale Miller, correrá perigo! Tu próprio, talvez devesses ir em sua procura.
O xerife disse que ia pensar em tal hipótese e voltou para junto do cavalo. No momento em que punha a mão na sela, e se preparava para montar, ouviu-se um grande estrépito de vidros quebrados.
Leo voltou-se para a casa, enquanto a voz de Margaret, uma voz que o representante da lei tão bem conhecia, gritava:
— Harrys não abale! Tire-me daqui! Ajude-me, Harrys! Meu tio sequestrou-me!
Margaret partira os vidros da janela do seu quarto, com o tacão dum sapato, para poder chamar a atenção do xerife.
Leo Harrys que não era cobarde, soltou uma praga, bradando furioso:
— Jules, tornaste-te louco, maldito embusteiro!
Lançou-se para a entrada da casa, impetuosamente. Demasiado impetuosamente, porque Jules Carson só teve de levantar o braço direito para o agredir violentamente com a coronha do revólver, quando o xerife passava junto dele.
Leo foi cair à entrada da casa, aparatosamente. Jules aproximou-se dele, mantendo-o sob a ameaça da mira do «Colt».
— Imbecil! — rugiu. — Ninguém te pediu para te meteres onde não eras chamado!
Alguns dos homens acercavam-se curiosos. Jules disse que agarrassem no xerife e o metessem dentro de casa.
— Não tenham medo... Um xerife é um homem como outro qualquer. Quase sempre vale menos do que os outros, pois só os imbecis aceitam este trabalho maldito!
Levantaram Leo Harrys. Jules entrou em casa, indicando aos homens que o seguissem.
— Para a adega!
Aquela divisão da casa tinha uma porta muito sólida, e ninguém poderia fugir dali a não ser fazendo-a voar com dinamite.
O xerife foi «delicadamente» atirado pelo ar, chocando contra os húmidos degraus de pedra. Ainda inconsciente, ali ficou imóvel.
Jules Carson, que parecia dominado de urna raiva fria, dirigiu-se para o quarto da sobrinha, seguido pelos seus homens. Margaret recebeu-o com palavras de censura.
— Que fizeste ao xerife ? Como te atreveste... ?
O tio aproximou-se dela enfurecido.
— Eu atrevo-me a tudo, pequena! A tudo!
E para demonstrá-lo, levantou a mão e esbofeteou-a com violência, Margaret só não caiu no solo, porque o próprio tio a segurou por um braço. Voltando-se para os seus homens, Jules bradou:
— Levem-na para a cave...! Não se prendam com delicadezas e deixem-na.
Os homens pareciam hesitar. Apesar do que Jules lhes tinha dito, sentiam bastante respeito pelo xerife.
— Que se passa com vocês, idiotas?
— É por causa do xerife. Compreende não podemos tê-lo preso indefinidamente.
— Descansem, que não o teremos ali indefinidamente...
O sorriso zombeteiro atentou-lhe o cinismo da expressão.
— O dever dum xerife — continuou — é enfrentar os delinquentes. Leo Harrys vai defrontar-se com os bandidos que assassinaram minha sobrinha. E, por desgraça, cairá, também, debaixo do fogo das suas armas, no cumprimento do seu dever. Creio que um inútil como ele, não merecia tantas honras, mas... enfim... vai tê-las! — acrescentou, desdenhosamente.
E enquanto observava como os seus homens levavam a sobrinha, que se mantinha inconsciente, pensava:
— Agora poderei ocupar-me do resto. Não é natural que esse ladrão de gado, o tal rapaz dos «mustangs» apareça por aí. Não deve ser um tipo muito romântico. Certamente, prefere salvar a pele lógico.

quarta-feira, 14 de junho de 2017

PAS763. Mentes torpes, planos sinistros

Tudo estava calmo no rancho. O tio de Margaret, Jules Carson andava naquela noite a examinar os currais, observando tudo atentamente.
— Já tenho visto tudo isto muita vez... Mas é a primeira ocasião em que o faço, e posso dizer que é meu.
Parara no centro do pátio e sorria. Jules Carson estava envenenado pela ambição. Sempre invejara tudo o que o irmão possuía.
«Eu era mil vezes mais capaz e mais competente do que ele, e tinha de obedecer às suas ordens, e de caminhar na sua peugada! Mas, agora, tudo mudou... Agora, sou eu o dono disto tudo...»
Naquele momento, Margaret ainda vivia! Mas, para o miserável, era como se tudo já tivesse terminado...
A entrada da porta colocara dois dos seus homens, aqueles em quem mais confiava. E foi precisamente um deles que se aproximou de Jules para lhe perguntar:
— Patrão... que pensa fazer com a rapariga? Não podemos conservá-la indefinidamente no seu quarto!
Jules concordou.
— Claro que não. Mas tenho de pensar em qualquer coisa adequada. Talvez fazer com que ela sofra um acidente, aqui, no rancho... Não quero despertar suspeitas... E parece-me tão natural sofrer um acidente no seu próprio rancho!
Os homens sorriam. Os trabalhadores estavam a regressar naquele momento ao barracão, quando um outro homens, a cavalo, chegou ao rancho. Vinha de Alamogordo, onde fora efetuar umas compras.
— Senhor Carson — gritou agitado. — Ouça uma notícia importante; Os três homens que o xerife prendeu, fugiram! Os três! Dale Miller e os outros dois!
O tio de Margaret praguejou, entredentes.
— Esse xerife é um imbecil! Se esses homens cá vêm, pode ser uma enorme complicação...
— Se o fizerem, serão bem-recebidos, patrão!
Jules Carson soltou uma gargalhada.
— Que rica oportunidade! Evidentemente, rapazes! Recebê-los-emos o melhor possível, se vierem até cá! Por que não? E se não vierem, é o mesmo... Diremos que estiveram aqui, que nos atacaram para se vingarem de terem sido presos. Ao fim e ao cabo, minha sobrinha estendeu a esse tal Miller uma armadilha, que ele nunca esperaria! Aqui neste mesmo pátio!
Os seus olhos brilhavam astuciosamente.
— Minha sobrinha é uma rapariga valente! Ela própria dirigirá a defesa... — suspirou. — Que pena! Nem sequer urna rapariga tão bonita como Margaret está livre de receber um tiro! Vão derrubá-la com um balázio, aqui mesmo à porta...
Os três homens contemplavam o chefe com evidente admiração.
— Bem imaginado, patrão... — exclamou um deles.
— É preciso pôr os miolos a funcionar, para aguçar o engenho. Temos de preparar um sistema de vigilância perfeito, para o caso desses tipos virem cá ter. Se assim for, deixá-los-emos chegar até perto de nós, para depois os enchermos de chumbo quente, aqui mesmo no pátio. Depois traremos Margaret para que apareça morta no sítio preciso. Perceberam ?
— Talvez esses tipos estejam longe de Alamogordo, patrão. Os que se escapam dos cárceres costumam fugir muito...
— Nesse caso, o ataque, os disparos e tudo o mais para completar uma perfeita encenação do «espetáculo» será feito por nós... De qualquer maneira, minha sobrinha aparecerá morta nesta porta. Só que, nesta hipótese, os assassinos conseguiram fugir. Será essa a diferença...
Com ar cínico olhou para os malandrins que o escutavam com atenção e finalizou:
— Ouçam bem: olho vivo para que não sejamos surpreendidos! Tratemos das coisas como de ser.
Jules Carson, nervoso, duro e sem escrúpulos, conduziu os homens para o local onde começaria a preparar a emboscada.

terça-feira, 13 de junho de 2017

PAS762. Decepção

Dale Milier chegou ao rancho Carson às primeiras horas da tarde. O jovem vestia o mesmo traje que em Fort Summer. Não levava armas, parecendo um indivíduo inofensivo, na aparência.
Conduziu o cavalo a trote até à casa do rancho. A entrada, encontrava-se Margaret, pálida, mas muito bonita, fixando-o.
Dale desmontou em frente da escadaria e tirou o chapéu,
— Como vê — exclamou risonho —, não faltei ao encontro! Quinta-feira... Sou o único convidado?
Margaret respondeu, lentamente:
— Não. Não é o único, Dale. Olhe para a sua retaguarda. •
Dale Milier voltou-se e olhou, sem deixar de sorrir. Então, viu um grupo de homens que se acercavam. Tinham saído dos outros edifícios perto, e empunhavam revólveres uns, e espingardas, outros. Todos mostravam aspeto de quem é capaz de disparar, à. primeira.
O rapaz observou-os um a um, enquanto se aproximavam. Em seguida perguntou a Margaret:
— Que é isto? Uma brincadeira?
A rapariga, negou com a cabeça, inexplicavelmente agitada.
— Não, não é uma brincadeira, Dale Milier... é uma armadilha! Estes homens são ajudantes do xerife de Alamogordo, vêm para prendê-lo, e estão dispostos a matá-lo, se cair na asneira de resistir.
Dale Milier continuava a olhar para a formosa rapariga.
— Resistir? — replicou com calma. — Não tenho armas, já sabe! — Os seus olhos brilharam. — De modo que, apesar de tudo, continua a pensar que sou um ladrão de gado. Por isso me preparou esta armadilha... Corno é possível que uma rapariga tão bonita, seja capaz de fazer coisas tão feias?
— Xerife! — gritou a jovem, impaciente. — Termine de urna vez com isto! Este homem assassinou meu pai! Prenda-o!
Miller, cuja calma era impressionante, disse a meia voz:
— Nunca vi o seu pai, Margaret! Juro-o...
— É o mesmo! Foi você o causador da sua morte! Meu pai foi assassinado em Pico Gallinas, quando procurava o seu acampamento!
— Nem os meus homens, nem eu, matámos quem quer que fosse em Pico Gallinas! — assegurou Dale, severamente. —2 possível que me odeie por isso, que me tenha preparado uma armadilha, só por uma suspeita, sem o menor fundamento?
O xerife colocou a mão nas costas do rapaz e disse, secamente:
— Está preso por assassínio de Howard Carson! melhor não oferecer resistência! Será submetido a um julgamento legal.
A resposta de Miller foi assombrosamente tranquila:
— Esperemos que seja assim, xerife. Suponho que posso montar o meu cavalo...
— Depois de lhe revistarmos a sela.
Margaret afastara o olhar do jovem. Naquele momento, o seu tio Jules saía de casa, dizendo em tom ameaçador:
— Então, este é o canalha que matou meu irmão? Deveríamos enforcá-lo, agora mesmo!
— Esqueça-se disso, Jules! — avisou o xerife. — Terá um julgamento legal.
Em seguida empurrou o jovem para o cavalo. Margaret voltou as costas, verdadeiramente confundida, e foi nessa posição que escutou a voz de Dale Miller:
— Adeus, menina Carson! A festa não foi muito agradável. Pelo menos para mim...
Margaret segurou-se a uma das colunas do pórtico e não se tirou dali, até que o ruido do trote dos cavalos se afastou.
O tio Jules Carson estava a seu lado, procurando tranquilizá-la.
— Tranquiliza-te, Margaret. Isto está quase a terminar, pequena. Esse homem vai receber o castigo devido. Bem sei que com isso não poderemos devolver a vida a Howard, mas, pelo menos...
— Tio, ele garante que está inocente!
— Que queres que ele diga? É natural que se proclame inocente! Mas nós sabemos que não é!
A sobrinha começou a chorar, O tio observava-a com surpresa.
— Que é isso, menina?
— Não sei... Não sei, tio Jules! Foi uma atitude indigna ter atraído aquele rapaz aqui... Ele nem sequer trazia armas. Pensava que...! E acreditava que eu...!
Jules tomou-a pelos ombros e empurrou-a suavemente para casa.
— Anda, vai para o teu quarto. Deita-te, e descansa um pouco. Eu vou ocupar-me dos vaqueiros. A presença dos homens do xerife alvoroçou isto tudo.
A rapariga foi para o seu quarto e estendeu-se sobre a cama. Durante três horas chorou, sem saber, verdadeiramente, porquê. Por fim tranquilizou-se um pouco mais.
— É preciso que me esqueça de tudo isto! — raciocinou. Estou certa de que fiz o que devia.
Resolvida a distrair-se com o trabalho, verificando as contas do rancho, foi para o escritório. Os livros da escrita não estavam, porém, no seu lugar.
— Meu tio deve tê-los no seu quarto. Com certeza... tenho a impressão de que os levou a noite passada.
Dirigiu-se ao quarto do tio, e entrou. Na verdade, os livros das contas do rancho encontravam-se numa estante, juntamente com livros de outro género, que ela gostava de ler. A rapariga agarrou nalguns, mas, ao fazê-lo, derrubou, sem querer, outros.
Apanhou-os do chão e colocou-os no local anterior. Ao fazê-lo, observou que, escondido por detrás duma fila de livros, havia qualquer coisa envolta num pano.
Margaret era curiosa. Agarrou no embrulho e pô-lo na mesa com cuidado. Ao retirar o pano, ficou a descoberto uma arma, bem ensebada.
— Uma espingarda... — Olhava para a arma, bem aturdida. -n estranha esta espingarda... Deus meu, não é possível!
A jovem empalideceu, cambaleando! Era a espingarda especial, de dois canos, de seu pai! Uma arma que, naquele Estado, só ele possuía! A espingarda de Howard Carson!
— Ele levou-a, quando foi para Pico Gallinas! Ele levou-a...! — repetiu obssessivamente Margaret. — É a sua arma, estou certa disso!
Nervosamente procurou a coronha... efetivamente, lá estavam as iniciais em prata de Howard Carson!
—Deus meu! Quando o seu cavalo o trouxe, já morto, não trazia a espingarda! Isso quer dizer...! Isso quer dizer que...!
Ouviu-se um ruido na porta. Margaret voltou-se, soltando um grito. Seu tio estava ali, olhando-a friamente! E friamente foi o tom de voz em que falou:
— Sim, é uma arma extraordinária... Era das coisas que mais invejava a meu irmão, Margaret...
Entrou no quarto, contemplando fixamente a espingarda que a rapariga colocara sobre a mesa.
— Invejava-lhe mais coisas, é certo! Sobretudo este rancho. Suponho que isso te parecerá monstruoso, não é verdade?
Margaret afastou-se, apoiando-se à parede, assustada. Quase não podia respirar.
— Tu assassinaste meu pai! — acusou ela. — Por isso, tens esta arma! Seguiste-o, quando ele foi à procura dos «mustangs» e mataste-o! Tu é que o mataste!
Jules agarrara na espingarda e examinava-a com ar despreocupado.
— Sim, foi exatamente, assim, pequena. Lamento que o tenhas sabido. Confiava que morresses sem chegar a sabê-lo, Margaret. Porque eu quero o rancho só para mim!, compreendes?
Sim. Ela compreendia, por fim. E era terrível compreender. Mas continuou acusando:
— Foste tu que pagaste ao homem que me atacou em Fort Summer. Queres assassinar-me também? Queres, não é verdade?
Jules sorria; sem deixar de acariciar a arma.
— Sim. Quando me telegrafaste, para que te mandasse o gado, telegrafei eu para um amigo de Fort Summer, que só esperava uma indicação em cifra, que já fora previamente combinada, para te atacar. Era um pobre imbecil, que falhou a tentativa. Todos são imbecis, pequena, como esses teus amigos, esses ratoneiritos, de quem me desfiz, colocando o seu «tesouro» no alforje junto à sela, é...
Margaret começou a correr para o corredor. O tio não tentou retê-la. Continuava sorrindo, sem largar a arma.
A rapariga chegou à entrada da casa. Os soluços quase a afogavam. Após um momento de dúvida, saiu para o pátio, gritando:
— Jim, Bernard, venham cá! Imediatamente! Venham cá!
Corria pelo pátio, desolada, na direção da cavalariça, donde saíam uns homens. Do dormitório saíram outros. Todos a olhavam com surpresa,
— Venham! Depressa! — voltou a gritar a rapariga que se deteve, arquejante. — Têm que me ajudar!
Sobre as tábuas do patamar da entrada ressoaram passos.
— Agarrem-na, rapazes! Já não é preciso dissimular. Tragam-na aqui!
Margaret olhava para os homens que a começavam a cercar, e empalideceu ainda mais.
— Não, não é possível! — gritou de novo. — Ele assassinou meu pai, o vosso patrão! Vocês trabalharam para meu pai! Não podeis obedecer-lhe: é um assassino! Não! Não!
Os homens agarraram-na com força, Jules ordenou: -
— Tragam-na para casa, rapazes! Não é preciso fazer--lhe mal.
Margaret defendia-se. Dava pontapés nos vaqueiros, gritava e chorava. Mas nada podia fazer, nem ninguém podia vir em seu auxílio. Quando se convenceu de que Jules dominava todos os homens do rancho, a jovem deixou de resistir.
Levaram-na para o quarto. A janela tinha fortes grades de ferro, a porta era grossa e, além disso, dois homens ficaram de guarda à porta, de forma a não lhe permitir qualquer veleidade de fuga.
Margaret Carson ficou quieta, de pé, diante da cama. Naquele momento só pensava numa coisa.
Pensava em Dale Miller, a quem havia atraiçoado miseravelmente.
— Ele está inocente...! É preciso que o xerife o saiba. Poderão tentar linchá-lo! Deus meu, tenho que sair daqui!
Recordava o olhar sereno do jovem. Só naquele momento compreendeu que o amava.

segunda-feira, 12 de junho de 2017

ARZ139. O homem dos «Mustangues»

(Coleção Arizona, nº 139)

Um estranho mistério perseguia o negócio de Howard Carson. O seu negócio de venda de cavalos parecia bloqueado pela ação de um caçador de «mustangues» que conseguia chegar aos compradores com preços imbatíveis. Howard dirigiu-se ao local de venda para descobrir quem era aquele estranho vendedor, Dale Miller, a quem ninguém parecia conhecer e foi abatido. Margaret, filha de Howard, decidiu descobrir quem era o assassino do pai e partiu em busca da misteriosa personagem. Veio a encontra-lo e atraiu-o ao seu rancho, mas, aí, monumental deceção tomou conta dela. Afinal, o assassino do pai era alguém muito perto dela e não o vendedor de «mustangues».
Eis um livro muito interessante de Cesar Torre onde até a presença de um declamador de textos de Shakespeare tem um papel determinante na ação.